A empresa pretende usar esse processo para proteger e apoiar suas operações comerciais em andamento e lidar com as dívidas e obrigações de pensões não financiadas.
A Dean Foods possui 65 fábricas em 29 estados em todo o país. Emprega 15.000 pessoas. Essa combinação de capacidade de processamento, funcionários e produção faz da Dean Foods a maior processadora e distribuidora direta de leite fluido fresco e outros produtos lácteos nos Estados Unidos.
Para manter os negócios em funcionamento após 12 de novembro, a empresa recebeu aproximadamente US$ 850 milhões em financiamento de alguns credores existentes, liderados pelo Rabobank, declarou a Dean Foods em um comunicado à imprensa.
Vendas perdidas, infraestrutura envelhecida da fábrica e problemas relacionados à inovação de produtos foram os catalisadores que levaram à declaração de falência, se alguém perguntasse aos principais analistas de lácteos.
Quem é o provável comprador?
A Dairy Farmers of America (DFA) – a maior cooperativa de lácteos do país – se envolveu em discussões avançadas sobre a compra. Essa organização nacional de comercialização de leite possui 14.500 membros produtores de leite em 48 estados que, coletivamente, enviam 23,9 bilhões de quilos de leite por ano. Isso representa 24% do suprimento de leite dos EUA.
A DFA se tornaria o licitante vencedor da Dean Foods somente após a aprovação regulatória e estaria sujeito a ofertas mais altas ou melhores em caso de falência. Em outras palavras, a DFA é o provável comprador dos ativos da Dean Foods, após o encerramento dos processos de falência.
A decisão de comprar a Dean Foods provavelmente se deve a esse fato: “Como a Dean Foods é o maior cliente da DFA, nosso foco é garantir que tenhamos um mercado seguro para o leite de nossos membros”. Essa declaração veio de Monica Massey, vice-presidente executiva e chefe de pessoal da Dairy Farmers of America.
“Graças ao planejamento estratégico e gerenciamento de nosso conselho de administração, a cooperativa tem posição financeira para suportar uma situação como esta”, continuou Massey, que inclusive, será uma das palestrantes do Dairy Vision 2019, evento que ocorrerá nos dias 26 e 27 de novembro em Campinas/SP.
Pagamento pelo leite
Os produtores de leite que vendem direto para a Dean Foods perguntarão: “Eu serei pago pelo meu leite?” Após a data do registro de 12 de novembro, a resposta é direta: “Pretendemos pagar integralmente os fornecedores, em condições normais, por bens e serviços fornecidos na data ou após a data do registro”.
O pagamento de antes do pedido de falência, em 12 de novembro, é arriscado. De acordo com a lei dos EUA, dívidas não pagas por bens e serviços fornecidos à Dean Foods antes da data do registro, também conhecidas como ‘pedidos de pré-petição’, geralmente não podem ser pagas sem a aprovação específica do tribunal.
A Dean Foods posteriormente acrescentou em uma seção de comentários: “Lamentamos sinceramente qualquer inconveniente que isso possa causar.”
Queda nas vendas
A Dean Foods se acomodou ao se tornar a líder em processamento de leite fluido. Para chegar ao auge, comprou marcas regionais na ‘velocidade da luz’. Como resultado, a empresa sediada em Dallas, Texas, recebeu US$ 12,4 bilhões em vendas em 2008. Desde então, tudo passou ao declínio, com as vendas derrapando para US$ 7,7 bilhões em 2018. Isso representou uma queda livre de 37% em apenas uma década (de US$ 12,4 bilhões para US$ 7,7 bilhões).
O ano novo não começou melhor. As vendas do primeiro trimestre de 2019 caíram 9% em relação ao ano anterior, atingindo US$ 1,8 bilhão e isso ficou muito abaixo das previsões dos analistas, que eram de US$ 7,2 bilhões (quando estendida para o ano todo).
Essa situação fez com que alguns dos principais talentos saíssem da corporação, como Ralph Scozzafava, que era o CEO por quatro anos e Eric Beringause, que assumiu as rédeas em agosto. O CFO que a Dean Foods havia contratado no ano passado, Jody Macedonio, saiu no final de setembro.
