O desenvolvimento de um sorvete dietético à base de leite de cabra, contendo probióticos e prebióticos, pode contribuir para ampliar a oferta de alimentos funcionais tendo o leite caprino como principal ingrediente.
scoop of vanilla ice cream

O desenvolvimento de um sorvete dietético à base de leite de cabra, contendo probióticos e prebióticos, pode contribuir para ampliar a oferta de alimentos funcionais tendo o leite caprino como principal ingrediente. A pesquisadora da Embrapa Agroindústria de Alimentos (RJ) Karina Olbrich destaca que os testes iniciais mostraram que a formulação do sorvete ajudou a reduzir a taxa de glicemia de pessoas saudáveis e que também é adequada ao consumo por pessoas diabéticas. Isso porque o diabetes tipo 2 vem sendo associado a um desequilíbrio da microbiota intestinal (denominado disbiose) e os probióticos e prebióticos podem contribuir para reequilibrar a população de microrganismos no intestino.

O sucesso dos primeiros testes animou os pesquisadores que buscam agora parceiros da iniciativa privada para ampliar a validação dos resultados e desenvolver o escalonamento para uma produção industrial. Por isso, o sorvete foi selecionado entre os produtos a serem apresentados no fim de outubro no Workshop Nichos de Mercado, em São Paulo (veja quadro).

Além do leite de cabra, o sorvete contém cacau em pó, o prebiótico inulina, a bactéria probiótica Bifidobacterium lactis e sucralose. A pesquisadora explica que tanto os probióticos como os prebióticos agem sobre a microbiota (flora) intestinal. Os probióticos são microrganismos que promovem efeitos benéficos para a saúde, se ingeridos regularmente e em quantidades adequadas. “Esses microrganismos, geralmente lactobacilos e bifidobactérias, devem chegar vivos ao cólon intestinal (intestino grosso), onde permanecem temporariamente e exercem atividades benéficas para o organismo”, explica.

Já os prebióticos, conta a pesquisadora, são compostos não digeríveis, geralmente fibras alimentares, que estimulam seletivamente o crescimento de bactérias benéficas, como lactobacilos e bifidobactérias. “Os prebióticos passam pelo estômago e intestino delgado humano sem serem digeridos, chegando quase intactos ao cólon intestinal, onde são fermentados pelas bactérias intestinais benéficas, promovendo seu crescimento e a geração de substâncias benéficas à saúde”, esclarece Olbrich.

Apresentação ao mercado

O sorvete estará entre as inovações apresentadas no V Workshop Nichos de Mercado para o Setor Agroindustrial, que a Embrapa realiza com o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae Nacional) no Memorial da América Latina (SP), evento que acontece paralelamente ao congresso gastronômico Mesa São Paulo 2019, de 24 a 27 de outubro.

O objetivo é aproximar indústrias, produtores rurais e segmentos do mercado interessados em parcerias e negócios relacionados a ativos desenvolvidos pela Embrapa. As inscrições para o Workshop são gratuitas e podem ser feitas no site do evento.

565b2840 6e3d b106 888a 5f9eed53ccc6?t=1569323126818

O desenvolvimento do sorvete foi realizado em parceria com a nutricionista e professora do Instituto Federal do Ceará (IFCE), Masu Portela, e a professora da Universidade Federal do Ceará (UFC), Sueli Rodrigues. Os testes de desenvolvimento das formulações e a maior parte das análises químicas, microbiológicas e sensoriais durante a estocagem do produto, visando checar a estabilidade, foram feitos no Laboratório de Ciência e Tecnologia de Alimentos (LCTA) da Embrapa Caprinos e Ovinos (CE).

Os primeiros testes clínicos foram realizados na própria Embrapa Caprinos e Ovinos e em três postos de saúde do município de Sobral, tanto com pacientes diabéticos quanto não diabéticos. “Indivíduos saudáveis e diabéticos foram submetidos aos testes para avaliar a resposta glicêmica ao sorvete, ou seja, verificar se o consumo do sorvete reduzia a glicemia, em comparação com a ingestão de glucose. Os resultados foram positivos, pois os níveis de glicemia após o consumo do sorvete foram menores em ambos os grupos, embora o efeito só tenha sido estatisticamente significativo no grupo saudável”, detalha a pesquisadora da Embrapa.

