Uma adaptação bem-sucedida no período de transição resulta em uma lactação saudável e produtiva, garantindo o bem-estar das vacas e a rentabilidade econômica da fazenda

Uma adaptação bem-sucedida no período de transição resulta em uma lactação saudável e produtiva, garantindo o bem-estar das vacas e a rentabilidade econômica da fazenda

hannaArtigo escrito por Hanna Caroline Prochno, médica veterinária, doutoranda em Ciência Animal e marketing/comunicação na científica da JA Saúde Animal

O período periparto ou período de transição das vacas leiteiras, que compreende o último mês de gestação e o primeiro mês da lactação, é o período mais crítico da vida da vaca devido a mudanças fisiológicas do último mês de gestação, e podem causar redução de até 30% na ingestão de matéria seca (MS), causando supressão do sistema imune e consequente ocorrência de enfermidades.

Essas mudanças fisiológicas têm a finalidade de preparar a vaca para o parto e lactação, e ocorrem devido à três principais causas: diminuição da ingestão de MS pela diminuição da capacidade retículo-ruminal e taxa de passagem da dieta, devido ao grande espaço que o bezerro ocupa na cavidade abdominal nas últimas semanas de gestação; mobilização de anticorpos para a produção de colostro, fator que diminui a concentração sérica de anticorpos, ocasionando uma queda na imunidade da vaca; e pelo início da lactogênese, em que reinicia uma nova proliferação celular na glândula mamária para a produção da próxima lactação. O estado de imunodepressão também possui relação com o estresse desse período e com a liberação endócrina de glicocorticóides, resultando em uma diminuição na função dos neutrófilos e na produção de linfócitos.

Cerca de 30 a 50% das vacas lactantes são afetadas por alguma doença metabólica ou infeciosa no período de transição, sendo que 75% das doenças ocorrem neste período. Algumas das principais doenças que ocorrem durante o periparto são: hipocalcemia, cetose, retenção de placenta, metrite, deslocamento de abomaso, mastite, acidose, laminite, entre outras, todas elas intimamente correlacionadas. No entanto, a presença dessas doenças pode passar despercebida, uma vez que nem sempre se associa a sinais clínicos.

Hipocalcemia e cetose

Entre as doenças metabólicas, a hipocalcemia e a cetose são as que mais ocorrem. Nos primeiros dias da lactação, geralmente nas primeiras 72 horas após o parto, a maioria das vacas apresenta algum grau de hipocalcemia devido à grande mobilização de cálcio sanguíneo para a produção do colostro e leite, por isso, o nível sérico fica baixo para suportar a função nervosa e muscular adequada. A doença clínica é fácil de ser diagnosticada, portanto o tratamento é realizado de imediato. No entanto, na forma subclínica os sintomas são inespecíficos, como por exemplo, diminuição da contração da musculatura lisa, afetando a motilidade do rúmen e abomaso, ocasionando diminuição da passagem da ingesta e consequente redução da ingestão de MS pela vaca. Há também diminuição da produção de leite, assim como aumento da incidência de outras patologias, como a mastite e a retenção de placenta.

Após o parto, além da alta demanda de cálcio também aumenta a demanda de energia para a produção leiteira a partir da glicose. As necessidades da vaca relacionadas a glicose no período de transição passam de 1 kg/dia para 2,5 kg/dia nas 3 semanas pós-parto. O pico da demanda energética é observado próximo à quarta semana de lactação, porém o aumento da ingestão de MS atinge seus valores máximos somente após oito semanas de lactação. Este desequilíbrio entre a energia demandada e a ingerida pelo animal é conhecido como balanço energético negativo (BEN) e faz com que a vaca busque fontes alternativas de energia, através da degradação do tecido adiposo, com consequente perda de peso. Este aporte energético reduzido ao qual o animal é submetido constitui mais um fator predisponente a doenças, além de causar a depleção de diversos metabólitos e hormônios diretamente ligados a função reprodutiva, que também é afetada nesta fase.

A mobilização de gordura no pós-parto imediato leva a um acúmulo excessivo de ácidos graxos não esterificados (AGNEs). O resultado da síntese de AGNEs pelo fígado é a liberação de corpos cetônicos: ácido acetoacético (AcAc), acetona e ácido β-hidroxibutírico (BHB). Um aumento dos níveis de corpos cetônicos no pós-parto das vacas faz parte de uma resposta normal de adaptação, porém o acúmulo excessivo de corpos cetônicos séricos é uma falha no mecanismo de compensação e resulta no desenvolvimento da cetose. Vacas gordas são mais suscetíveis à ocorrência de cetose. Quanto mais obesa, maior é a perda de condição corporal após o parto devido à menor ingestão de alimentos. Nestes animais ocorre um aporte elevado de AGNEs ao fígado, com um acúmulo excessivo de gordura nos hepatócitos (fígado gordo subclínico) e posterior mau funcionamento deste órgão.

A sintomatologia clínica da cetose inclui perda de apetite, redução progressiva de peso e da produção de leite, hálito cetônico, depressão, fezes secas e firmes e alguns casos apresentam sintomatologia nervosa. Assim como a hipocalcemia, a cetose também apresenta a forma subclínica e está associada a concentração sérica de BHB. Vacas com BHB entre 1,2 a 2,5 mmol/L apresentam a forma subclínica da doença e acima de 2,5 mmol/L, a doença clínica. A medição do BHB no pós-parto é de extrema importância, pois o tratamento correto deve ser instituído o mais rápido possível de acordo com a gravidade de cada caso.

Prevenção e tratamento

As doenças subclínicas do pós-parto apresentam sérios prejuízos econômicos ao produtor, pois muitas vezes são subdiagnosticadas, podendo ter um impacto maior do que quando ocorre a forma clínica. Muitas vezes o tratamento é postergado, prolongando os efeitos negativos sobre a saúde e produtividade do rebanho.

Obter nutrição de qualidade, condição corporal adequada ao parto e manejo correto do período seco são os principais aspectos relacionados à prevenção destas doenças. Há também a possibilidade de realizar tratamento metafilático no pós-parto, como Cálcio para a correção da hipocalcemia. Medicamentos à base de Fósforo orgânico e Vitamina B12 também auxiliam na adaptação das vacas no período de transição, pois têm como função estimular processos metabólicos como o metabolismo hepático de carboidratos e o sistema imunológico, melhorar o apetite, reduzir o estresse, entre outros. Uma adaptação bem-sucedida no período de transição resulta em uma lactação saudável e produtiva, garantindo o bem-estar das vacas e a rentabilidade econômica da fazenda.

Bryce Cunningham, um produtor de leite escocês, proprietário de uma fazenda orgânica em Ayrshire (Escócia), lançou um produto lácteo para agregar valor ao leite de sua fazenda, que é um produto de ótima qualidade, sem aditivos, e é um exemplo de economia circular.

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