Mestre e doutor em Administração, o docente Afonso Lima fala quais são os principais obstáculos e perspectivas de futuro para a “cadeia do leite” no Estado.
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Afonso também é coordenador do Mestrado Profissional em Administração da Universidade de Fortaleza — Foto: Ares Soares

No último mês de setembro, o Mestrado Profissional em Administração (MPA) da Universidade de Fortaleza – instituição de ensino da Fundação Edson Queiroz –, promoveu a palestra “Leite e laticínios: A inovação como estratégia para uma indústria sob ameaça”. Contando com a presença de produtores rurais e gestores de laticínios, o evento foi dirigido por Afonso Carneiro Lima, coordenador do MPA.

Mestre e doutor em Administração pela Faculdade de Economia, Administração, Contabilidade e Atuária da Universidade de São Paulo (FEA-USP), Afonso é professor adjunto do Programa de Pós-Graduação em Administração (PPGA) da Unifor. Nos cursos, ele ministra as disciplinas de Estratégias de Internacionalização, Negócios Internacionais e Microeconomia da Competitividade.

O docente possui experiência em gestão financeira e orçamentária e em gestão de operações de cursos de pós-graduação, atuando nos esforços de aproximação entre a universidade e organizações empresariais, assim como na produção de pesquisas aplicadas. Seus temas de interesse em pesquisa são Estratégia e Competitividade, Internacionalização de Empresas, Ambiente Institucional e Tomada de Decisão.

Na Entrevista Nota 10 desta semana, Afonso Lima compartilha quais são os principais desafios e perspectivas de futuro para a “cadeia do leite” hoje no Ceará, além de contar sobre a experiência e os resultados do evento realizado no início do semestre.

Confira na íntegra a seguir.

Entrevista Nota 10 – Quais as principais dificuldades que ameaçam a indústria de laticínios da Região Nordeste?

Afonso Lima – Há diversas influências sobre a cadeia de leite como um todo. No contexto da indústria de laticínios, elo específico da cadeia, há sobretudo tendências socioculturais de consumo que trazem um grande desafio conciliatório: produtos naturais, saudáveis, com certos atributos de qualidade, com maiores prazos de vencimento, sustentáveis, a um preço acessível. Alguns desses aspectos demandados não são tão compatíveis assim, o que requer flexibilidade por parte dessas empresas.

Há também pressões por parte de grupos, ONGs e outras organizações quanto a aspectos de sustentabilidade e de efeitos de consumo, estas nem sempre realistas, o que acaba trazendo prejuízos à imagem de toda uma cadeia essencial para a sociedade. Por fim, recaem também sobre essas empresas demandas regulatórias cada vez mais intensas e sofisticadas, como a rastreabilidade do produto desde sua origem.

Entrevista Nota 10 – O que os empresários do Nordeste e do Ceará em particular devem fazer para reverter essas ameaças?

Afonso Lima – Primeiramente, gostaria de distinguir dois termos. Há influências naturais do ambiente estratégico que demandam transformações, mudanças, por parte da indústria. E há, por outro lado, as ameaças, as quais vejo mais como estratégias e ações específicas de organizações com o objetivo de causar danos ao setor como um todo, atacando sua imagem e criando concepções generalizadas errôneas sobre suas operações.

Quanto às primeiras, há claramente uma necessidade de agilidade, o que requer uma integração cada vez maior entre os laticínios e os produtores e organizações de apoio, incluindo-se o governo. A inovação de produtos, obtenção de certificações, facilitação dos processos que envolvem órgãos estatais, exigem tal aproximação, e isso será cada vez mais relevante daqui em diante.

Quanto às ameaças, é importante identificar os principais canais de veiculação de mensagens e a origem de tais ações. Deve haver, cada vez mais, uma preocupação com a imagem do setor como um todo. Assim, transparência e estratégias de comunicação setorial, bem como engajamento junto à sociedade, tornam-se essenciais como resposta.

Entrevista Nota 10 – O que a academia pode contribuir para o fortalecimento da indústria de laticínios do Ceará?