Em maio de 2013, as ações da Dean Foods foram negociadas em mais de US$ 40 por ação. Em outubro de 2018, caíram para US$ 8. Na segunda-feira, 11 de novembro, antes da declaração de falência, ela alcançou US$ 1 por ação. Vale destacar que em 2007, a revista Dairy Foods classificou o conglomerado como a principal empresa de laticínios da América. Naquele ano, teve US$ 11,8 bilhões em vendas.
Em 2018, a Dean Foods caiu para a terceira posição, com a Nestlé EUA e sua empresa-mãe, a Nestlé da Suíça, em primeiro lugar, com US$ 14,1 bilhões em vendas. A holding número 2 é a Saputo Inc., com sede em Montreal, Quebec, Canadá e vendas de US$ 8,3 bilhões.
Leite fluido como foco central
Além de se especializar em leite fluido, a Dean também se concentrou no volume para competir. Esse modelo se tornou vulnerável quando contas-chave, como a Walmart e a empresa proprietária da cadeia Food Lion, cortaram laços e tomaram a decisão de processar seu próprio leite.
A situação tornou-se tão grave que a empresa “consideraria a sua própria venda, tornar-se privada, vender ativos, formar uma joint venture ou buscar uma fusão”, escreveu Heather Hadden em um artigo de 28 de fevereiro de 2019 no The Wall Street Journal.
A empresa atou suas mãos até certo ponto na reestruturação da dívida em fevereiro, quando acrescentou propriedade imobiliária como garantia contra seu endividamento. Essa medida deu aos credores o direito a algumas receitas se os ativos fossem vendidos. Também deu ao gigante do leite menos flexibilidade em futuras mudanças nos negócios. Essa decisão estabeleceu o caminho para o processo judicial de 12 de novembro no Distrito Sul do Texas.
Mais concorrência
A maioria dos analistas do mercado de lácteos concordaria que a Dean Foods não fez o suficiente para inovar. Embora tenha consolidado muitas marcas regionais com sua marca DairyPure, o que estava no recipiente – o leite fluido – permaneceu basicamente o mesmo. O DairyPure detém cerca de 10% do mercado nacional.
Em cinco anos, a Fairlife – uma concorrente inovadora da Dean Foods – aumentou as vendas de zero para US$ 450 milhões, observou uma fonte líder da indústria de laticínios em um artigo de 2 de novembro no The Wall Street Journal. Esse produto tem 50% mais proteína e metade da lactose do que o tradicional leite em garrafa.
Outros fatores
Além disso, o declínio pode ser atribuído a outros fatores, inclusive, à geração millennial, que é preocupada com o bem-estar animal, o tratamento de vacas leiteiras, trazem como popular os hábitos veganos e revisão constante dos seus menus.
O leite, sempre tão comum nas tigelas com cereais matinais, hoje é colocado ‘em cheque’. Há também hoje uma maior diversidade de bebidas sendo oferecidas, como águas engarrafadas (com ou sem sabor, com ou sem bolhas), sucos (prensados a frio ou tradicionais), chás (regulares, verdes, pretos, vermelhos) e refrigerantes. Sem contar as opções de bebidas vegetais, que são encontradas feitas com castanhas, aveia, arroz e soja. Não se esquecendo dos leites orgânicos ou especiais, como o leite de cabra.
Segundo Darren Seifer, analista da indústria de alimentos e bebidas da NPD, em 1989 o leite estava presente em 15% em todas as ocasiões em casa, e hoje, essa porcentagem é de 9%. “É um declínio bastante acentuado na frequência com que tomamos leite, sem mencionar as alternativas lácteas”. Na sua opinião, as bebidas à base de plantas deram um grande salto e influenciaram nessa ‘redução láctea’. A geração millenum está preocupada com o que colocam em seus corpos e sabem que há opções para substituir o leite que não são de vaca e que têm bom gosto.
Enquanto essas e outras inovações ocorreram, a Dean Foods continuou se arrastando. E, hoje, está em ruína financeira.