Fazendas leiteiras – Seja em momentos de altas de preços em commodities ou não, a atividade leiteira não é diferente de qualquer outro negócio, é necessário ter eficiência para sobreviver.
Segundo Mateus Teixeira, zootecnista e coordenador técnico comercial de bovinos de leite da Cargill Nutrição Animal, o principal segredo para que esta atividade perdure é preciso ter um fluxo de caixa positivo, porém no médio e longo prazos é preciso ter lucro, cobrindo inclusive os custos fixos, como depreciação e a remuneração do capital investido. Para que isso seja possível, é necessário ser eficiente nos três “pilares” do negócio leite: custos de produção, volume diário produzido e receitas.
Segundo Mateus, o produtor deve buscar aumentar suas receitas agindo em todos os pontos que forem possíveis dentro da propriedade. Normalmente a principal receita é o leite vendido, seguida pela venda de animais e por último a venda do excedente de volumosos, com algumas variações nessa ordem dependendo da propriedade.
O preço recebido é fortemente impactado pela qualidade, composição e volume do leite fornecido. Portanto, o produtor deve buscar produzir leite com alto padrão de qualidade, com baixos índices de CCS e CBT (UFC) e com altos teores de proteína e gordura, e lógico, buscar fornecer o leite para laticínios que valorizem essa qualidade. O alto padrão de qualidade indica manejo e sanidade adequados para o rebanho, cenário que contribui para ganhos de eficiência técnica e econômica na fazenda.
No que tange à produção de leite diária, sem dúvidas, quanto maior o volume maior a remuneração. Apesar das importantes mudanças sofridas nos sistemas de pagamentos da maioria dos laticínios nos últimos anos, ainda percebemos que a maior influência no preço advém do volume fornecido. E não é só isso, o aumento na escala de produção contribui também para outro importante pilar, diluindo parte dos custos de produção.
O aumento da escala de produção ou do volume de leite produzido diariamente depende de dois fatores: números de vacas em lactação na propriedade e da produtividade das mesmas. O número de vacas depende da capacidade de suporte da fazenda, de acordo com a sua capacidade de alojar e alimentar seus animais. A referência é conseguir alcançar pelo menos 1 vaca em lactação por hectare na fazenda, considerando áreas de produção de volumosos e reservas ambientais na conta.
A produtividade das vacas, obviamente, quanto maior melhor, desde que respeitemos o bem estar dos animais e que os custos se mantenham equilibrados. Manejo, conforto, alimentação equilibrada e saúde permitirão aos animais expressarem todo o seu potencial produtivo.
A junção de uma boa taxa de lotação, ou seja, pelo menos uma vaca em lactação por hectare e boa produtividade dos animais, aumentarão a produção de leite total diária e também a produtividade por hectare na fazenda. Este indicador, medido em litros/hectare/ano, tem uma alta correlação com a rentabilidade do negócio. Sugere-se em sistemas menos intensivos, pelo menos 5.000 litros/ha/ano e em sistemas mais intensivos pelo menos 10.000 litros/ha/ano. Historicamente, fazendas com altas produtividades por hectare e custos equilibrados, conseguem tornar o negócio leite altamente atrativo, muitas vezes alcançando rentabilidades superiores a 10% ao ano.
O último pilar, o dos custos de produção, é sem dúvidas onde o produtor tem maior capacidade de interferência, mesmo que ele não consiga prever ou evitar que os comportamentos dos custos dos insumos impactem em seu negócio. A eficiência mais uma vez é exigida, pois mais importante do que o quanto se gasta é com o quê se gasta.
Atualmente vários projetos e grupos de assistência técnica gerenciam as despesas das propriedades e geram índices de referência que acabam sendo utilizados por todos os produtores. O mais comum é criar uma relação entre as despesas e o percentual da renda comprometido com elas.
“Os principais custos normalmente são o gasto com concentrado, volumoso e a mão de obra. O ideal é que o comprometimento da renda bruta esteja entre 8 e 10% com volumoso, entre 30% e 35% com concentrado e entre 10 e 12% com mão de obra”, explica Mateus.
Esses valores são resultados históricos médios de propriedades consideradas economicamente eficientes na atividade, portanto, são possíveis de serem alcançados e contribuem para um resultado econômico satisfatório. Contudo, é necessário ter cuidado com a interpretação desses índices, que acabam se tornando metas.