Afonso Lima – Primeiramente, criando um espaço para debates estruturados. A academia tem a vocação de agregar as pessoas certas, pesquisadores, executivos e outros especialistas, com conhecimento relevante, para debater tais questões. Vem a ser uma ponte útil para a geração de conhecimento e de promoção de iniciativas resultantes dessa troca. Esse, inclusive, é o objetivo do MPA da Unifor. Com base no trabalho de grupos de pesquisa, temos também acompanhado como diversos fenômenos semelhantes ocorrem e são trabalhados em diferentes contextos, o que nos dá uma ideia mais ampla e, ao mesmo tempo, detalhada sobre como abordá-lo em nosso próprio contexto.

Entrevista Nota 10 – O Governo do Estado tem procurado atrair novos empreendimentos nesse setor com o objetivo de ampliar a competitividade dos produtos derivados do leite no Ceará. Qual a sua opinião sobre isso? É uma das saídas para o setor? Até que ponto essa medida é salutar para as empresas já atuantes no Ceará?

Afonso Lima – Competição é um elemento essencial à atividade econômica. Porém não se pode abordar o setor de laticínios apenas sob a perspectiva das empresas que operam nessa atividade. Há de se considerar a “cadeia do leite”, formada por diferentes atores cujo relacionamento é fortemente baseado na confiança e na reputação. Uma maior competição entre os laticínios a partir de novos entrantes pode contribuir para maior inovação de produtos e produtividade, além de reduzir o poder e barganha dos principais laticínios no Ceará, então, vantagens.

Por outro lado, novos entrantes podem trazer instabilidades a relações contratuais já estabelecidas há muitos anos. E são tais relações que viabilizam empreendimentos de micro e pequeno porte em regiões carentes do Estado. No passado, uma empresa multinacional desistiu de operar no Ceará, dentre outras razões, por não ser capaz de estabelecer esse nível de relacionamento.

Se o objetivo é a produtividade e inovação, cabe questionar os fatores que levam produtores e outros laticínios a não investirem em recursos ou em ações de produtividade. Incertezas quanto ao fornecimento de insumos básicos, como milho e soja, e à política tributária estarão certamente nessas discussões, além do treinamento e desenvolvimento de pessoal. Penso que há a necessidade de se retirar alguns gargalos da cadeia antes de partirmos para um “choque” de competição.

Entrevista Nota 10 – O Programa de Mestrado Profissional em Administração (MPA) da Unifor recentemente promoveu a palestra do professor João André de Barros Teixeira para falar sobre o tema “Leite e laticínios: A inovação como estratégia para uma indústria sob ameaça”. Quais os principais objetivos da palestra? Como o senhor avaliou o evento? Quais as principais conclusões sobre ele?

Afonso Lima – O objetivo geral da palestra foi o de sensibilizar os participantes – produtores rurais e gestores de laticínios e interessados – quanto aos desafios do setor em nível global, mas também trazendo diversas possibilidades baseadas na inovação, marketing e relacionamento institucional. Nesse sentido, o professor João André foi a pessoa certa para a palestra. Não apenas pela sua formação internacional, mas também pela sua trajetória em empresas relevantes de bebidas, alimentos e embalagens, como executivo, conselheiro ou investidor. Criamos esse evento juntos, ele trouxe várias ideias e pensamos em aperfeiçoá-lo para as próximas edições. Essa abordagem global é relevante também para compreendermos a situação local. Em outros países, a cadeia tem passado por questões muito semelhantes ou piores. Um exemplo disso são os protestos e paralisações de produtores rurais holandeses frente a metas governamentais relacionadas à sustentabilidade, as quais afetarão milhares de famílias e até o abastecimento de alimentos.

O evento teve o engajamento de diversos participantes, o que considero algo extremamente positivo. Considero que foi um sucesso dada a adesão de produtores e gestores de importantes organizações relacionadas à cadeia do leite ao evento. Isso sinaliza a intenção de aproximação de empresas e outras organizações à academia e nos dá grande satisfação, por outro lado, ao nos possibilitar contribuir de maneira relevante, mesmo que pontualmente, às suas necessidades. As diferentes possibilidades de cooperação foram, talvez, a principal conclusão. Aprofundaremos ainda mais as discussões no sentido de embasar ações específicas visando contribuir à competitividade do setor em nosso Estado. Há muito a fazer!

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A inteligência artificial (IA) e sistemas avançados de câmeras estão revolucionando a maneira como os produtores de leite nos EUA gerenciam seus rebanhos.

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