Um misto de desapontamento e indignação ganha força entre os empresários produtores de leite, que enfrentam uma das piores crises dos últimos anos, agravada pelas restrições impostas pela pandemia de covid-19.

 

Um misto de desapontamento e indignação ganha força entre os empresários produtores de leite, que enfrentam uma das piores crises dos últimos anos, agravada pelas restrições impostas pela pandemia de covid-19. Segundo eles, o atual cenário aprofundou ainda mais a relação desajustada com as indústrias lácteas. Para a base produtora leite, seria fundamental o apoio do governo federal para pelo menos atenuar os desequilíbrios neste momento em que as dificuldades se acentuam, devido aos altos custos de produção e à queda do preço do leite ao produtor. No entanto, os produtores avaliam que falta vontade política ao governo para mudar a situação.

Há alguns meses, representantes dos movimentos Construindo Leite Brasil, Aliança e Ação/Aproleite Goiás, União e Ação e Inconfidência Leiteira, que mobilizam milhares de produtores nas mídias sociais e em grupos de mensagens, têm se reunido com frequência com a ministra Tereza Cristina (Agricultura) e a equipe técnica do Mapa para debater ações emergenciais e um plano nacional de médio e longo prazo e estruturante para o desenvolvimento da cadeia leiteira. Paralelamente, eles têm buscado o apoio de parlamentares, governadores e prefeitos para fortalecer o setor.

A expectativa deles era que a ministra pudesse ajudá-los de forma mais efetiva, mas eles dizem que até agora não receberam nenhuma sinalização de alguma medida emergencial para socorrê-los. Reclamam ainda que as suas propostas para o Compete Leite Br – política nacional para o setor que o Mapa está elaborando – enfrentam resistências, ou seja, não estão sendo incluídas no plano. “A ministra tem nos dado atenção, mas os problemas seguem sem solução”, diz o produtor Rafael Hermann, de Boa Vista do Cadeado (RS).

Desmonte da cadeia leiteira

“O momento é extremamente crítico, com muita gente abandonando a atividade leiteira ou vendendo animais para o abate para honrar os compromissos.  Se esta situação persistir, corremos sério risco de ter um forte desmonte da cadeia. Estamos alertando isso para o governo há dois anos e, mesmo assim, as coisas não andam. Aliás, no ano passado, entregamos um documento com as reivindicações dos produtores de todo Brasil ao presidente Jair Bolsonaro, aqui no Rio Grande do Sul.”

Rafael Hermann defende a inclusão de algumas ações emergenciais no próximo Plano Safra. “Depois de todo esse tempo em que estamos fazendo reivindicações, esperamos que pelo menos incluam, no Plano Safra, o financiamento para milho silagem e pastagem, com seguro rural para essas culturas. Também entendemos que recém-lançado crédito para retenção de matrizes precisa ter o prazo alongado de 24 meses para 48 ou 60 meses, com pagamento semestrais e carência.”

“Isso acudiria os produtores de leite neste momento em que, além dos altos custos de produção e da queda do preço do leite ao produtor, também vemos o consumo cair em razão da pandemia, que tirou renda do consumidor e desempregou milhares de pessoas”, enfatiza o produtor de Boa Vista do Cadeado.

O leite está em declínio absoluta por falta de reestruturação da cadeia” – Marco Sérgio, produtor de leite de GO

Importância socioeconômica do setor é ignorada

“A sensação é que o governo não reconhece a importância socioeconômica da cadeia leiteira, espalhada por cerca de 1,2 milhão de propriedades em praticamente todos os municípios do país”, acrescenta o produtor Marco Sérgio Batista Xavier, de Cromínia (GO). “Além de ser um grande empregador e de ajudar a manter as famílias no campo, o setor contribui muito para movimentar as economias locais. Isso já justifica a necessidade de uma política pública específica para a atividade leiteira, sem falar de medidas emergenciais neste momento de crise”.

Marco Sérgio aponta ainda resistências fora do governo a mudanças no atual sistema de relação entre os produtores e a indústria láctea. “Parece haver movimentos poderosos para nos manter num regime de quase escravidão, no qual não temos previsibilidade do preço do leite que entregamos num determinado dia para receber depois de 45 dias ou mais.”

Ele também avalia que entidades que se apresentam como porta-vozes da base produtora não estão em sintonia com ela e acabam falando por si, o que igualmente cria entraves ao avanço na discussão sobre um plano nacional para o setor e ações emergenciais, nos quais sejam consideradas a perspectiva do produtor de leite.

“O leite está em declínio absoluta por falta de reestruturação da cadeia. Não estamos inseridos nas leis de livre mercado e seguimos submetidos à estratégia das indústrias, enquanto setores como os de soja e carne vivem um momento histórico de rentabilidade e crescimento”, assinala Marco Sérgio.

Sistema ultrapassado

“O sistema de relação entre os produtores e a indústria láctea está ultrapassado e acaba privilegiando sempre o lado mais forte”, ressalta o produtor Leonel Fonseca, de Pelotas (RS). “O que precisa é mudar esse modelo para dar mais fôlego à base produtora, garantido, obviamente, a sustentabilidade econômica da indústria. Precisamos ter um ganha-ganha, a fim de que possamos continuar oferecendo um produto de qualidade ao mercado consumidor. Por isso, queremos que o debate com o governo tenha resultado. O diálogo com a ministra é importante, mas precisa ter efeito no dia a dia das propriedades leiteiras.”

 

Bryce Cunningham, um produtor de leite escocês, proprietário de uma fazenda orgânica em Ayrshire (Escócia), lançou um produto lácteo para agregar valor ao leite de sua fazenda, que é um produto de ótima qualidade, sem aditivos, e é um exemplo de economia circular.

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