Em meio à estiagem e à pandemia, produtores projetam redução no volume da produção e aumento nos ganhos com as safras de milho e soja no Estado
Apesar da estiagem que desde o ano passado tem atingido Santa Catarina e causado dificuldades de abastecimento de água para algumas cidades e também propriedades rurais, o impacto nas lavouras deve ser compensado por uma alta de preços. O vice-presidente da Federação da Agricultura do Estado de Santa Catarina (Faesc), Enori Barbieri, diz que assim como há uma previsão de aumento no Valor Bruto da Agropecuária no país, com R$ 689 bilhões, 7,6% maior do que no ano passado, em Santa Catarina o valor que nas lavouras foi de R$ 6,7 bilhões em 2019, também deve ser maior neste ano.
– Temos produtores que perderam bastante sim, na metade Sul do Estado, mas as perdas no geral serão compensadas pelos outros produtores, que tiveram grande produtividade. Além disso, o preço do milho e, principalmente da soja, subiram muito. A soja chegou a R$ 112 (a saca) no porto. Isso devido ao dólar, que deve se manter acima de R$ 5 – explica Barbieri.
O gerente do Centro de Socieconomia e Planejamento Agrícola (Cepa) da Epagri, Renei Dorow, avalia que, mesmo sem ter os dados fechados ainda da safra, a tendência é de manutenção do Valor Bruto Agropecuário em Santa Catarina, em relação ao ano anterior.
– No milho temos uma redução de 9,9% no volume, porém com uma valorização superior a 35% em relação ao mesmo período de 2019. Quanto à soja, tem uma redução de volume esperada em 5,82% em abril, mas com uma valorização do preço superior a 18% nos últimos 12 meses. No arroz tivemos uma safra muito boa, com valorização de preço – pondera o gerente do Cepa/Epagri.
A saca de soja que estava abaixo de R$ 70 em abril do ano passado, está próximo de R$ 90. E o milho, que estavam em cerca de R$ 30 em abril do ano passado, vem ficando acima dos R$ 40 neste primeiro semestre, isso para o agricultor. O produtor rural e presidente da Cooperativa Agropecuária Camponovense (Coocam), João Carlos Di Domenico, estima uma quebra de 15% na área de abrangência.
– Tivemos produtores que colheram 70 sacas de soja por hectare, mas outros que colheram 12 sacas, dependendo da região e da época de plantio. Eu colhi 61 sacas por hectare, contra 78 do ano passado. Mas, devido ao preço melhor, vou ter mais lucro neste ano do que no ano passado. Só que essa não é a realidade de muitos produtores, que vão ter prejuízo – prevê o presidente.
Mesmo assim, Di Domenico calcula que os preços altos vão acabar ajudando a cooperativa a alcançar o mesmo faturamento de 2019, que foi de R$ 350 milhões. Só que o lucro será menor, pelo aumento de custos.
Um exemplo de produtor que teve boa colheita foi José Grando, de Guaraciaba. Ele colheu 215 sacas de milho por hectare em média, em 70 hectares, enquanto a média do Estado é de 116 sacas por hectare. É praticamente a mesma produtividade que obteve no ano passado. Na soja ele teve um salto de produtividade, passando de 71 a 72 sacas nos últimos dois anos, para 86 sacas, de média, em 220 hectares.
– Foi um salto. A gente investe em tecnologia para aumentar a produtividade, pois não tem como aumentar a área. E a chuva, apesar de não ter sido suficiente para a água, foi boa para as plantas. E apesar de pouco volume, não ficou muito tempo sem chover, a não ser um período de 13 a 14 dias. Aqui no Oeste a maioria dos produtores colheu bem, a não ser aqueles que atrasaram as lavouras e pegaram a estiagem de janeiro e fevereiro – explica o produtor.
Aumento no déficit de milho e no custo de produção
A estiagem e mais a redução de 2% na área plantada devem provocar uma queda de 276 mil toneladas na produção de milho, o que significa 9,9% a menos do que a safra passada. Isso agrava o déficit de milho de SC, que segundo o doutor em Agronomia do Cepa/Epagri, Haroldo Tavares Elias, foi de 4,2 milhões de toneladas no ano passado. Esse déficit pode chegar a 4,5 milhões de toneladas, dependendo da demanda interna por carnes. Em 2019 as indústrias investiram em ampliações pela crescente demanda chinesa. Resta saber como o mercado interno vai responder à Covid-19.
O vice-presidente da Federação da Agricultura do Estado de Santa Catarina (Faesc), Enori Barbieri, disse que a redução no plantio de milho, que migrou para a soja, deixa o Estado vulnerável a outros mercados.
– Até a chegada da safrinha temos que buscar milho em outros países, como Argentina, Paraguai e EUA, com o dólar a R$ 5. Isso inviabiliza produzir carnes que não seja para exportação e dar ração para as vacas produzirem leite – diz Barbieri, ao lembrar que a tonelada do farelo de soja aumentou de R$ 1,3 mil para R$ 1,9 mil.
De acordo com dados da Central de Inteligência de Suínos e Aves da Embrapa de Concórdia, o custo de produção de suínos e aves subiu 6% em 2020. Barbieri também alerta que o grande volume de exportação de soja pode causar escassez do produto no segundo semestre. A alta nos custos impacta diretamente o consumidor, pois a produção de carnes, leite e ovos depende de ração de milho e soja para os animais se alimentarem. Isso gera pressão nos preços.
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Perdas com estiagem são estimadas a R$ 386 milhões no Estado
Santa Catarina terá uma perda estimada em R$ 386 milhões, levando em conta os percentuais de perdas divulgados pelo Cepa/Epagri. A redução de 9,9% na safra de milho, que passará de 2,791 milhões de toneladas na safra de 2018/2019 para 2,515 milhões de toneladas na safra 2019/2020, uma redução de 276 mil toneladas contando apenas primeira safra, representaria R$ 197,8 milhões.
Na soja a redução prevista no Boletim Agropecuário de abril, é de 4,4%, chegando a uma produção de 2,332 milhões de toneladas, contra 2,440 milhões de toneladas de 2019. Isso representa uma redução de 108 mil toneladas, o que daria R$ 154,8 milhões. No feijão deve haver 6,6% de perda, chegando a 96 mil toneladas.Uma queda de cerca de seis mil toneladas ou R$ 18,6 milhões. No leite a previsão é de perdas de 5% com a falta de chuva, o que daria R$ 500 mil por dia e R$ 15 milhões em um mês, segundo o Sindicato das Indústrias de Laticínios e Derivados de Santa Catarina.
– Na verdade, com exceção do leite onde a situação é mais complicada, nas lavouras de grão não dá para considerar uma perda no geral, pois o aumento de preço compensou, mas um valor que os produtores vão deixar de ganhar e que deixa de circular na economia, caso tivessem colhido mais – disse Barbieri.
Pelo menos uma cultura de grãos não teve perdas com a estiagem. A safra de arroz, que no ano passado foi de 1,10 milhão de toneladas, vai crescer 3,8% e deve chegar a uma produção de 1,14 milhão de toneladas. No Brasil a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) prevê uma safra recorde de grãos. A soja deve ter uma produção recorde de 122 milhões de toneladas, mesmo com os problemas climáticos no Sul do país, devido ao crescimento na área plantada. Milho, algodão, arroz, feijão e sorgo também terão aumento na produção.