De domingo a domingo é sempre puxado para o produtor Renato Bovoni, de Paraíso, na região de Catanduva. Ele vai para o campo de madrugada, às 4h30, e diz que o trabalho é intenso, sem folga para o descanso nem mesmo em feriados. Mas o que mais desanima Renato e os produtores da pecuária leiteira não é a intensidade da rotina de trabalho, mas o quanto recebem pelo litro de leite, a cada ano menor em relação aos custos envolvidos na produção.
A queda de preço, que já se reflete em oferta menor para os laticínios, é apurada em pesquisa do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea-USP). No último dado fechado, o Cepea avalia que o preço do leite captado em janeiro e pago aos produtores em fevereiro chegou a R$ 2,1397, o litro, na “Média Brasil” líquida. Uma leve alta de 0,43% em relação ao mês anterior, mas uma queda de 2,7% frente ao mesmo período de 2021.
Para os pecuaristas, diversos fatores interferem. Nos últimos dois anos, a estiagem prolongada limitou a alimentação do gado. Além disso, as despesas com insumos estão maiores, principalmente com a ração do rebanho.
“Nossa situação está cada vez mais difícil. A gente está pagando para trabalhar, com os preços dos insumos que não param de subir. Para não dizer que não teve aumento, o mês de fevereiro, aumentou dois centavos do preço bruto. Recebia R$ 2,18, foi para R$ 2,20, mas tem um desconto ainda, então praticamente não teve aumento”, afirma o produtor Renato Bovoni.
Os custos com a produção já tiveram uma alta de 2,39% este ano, segundo o Cepea. No noroeste paulista, por exemplo, o clima não favoreceu a produção leiteira e os pecuaristas precisaram investir mais em alimentação. Sem pasto disponível, aumentaram os gastos com ração, que são à base de milho e soja. Esses alimentos foram o que mais impactaram.
“No último cálculo, a ração tinha um custo de R$ 2 o quilo do produto, mas já teve novo aumento. A cada três litros de leite produzido, a vaca come um quilo de ração. Então o lucro é algo de poucos centavos, mesmo”, diz Renato, que tem uma produção diária de 350 litros de leite.
Expectativa
O pecuarista Alexandre Costa, que tem uma produção de 800 litros em Potirendaba, avalia que os efeitos da estiagem severa do ano passado ainda influenciam. “Os preços não foram reajustados desde o final de 2021. Soma-se a isso os insumos mais caros, além do alto preço do óleo diesel. Tudo isso nos prejudica.”
Investimentos
Diogo Augusto Ribeiro de Souza, investiu em bem-estar animal em sua propriedade em Cedral, construindo um local com sombra e para o descanso do rebanho, que inclui mais de 40 fêmeas leiteiras. Esta é uma técnica recomendada para manter a qualidade do leite e maior produtividade dos animais. “É difícil fechar a conta, os custos de produção consomem 57% ao todo”, afirma.
Menor volume para os laticínios
A pesquisa do Cepea apresentou dados sobre os estoques baixos de leite nas indústrias brasileiras, nos meses de fevereiro e março, além de uma maior disputa pelo leite produzido no campo. Para o gerente de captação e qualidade de leite do laticínio Saboroso, de Palestina, Ricardo Millani Alves de Toledo, a situação é complicada tanto para o produtor quanto para a indústria.
“Os custos para o produtor são altos e para nós não é diferente, com a alta de preços das embalagens e dos fermentos, por exemplo. Nós seguramos o máximo que deu e baixamos o mínimo possível o preço pago ao produtor”, afirma Ricardo. Mas, no final das contas feitas pelo gerente, o baixo consumo de leite pesou no cálculo, o que também impactou em todo o setor da produção leiteira.
O menor poder de compra da população, com a alta da inflação nos preços dos alimentos está limitando o consumo de leite. Daí o motivo alegado para retração dos preços pagos aos fornecedores. “Nós também somos produtores e enxergamos que não é fácil se manter na atividade com os preços mais baixos”, avalia Ricardo.
Ele diz ainda que os preços do leite começaram a aumentar no campo, porém ainda o consumo na ponta está muito limitado. “Não está faltando leite ainda, mas há uma tendência de faltar o produto pela baixa oferta nas indústrias”. (CC)