Animais ruminantes, como os bovinos, têm um estômago mais resistente que muitas outras espécies, capaz de conviver bem com bactérias resistentes a quase todos os antibióticos que conhecemos.

Animais ruminantes, como os bovinos, têm um estômago mais resistente que muitas outras espécies, capaz de conviver bem com bactérias resistentes a quase todos os antibióticos que conhecemos. A descoberta é de uma pesquisa da Universidade Federal de Viçosa. O artigo, de autoria da farmacêutica Yasmin Neves Vieira Sabino, de 26 anos, foi publicado pela revista Nature Communications.

O trabalho traz uma grande novidade para a ciência e um desafio para as medicinas humana e veterinária, porque algumas espécies de bactérias que colonizam o rúmen – a primeira câmara do estômago desta espécie, possuem novos mecanismos para transferir os genes de resistência aos antibióticos para outras espécies, impactando na resposta desses microrganismos aos tratamentos conhecidos pela medicina.

A pesquisa publicada é fruto da dissertação de mestrado de Yasmim no Programa de Pós-Graduação em Microbiologia Agrícola da UFV, orientada pelo professor Hilário Mantovani. Durante o estudo, ela avaliou os genomas de bactérias ruminais disponíveis na literatura científica para identificar genes de resistência desta classe de medicamentos.

Pesquisa

Para compreender o alcance do trabalho, é necessário entender que os antibióticos, antes de serem usados para combater doenças bacterianas, também são utilizados, em dosagens baixas, como rotina na alimentação dos animais para promover o crescimento deles. Nestas dosagens, os remédios promovem a seleção de bactérias resistentes, dificultando o combate às doenças.

O problema é que estes microrganismos resistentes podem atingir os humanos, principalmente por meio da liberação nas fezes ou pela contaminação de produtos de origem animal, como carne e leite.

A falta de alternativas terapêuticas para combater bactérias cada vez mais resistentes já é um problema de saúde pública em todo o mundo, mas a pesquisadora esclarece que a culpa pelo aumento da incidência de bactérias multirresistentes não pode ser atribuída apenas ao uso de antibióticos na alimentação animal.

A utilização inadequada em humanos e os tratamentos administrados, e interrompidos, sem orientação médica também contribuem para a seleção de bactérias resistentes a múltiplos antibióticos.

No período em que esteve na Queens University, na Irlanda do Norte, para ampliar a pesquisa, Yasmin validou a resistência em testes de laboratório (in vitro), comprovando que os genes de resistência estavam sendo expressos nas bactérias do rúmen.

Ela também descobriu que o gene de resistência à tetraciclina, um dos antibióticos que foram mais usados na alimentação dos animais durante muito tempo e que ainda é usado para fins terapêuticos, vem sendo selecionado ao longo do tempo e está distribuído em diversas espécies de bactérias do trato gastrointestinal de animais.

A maior contribuição do trabalho, entretanto, foi a descoberta de um novo elemento genético móvel, capaz de transferir o gene de resistência à tetraciclina para diferentes bactérias. “Uma bactéria inofensiva, e até benéfica no rúmen, pode transferir o gene de resistência a uma linhagem patogênica. Esse cenário inviabilizaria o uso da tetraciclina como opção terapêutica”, explicou a jovem.

Para o professor Hilário Mantovani, a caracterização do novo elemento carreador de resistência alerta para o risco do uso de antimicrobianos na produção animal. “O rúmen pode funcionar como um reservatório de genes de resistência a antibióticos que podem ser transferidos para o ambiente em escala maior do que pensávamos, representando um risco potencial para a saúde humana e animal”, alertou o orientador do trabalho.

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