Segmentos do agronegócio têm se mantido estáveis, mas impactos do coronavírus são inevitáveis
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Segmentos do agronegócio têm se mantido estáveis, mas impactos do coronavírus são inevitáveis

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Presidente da Aprosoja comemora números de Goiás na safra de soja / Foto: Laura de Paula/Aprosoja-GO

Pegue um clima favorável, some a investimentos pesados em tecnologia e complete com uma tradição em produção mantida desde os antepassados: pronto, tem-se aí a receita perfeita para um agronegócio de destaque, e é nesse cenário que Goiás se enquadra. O Estado é responsável por boa parte da produção de alimentos do país, produzindo anualmente bilhões de toneladas de grãos, carnes e diversos tipos de alimentos. Para dimensionar a ênfase que Goiás tem no âmbito da agricultura, a maior feira de tecnologia rural do Centro-Oeste é realizada no município de Rio Verde, atraindo milhares de pessoas todos os anos.

Todavia, o evento teve sua edição 2020 cancelada. O motivo: a pandemia do coronavírus. E não foi apenas a Tecnoshow Comigo que sofreu os impactos do vírus responsável pela Covid-19. Diversas áreas do setor do agronegócio têm se adaptado para poder continuar produzindo, industrializando, comercializando e exportando a fim de atender às necessidades alimentícias da sociedade. Apesar dos pesares, em uma comparação superficial com o resto do país, pode-se dizer que o agro goiano tem conseguido lidar bem com a crise imposta pelo coronavírus.

O setor de bovinos é um exemplo de segmento que teve quedas dentro da curva e se mantém estável até o momento. Goiás tem cerca de 22 milhões de cabeças de gado – o que representa 10,6% do rebanho nacional – e, segundo os números do Agro em Dados divulgados recentemente pela Secretaria de Estado de Agricultura, Pecuária e Abastecimento de Goiás (Seapa), as exportações têm estado dentro do esperado.

No mês de abril, por exemplo, o Estado exportou US$ 70.861.419,00 em carne bovina, o que representa 73,5% do valor nacional das exportações do complexo de carnes. Em relação ao 1º quadrimestre, os números também foram satisfatórios: foram US$ 306.487.659,00 de carne bovina exportada, ou seja, 71,5% do montante nacional.

Quanto ao preço, o mercado da pecuária bovina teve uma queda 0,38% na arroba do boi gordo (15kg) em abril em comparação com março. No comparativo com abril de 2019, o aumento real dos preços da arroba é de quase 20%. Os preços altos refletem a demanda do mercado externo, principalmente para a China, atrelada ao dólar valorizado, que pressiona os preços internos.

Queda no abate de bovinos

Mesmo com números majoritariamente positivos, o setor de bovinos também sofreu algumas quedas. Uma delas foi explicitada nos dados de abate de gado do primeiro quadrimestre de 2020, conforme dados preliminares do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa). Segundo o órgão, Goiás apresentou queda de 17,9% da quantidade de animais abatidos em comparação com o mesmo período do ano passado, significando uma retração da oferta de animais para abate.

Para o titular da Seapa, Antônio Carlos de Souza Lima, os números do Mapa não refletem necessariamente uma retração no mercado de bovinos goiano. Ele explica que redução do número de abates é simplesmente um reflexo do ajuste feito entre oferta e demanda do mercado, o que não representa realmente um prejuízo para o segmento. “Não são dados que apresentam queda, pelo contrário. Pode ter algumas reduções sim, mas tudo é questão de ajustes que estão sendo feitos em relação à oferta e demanda pelo produto. A gente tem a representação é de um crescimento nas exportações de carne bovina. Nada que represente um dano maior ao setor”, diz.

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Titular da Seapa, Antônio Carlos garante que há sensibilidade da pasta para áreas mais afetadas pela crise / Foto: Seapa

No mercado doméstico, a retração da renda das famílias, provocada pela crise da Covid-19, pode ter contribuído para a queda no consumo da carne bovina por ter preço mais elevado que as demais proteínas animais. Isso em um cenário em que o preço da carne segue em alta, pressionado pelo mercado externo que segue aquecido.

O secretário comemorou ainda a novidade que deixou o os criadores de bovinos em polvorosa. No final de maio deste ano, o Estado de Goiás foi habilitado como um dos cinco Estados que passarão a exportar carne para a Tailândia. Com a autorização, o Frigorífico Minerva, em Palmeiras de Goiás, pode agora mandar carne bovina com osso, carne desossada e miúdos comestíveis para o país asiático. De acordo com Antônio Carlos, o Estado de Goiás “acompanha mais uma vez a força que tem este setor [de bovinos] no desenvolvimento da economia”.