Segundo ela, a formulação do sorvete foi bem-sucedida, pois o produto foi capaz de manter populações elevadas de bifidobactérias durante a estocagem sob congelamento, conforme exige a legislação, e os testes de simulação da digestão indicaram que as bifidobactérias resistiriam bem à passagem pelo trato gastrintestinal, importante para os efeitos benéficos dos probióticos no intestino. “Além disso, a aceitação sensorial do sorvete foi alta entre diabéticos, nosso público-alvo. O ensaio clínico também forneceu resultados importantes, confirmando o baixo índice e carga glicêmica do sorvete e seu baixo impacto na glicemia após o consumo, que favorece o controle glicêmico para os diabéticos”, diz.

A ideia da parceria para o desenvolvimento do estudo foi resultado do convênio entre a Embrapa e o IFCE – Campus Sobral, com alunos do curso em Tecnologia de Alimentos que fizeram estágio de graduação na Embrapa Caprinos e Ovinos. “Quando a Masu foi fazer doutorado na Rede de Biotecnologia do Nordeste (Renorbio), ela buscou parceria com a Embrapa, e o projeto de desenvolvimento de alimentos probióticos a partir de leite de cabra estava em execução”, conta a cientista.

“O sorvete é um produto que favorece o funcionamento do trânsito gastrointestinal e apresento baixo teor calórico comparado aos outros sorvetes do mercado”, acrescenta Masu.

As pesquisadoras ressaltam que, apesar de bastante promissores, esses resultados são iniciais e serão necessários mais testes para a validação dos resultados.

Probióticos a partir de leite de cabra

Karina conta que tem trabalhado com probióticos desde 2007. Segundo ela, a ideia inicial foi desenvolver produtos probióticos à base de leite de cabra, buscando agregação de valor e diversificação da oferta de derivados lácteos caprinos com foco em alimentos funcionais, ou seja, em produtos que oferecessem benefícios à saúde além das necessidades nutricionais básicas.

“O leite de cabra já se destaca como um alimento valioso do ponto de vista nutricional e de saúde, em razão de sua maior digestibilidade e menor potencial alergênico, em comparação com o leite bovino. Nos pareceu relevante agregar novas funcionalidades ao leite caprino, gerando produtos adicionados de bactérias probióticas e ampliando as oportunidades de mercado”, conta a cientista.

e010c5f9 6089 cf55 85c2 f3846a6db61a?t=1571423910612

Por que um sorvete?

Segundo a pesquisadora, dependendo dos ingredientes utilizados, o sorvete vem sendo reconhecido como alimento que pode fazer parte de uma alimentação saudável, ter um alto valor nutricional e veicular compostos bioativos.

O principal desafio tecnológico, de acordo com Karina, é garantir a viabilidade dos microrganismos probióticos no alimento durante o armazenamento, até o momento do consumo. Além disso, eles devem ser capazes de sobreviver durante o processo de digestão do alimento até chegar ao intestino, onde sua ação acontece.

“Uma alta concentração de microrganismos vivos no produto na prateleira e após sua digestão é uma exigência da legislação brasileira e internacional. No caso dos sorvetes, etapas como a aeração podem afetar a sobrevivência de bactérias probióticas, pois muitas delas toleram pouco, ou não toleram, o contato com o oxigênio. O próprio processo de congelamento, se não for adequado, pode danificar as células bacterianas”, explica.

Segundo ela, ajustes nas etapas de processamento e a seleção de uma cultura probiótica capaz de resistir a todos esses desafios foram importantes para a obtenção do sorvete.

Foto: iStock

Perspectivas

Outros produtos probióticos à base de leite de cabra já foram desenvolvidos pela Embrapa utilizando diferentes culturas comerciais: queijo cremoso, queijo semicurado, petit suisse com maracujá, sorvete com cajá, e leite fermentado com suco de uva e enriquecido com polifenóis e fibras da casca de uva.

Segundo a pesquisadora, o trabalho com probióticos continua, principalmente com bactérias nativas do Brasil, isoladas de leite e produtos lácteos caprinos, que demostraram ter propriedades probióticas em testes in vitro e in vivo. “Novos produtos com as bactérias nativas estão sendo desenvolvidos em projeto da Embrapa Agroindústria de Alimentos, incluindo produtos vegetais, como smoothie e bebida à base de cereais”, conclui.

Bryce Cunningham, um produtor de leite escocês, proprietário de uma fazenda orgânica em Ayrshire (Escócia), lançou um produto lácteo para agregar valor ao leite de sua fazenda, que é um produto de ótima qualidade, sem aditivos, e é um exemplo de economia circular.

Você pode estar interessado em

Notas
Relacionadas

Mais Lidos

Destaques

Súmate a

Siga-nos

ASSINE NOSSO NEWSLETTER