Plataforma desenvolvida pela Nestlé Brasil usa inteligência artificial e machine learning para prever demanda e evitar falta de produtos nas prateleiras.
Garantir que os produtos estejam disponíveis no momento da compra é um dos principais desafios do varejo. Para enfrentar essa questão, a Nestlé Brasil desenvolveu a plataforma SISO, que usa inteligência artificial (IA) para prever rupturas de estoque e otimizar a reposição de mercadorias. “A ideia surgiu há cerca de dois anos, quando percebemos que esperávamos uma ruptura acontecer para só então agir, o que já era tarde demais”, explica Brunno Ragonha, diretor de Data Science & Analytics da empresa.
A ferramenta analisa dados de vendas, estoques e tempos operacionais para antecipar possíveis falhas na reposição. A lógica é simples: se um produto tem dez dias de cobertura, mas o tempo de reposição leva 15 dias, haverá um período de falta. Com a SISO, é possível prever essas situações e ajustar os pedidos antes que o produto realmente acabe.
O sistema cruza informações de diferentes fontes, como histórico de vendas, estoque disponível e prazos de reposição, para calcular o volume ideal de pedidos. “Quando há ruptura, tanto a Nestlé quanto o cliente perdem. O consumidor não encontra o produto, o cliente deixa de vender e a nossa marca é impactada. O objetivo é trabalhar juntos para evitar isso”, afirma Ragonha.
Para que empresas possam utilizar a plataforma, elas precisam passar por um processo de cadastramento que envolve a integração de seus sistemas de dados com a SISO. Dependendo da maturidade tecnológica de cada parceiro, esse processo pode ser mais ou menos complexo. Empresas com soluções prontas, como Nielsen e Scantrack, já conseguem enviar dados de forma padronizada para a plataforma, enquanto outras precisam de um processo mais customizado, que pode ser feito via um portal próprio, o Conecta, onde a Nestlé processa manualmente as informações.
Além da previsão de demanda, a plataforma melhora a gestão de estoque ao sugerir quantidades ideais para evitar tanto excessos quanto escassez. O sistema também monitora a movimentação de mercadorias dentro das lojas e entre centros de distribuição para evitar gargalos.
Como o sistema funciona
Para operar com precisão, a SISO utiliza machine learning na análise e depuração de dados. O primeiro passo é garantir que as informações recebidas dos clientes estejam corretas. “Trabalhamos com múltiplos sistemas e formatos de dados. Um erro na unidade de medida, como registrar quilos em vez de toneladas, pode comprometer toda a análise”, destaca Ragonha. A IA identifica inconsistências e, se necessário, aciona o cliente para ajustes.
A automação via machine learning permite processar grandes volumes de dados rapidamente e ajustar os modelos conforme necessário. Se um modelo apresenta baixa precisão, a IA identifica a melhor alternativa e refaz os cálculos. “Isso nos permite escalar a solução sem perder qualidade, garantindo previsões mais confiáveis para a equipe de vendas e logística”, diz Ragonha.
Resultados alcançados
Na prática, a SISO já mostrou impacto nos resultados. Segundo a Nestlé, a ferramenta ajudou a reduzir em 35% as rupturas de estoque nos clientes que adotaram o sistema. Com mais produtos disponíveis, as vendas aumentaram. Além disso, o acesso a dados mais precisos gerou insights valiosos para os parceiros, permitindo aprimorar processos internos.
“Ao detectar inconsistências nos dados enviados, conseguimos dar feedbacks que ajudam o cliente a melhorar sua própria operação. Esse aprendizado se estende para outros produtos e áreas do negócio, criando um ciclo de melhoria contínua”, afirma o executivo.
A interação entre as equipes técnicas e comerciais também se mostrou essencial. “Muitas vezes, soluções técnicas isoladas não captam nuances do dia a dia do varejo. O diferencial está em cocriar com a área de negócios, trazendo insights que os dados sozinhos não revelariam”, diz Ragonha.
Desafios no caminho
A implementação da ferramenta, no entanto, trouxe desafios. Um dos principais foi a performance do sistema diante do volume massivo de dados. “Precisamos otimizar códigos e garantir que a infraestrutura suportasse o processamento em escala. O machine learning exige monitoramento contínuo para manter a precisão das previsões”, explica ele.
Outro obstáculo foi integrar a ferramenta a clientes com diferentes níveis de maturidade tecnológica. Para resolver isso, a Nestlé estruturou múltiplos canais de entrada de dados. Empresas especializadas já fornecem informações padronizadas, mas outros clientes precisam de soluções customizadas. “Alguns preferem enviar os dados por um portal próprio, chamado Conecta, onde os processamos manualmente”, detalha executivo.
Independentemente da tecnologia utilizada, o fator crítico para o sucesso da plataforma é a qualidade da comunicação entre a Nestlé e seus parceiros. “O sistema funciona bem quando há troca eficiente de informações. Nosso papel é garantir que os dados cheguem da melhor forma possível para que possamos tratá-los e transformá-los em decisões estratégicas”, conclui Ragonha.