Setor leiteiro pode ter impacto maior, avisa secretário

Entre as áreas do agronegócio goiano que têm sido afetadas pelo coronavírus, a produção de leite é talvez a mais atingida. De acordo com Antônio Carlos, “há uma preocupação maior com o leite pela questão da expectativa de geração de renda da população”, o que pode acarretar uma redução da demanda.

Com a retração da demanda de derivados lácteos, provocada pelo recuo da renda nesse período de pandemia, estima-se redução do valor bruto de produção do leite para 2020, em Goiás. Conforme o boletim de mercado do setor lácteo goiano do mês de maio, houve na indústria de laticínios uma redução do preço médio da sua cesta de derivados lácteos, comparado com o mês anterior, em que o preço médio do leite UHT caiu 13,2%. Isso acaba refletindo diretamente no mercado de laticínios, uma vez que tem nos derivados os produtos em que conseguem agregar maior valor. Isso, consequentemente, é repassado ao produtor, que sofre o impacto na produção do leite in natura.

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Mesmo sendo o quarto maior produtor de leite do Brasil, Goiás pode enfrentar dificuldades com a pandemia / Foto: Seagri

Segundo a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), no mês de março, em relação ao preço no varejo, o preço do leite longa vida integral teve alta de 26,4%, em relação ao mês de fevereiro. A alta é explicada pela corrida aos supermercados verificada no início do isolamento social. Em abril, já foi verificado um recuo no preço de 11,7%, em relação ao mês anterior.

Goiás é hoje a quarta maior bacia leiteira do Brasil, com uma produção superior a 3 bilhões de litros por ano. A região Sul do Estado corresponde a 46,9% da produção. Todavia, a produtividade média do Estado é baixa, com 1.597,5 litros/vaca/ano, inferior à média brasileira, que é 2.068,8 litros/vaca/ano.

O secretário garante que quando a atividade leiteira, presente nos 246 municípios de Goiás, “é abalada dessa forma, pela representatividade que ela tem, surge uma sensibilidade maior” na análise da questão. “Além disso, estamos em um período de entressafra da produção [de leite]. Naturalmente o mercado vai regulando essa relação oferta-demanda. A expectativa é que com o tempo isso se ajuste e os produtores de leite possam superar esses baixos preços recebidos pela matéria-prima”, pontua.

Mesmo com a atual conjuntura, num cenário geral os produtores de leite também tiveram boas notícias. No fim de maio, a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, anunciou que a Tailândia, além da carne bovina, também abriu seu mercado para lácteos do Brasil. A ministra afirmou que a abertura de mercados pode contribuir para melhorar a situação dos produtores de lácteos, um dos segmentos mais afetados pela pandemia e que, historicamente, enfrenta problemas de preços.

Soja e milho em alta

Em pleno período de instabilidade dos mercados goianos, o de grãos pode ser visto como o menos afetado pela crise e que mais trouxe motivos para comemoração, principalmente no que se refere aos reflexos na economia do Estado.

No último mês, Goiás passou a figurar como o terceiro maior produtor de grãos de todo o país. Foram 27,1 milhões de toneladas de grãos, área cultivada superior a seis milhões de hectares e produtividade de 4.511 quilos por hectare na safra 2019/2020. De acordo com os dados da Conab, houve crescimento de 10% na estimativa de produção goiana, de 6,1% na área de cultivo e de 3,7% em produtividade em relação à safra anterior, com Goiás, agora, representando 10,8% da produção nacional de grãos – atrás apenas do Mato Grosso e Paraná.

Entretanto, os produtores goianos só conseguiram chegar a essa marca por causa da má sorte dos rio-grandenses-do-sul, cujo Estado era até então consolidado como o terceiro maior produtor do Brasil. Segundo o presidente da Associação de Produtores de Soja de Goiás (Aprosoja), Adriano Barzotto, Goiás foi beneficiado por um golpe de sorte.

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Para Adriano Barzotto, última safra de soja foi uma das melhores dos últimos anos / Foto: Fredox Carvalho/Faeg

“Nós temos que entender que chegamos ao terceiro posto de produção por conta de uma infelicidade dos produtores do Rio Grande do Sul, que tiveram uma seca muito forte. Naturalmente, eles ficam em terceiro e a gente em quarto. Mas este ano foi muito bom para nós e conseguimos passar as 3 milhões de toneladas de soja no Estado e eles caíram abaixo de 10. Mas são todos Estados irmãos, que produzem do mesmo produto e temos que ajudar um ao outro”, avaliou Barzotto.

Ainda conforme o presidente da Aprosoja, outro golpe de sorte se deu no timing da última safra. Ele explica que há grandes diferenças entre a produção e industrialização da soja e o final dessa primeira coincidiu justamente com o início da pandemia do coronavírus, o que fez com que os produtores não tivessem prejuízo. “Da parte da produção a gente teve muita sorte, porque a pandemia se intensificou justamente quando estávamos terminando a safra. Então o produtor já estava ali embalado na colheita, fez os cuidados necessários pra poder terminar a safra.  Ela aconteceu e foi inclusive uma das melhores safras que nós tivemos nos últimos anos”, disse.

