*Cícero Hegg
Há alguns anos, quando passava por uma fase bastante difícil em minha vida, encontrei um vizinho no elevador, que me perguntou como eu ia. Fui absolutamente sincero: respondi que não estava nada bem. A reação de susto e surpresa que ele demonstrou com a minha resposta me fez pensar o quanto esperamos que todos a nossa volta, no círculo pessoal ou corporativo, estejam ligados no piloto automático. A resposta que o meu vizinho esperava seria um protocolar “vou bem. E você?”.
Lidero uma empresa que conta, hoje, com mais de 1.600 colaboradores diretos, a quem eu procuro sempre chamar pelo nome. Quando pergunto a eles como vão, espero uma resposta sincera. Espero que falem de suas vidas, de suas famílias, de seus planos para o futuro e de como se sentem no ambiente de trabalho. E que também me digam, com sinceridade, o que podemos melhorar em nossa empresa e em nossos produtos. Foi assim que criamos o Hora da Conversa, um programa que estimula o diálogo com os gestores de maneira transparente e eficiente, uma atitude que deveria ser corriqueira no dia a dia, sem pompa, cerimônia ou momento certo para acontecer. Algumas empresas chamam essa troca de feedback, mas acredito que o melhor caminho é falar do presente, vislumbrando o futuro. O fato é que esse momento não deveria ser eventual, como durante as avaliações de desempenho que as empresas costumam fazer com seus funcionários.
A Hora da Conversa ou qualquer troca que seja verdadeira sempre será positiva. Significa que você vai investir parte do seu tempo para dividir seu sentimento e seus pensamentos com alguém. Mas ser totalmente sincero com o dono da empresa em que você trabalha nem sempre é algo simples. Por isso, durante muitos anos, realizamos na companhia um programa batizado de Despertar, com o objetivo de abrir esse canal com nossos funcionários no dia a dia, de forma objetiva e sincera, até que eles estivessem abertos a colocar essa prática na rotina.
A vontade genuína de conhecer as pessoas foi o que motivou a mim e a meu irmão Carlos, como fundadores da empresa, a criar um relacionamento verdadeiro com os produtores de leite, que nos fornecem a matéria-prima delicada que dá origem aos nossos queijos. Sempre soubemos que, para fazer um bom queijo, seria necessário ter leite de alta qualidade. E nosso desejo era reproduzir, em escala industrial, queijos que levassem o carinho artesanal e que pudessem ser apreciados por nossas famílias. Fazer isso sem ouvir os produtores era impossível. Fomos pessoalmente até eles para conhecer suas fazendas, entender como viviam e do que precisavam. Muitos deles estão conosco há 39 anos, quando a empresa foi fundada. E a forma que a gente encontrou de criar este laço e esta fidelidade foi simplesmente a transparência e a sinceridade.
Cada pessoa é um instrumento colaborativo poderoso ao ouvir o que o outro tem a dizer, com empatia ao próximo. Desta forma, conseguirmos transformar o ambiente de trabalho em um local acolhedor e humano. Costumo dizer que somos uma escola de bons princípios e valores e que também fabrica queijos. Por aqui, já passaram muitas pessoas que nos ensinaram, como também muitos que aprenderam e acabaram se curando de algo que precisavam vivenciar para evoluir.
Eu considero que a melhor forma de educar um filho é a partir do exemplo. Como as nossas atitudes sempre foram coerentes com a nossa fala, hoje mantemos um ambiente que estimula as pessoas a dizer o que estão sentindo e pensando.
Inclusive, desde o início da empresa, procuramos estimular as pessoas a serem felizes, se encontrando, se descobrindo. Não é por acaso que um dos símbolos de nossa marca é um coração. Hoje, eu tenho certeza de que este é o segredo de sucesso da empresa. Por isso, sempre que pergunto a alguém que trabalha comigo como essa pessoa vai, espero que desligue o piloto automático e me responda com sinceridade, sem temer que eu leve um susto como aquele que o meu vizinho levou há tantos anos.
*Cícero Hegg é um dos fundadores da Tirolez, empresa referência em laticínios de qualidade