Os fatores que impactam esses números sofrem muita interferência regional, pelas características específicas da cadeia produtiva na região e por isso mesmo podem distorcer os indicadores. Por exemplo, o custo da ração de dois produtores pode ser o mesmo e um deles comprometer 30% da sua renda com este custo e o outro 35%. Para isso, basta que o preço recebido pelo leite por eles seja diferente. Podemos erroneamente afirmar que a propriedade que compromete 35% da sua renda com ração é menos eficiente para comprar insumos, porém na verdade a sua bacia leiteira é a que tem menor preço pago ao produtor.
Durante a pandemia este quadro ficou ainda mais evidente e complexo, pois os preços do leite subiram muito e os insumos também. As relações entre custos e receitas mudaram e podem estar criando falsas ineficiências nas propriedades. Nesses casos onde a eficiência técnica continuou e os indicadores econômicos fugiram dos valores referência, deve-se ter cautela e lembrar que a atividade leiteira deve ser analisada no longo prazo e não se pode ser conclusivo avaliando curtos períodos com alta instabilidade no mercado. O foco é manter a produção e os bons resultados técnicos para voltar a colher melhores frutos quando o mercado se estabilizar.
Independentemente do cenário de preço e custos não podemos nos esquecer da produtividade dos animais e da produção total de leite. Há muitos anos no Brasil, várias análises estatísticas mostram que o volume de leite produzido por dia nas fazendas é o principal fator de influência para o sucesso econômico da atividade leiteira, sendo que quanto maior o volume diário, maiores as chances de a atividade ser viável e atrativa economicamente.
Se o produtor estiver com o caixa apertado, com os custos acima dos índices ideais, a primeira coisa a se fazer é reduzir despesas em setores que não comprometem a produtividade das vacas, pois a redução da média pode agravar muito a situação. O que o produtor pode fazer é buscar maneiras de tornar todo o sistema mais eficiente.
Uma estrutura que permita uso de menos mão de obra para realizar o manejo facilitando a limpeza dos cochos, bebedouros e currais, reduz custos. Produzir volumoso em quantidade suficiente e com qualidade, investindo em controle de pragas e nutrição das plantas durante a safra, reduz a dependência da ração para suprir boa parte dos nutrientes utilizados pelos animais, baixando custos com concentrado. Reter na propriedade somente a quantidade necessária de bezerras e novilhas para repor o plantel, logicamente em propriedades com rebanhos estabilizados, reduz custos com alimentação e necessidade de estrutura para animais ainda improdutivos. Essas possíveis ações são exemplos de como cortar custos sem reduzir a produtividade das vacas, que são de fato “quem” paga as contas.
Outro ponto muito importante e com grande impacto na redução de custos, é a possibilidade de se usar ingredientes variados na nutrição dos animais, focando nos nutrientes exigidos pela categoria que está sendo alimentada e não no alimento em si. Talvez, hoje este seja o maior paradigma existente na pecuária de leite brasileira. Muitos produtores têm grande resistência em utilizar sorgo, casca de soja, farelo de algodão, uréia dentre outros ingredientes, com o discurso de que não são ingredientes nobres. Na verdade, os animais possuem exigência por energia, aminoácidos, minerais e vitaminas, não interessando a fonte de onde eles vêm.
Para produtores com maior estrutura de armazenamento de insumos, sem dúvidas, vale a pena comprar estrategicamente ingredientes como polpa cítrica, uréia, caroço de algodão, DDGS, casca de soja e farelo de algodão, pois eles atendem bem a demanda nutricional e possibilitam garantir saúde e produtividade aos animais a custos menores. E para produtores sem estruturas preparadas para tantos ingredientes diferentes existe a possibilidade de buscar comprar rações e concentrados direto das fábricas de ração. As fábricas compram grandes volumes de ingredientes e conseguem construir fórmulas eficazes nutricionalmente, com custos menores que as rações de milho e farelo de soja comumente produzidas nas fazendas.
“O produtor de leite eficiente será o produtor do amanhã. Não há mais espaço para amadores com um mercado tão dinâmico e complexo como o que estamos inseridos”, finaliza.