Já a parte da industrialização é o que preocupa Barzotto. Segundo ele, é uma fase que no atual contexto de pandemia será delicada, uma vez que as indústrias deverão se atentar ainda mais à forma de trabalho dos funcionários. “A indústria muitas vezes tem lá seus 400, 500 funcionários, e, se ela tiver algum problema nessa questão do coronavírus, pode ser fechada, e a cadeia de produção e industrialização e comercialização fica comprometida”, afirmou.

Barzotto conta que no próximo mês começa a colheita do milho e algumas propriedades podem ter restrição de funcionários. Porém, ele esclarece que a Aprosoja “vem orientando e pedindo para que todos os proprietários de fazenda tomem os devidos cuidados”.

“Preço vai compensar e o produtor vai conseguir fazer uma renda”, diz Barzotto sobre safra de milho deste ano / Foto Wikipedia

De acordo com ele a produtividade menor de milho neste ano não vai impedir o lucro do produtor. “Tivemos boas chuvas, embora tenhamos plantado uma parte da nossa safra dentro do mês de março, que não é o período ideal de plantio, mas vimos que tinha condição. E a gente acredita que o preço do milho vai se manter aí próximo dos 40 reais [saca], e mesmo tendo um pouquinho menos de produtividade por hectare, o preço vai compensar e o produtor vai conseguir fazer uma renda”, ponderou.

Estima-se incremento de safra de milho de 10,9%, ante a safra 2019/2020, segundo a Conab. Já conforme a Agro em Dados, no Brasil, a produção de etanol a partir do milho vem ganhando cada vez mais espaço. Depois de uma variação de 107,4% na safra 2019/20 em relação à safra 2018/19, espera-se uma variação de 61,1% na safra 2020/21 ante a safra 2019/20, atingindo 2.699.808.000 litros.

Na relação comercial com o resto do mundo, em virtude da crise do petróleo e também da pandemia, a exportação de milho do Brasil, no primeiro quadrimestre do ano, em comparação com o mesmo período de 2019, apresentou redução de 54,2% nos valores exportados. Em Goiás, também houve declínio, contudo a redução foi menos expressiva, com 15,4%.

Cana-de-açúcar: produção forte de etanol e açúcar

O setor de produção de cana-de-açúcar é outro que pode se gabar de bons números. Para se ter uma noção, na última Safra (2019/2020), a produção brasileira foi recorde. Segundo estatísticas da Agro em Dados, para a safra atual, a expectativa é que a produção siga voltada à fabricação de açúcar, em resposta ao mercado que sinaliza cenário positivo, especialmente para as exportações.

Segundo o secretário Antônio Carlos de Souza Lima, apesar de produção de cana-açúcar se voltar mais para o etanol, está havendo uma virada neste ano. “A produção de cana é quase 80% para o etanol e 20% para o açúcar. Mas agora estamos vendo uma virada e a produção de cana para o açúcar pode ter aí um incremento de 15%, chegando a 35%”, disse.

No primeiro quadrimestre do ano, as exportações brasileiras do Complexo Sucroalcooleiro atingiram o montante de US$ 1.976.548.053,00 e 6.176.963,8 toneladas, aumento de 32,9% e 30,2%, respectivamente, em relação ao mesmo período do ano anterior. Vale ressaltar que Goiás é o segundo maior produtor do país, atrás apenas de São Paulo, sendo o único entre os maiores produtores a registrar aumento de produção em relação à safra anterior.

Bons ventos para o agronegócio

Presidente da Assembleia Legislativa de Goiás (Alego), o deputado Lissauer Vieira (PSB) também é um dos maiores representantes dos produtores rurais no Estado. Otimismo é o que não falta para o parlamentar em relação à área que, segundo ele, “alavanca a economia” do Estado.

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“Agro alavanca o país”, defende Lissauer / Foto: Divulgação

“Eu tenho certeza que o agro é o setor que vai alavancar a economia do país mais uma vez. Nas maiores crises que o país passou foi o agro que levantou. Goiás é um Estado privilegiado porque é altamente produtor de alimentos. Então em toda a cadeia do setor primário, alimentício, Goiás teve muita produção”, declarou.

Para Lissauer, os goianos são beneficiados com “um clima bom, terras férteis, a tecnologia de agricultura para a região Centro-Oeste. “O produtor hoje tem condições de fazer alta produtividade”, concluiu.

A partir de segunda-feira, 18 de novembro, agricultores se mobilizam contra o acordo de livre-comércio entre a Europa e cinco países da América Latina, rejeitado pela França. François-Xavier Huard, CEO da Federação Nacional da Indústria de Laticínios (FNIL), explica a Capital as razões pelas quais o projeto enfrenta obstáculos.

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