Os preços mundiais da carne atingiram um recorde histórico em setembro, segundo o Índice de Preços dos Alimentos da FAO, enquanto o leite e o açúcar registraram quedas expressivas. A diferença entre essas trajetórias revela os contrastes atuais do mercado global de alimentos: oferta limitada de carne, alta demanda e um alívio nos preços dos lácteos e do açúcar.
O índice da FAO, que monitora mensalmente cinco grupos de alimentos — cereais, óleos vegetais, laticínios, carne e açúcar — mostrou que o preço da carne subiu quase 10% desde janeiro de 2025, alcançando cerca de 128 pontos, o nível mais alto desde a criação do indicador há 30 anos.
A economista da FAO Monika Tothova explicou à BBC News Mundo que “os surtos de doenças animais, as tensões comerciais e as incertezas nas políticas globais” impulsionaram o aumento. Além disso, fenômenos climáticos como secas e extremos meteorológicos vêm impactando diretamente a produção de gado em várias regiões.
💹 Menos oferta, mais demanda: a equação do recorde
De acordo com a FAO, a oferta de carne para exportação caiu em diversos países produtores, enquanto a demanda mundial se manteve aquecida. Em países como Estados Unidos e Brasil, os estoques de gado bovino diminuíram significativamente.
O analista Andrés Oyhenard, da consultoria uruguaia Tardáguila Agromercados, afirmou que o estoque de gado bovino nos Estados Unidos “é o menor dos últimos 70 anos”. Esse déficit, aliado ao custo elevado dos insumos — ração, energia, transporte e mão de obra —, pressiona os preços internacionais.
No caso brasileiro, o país — maior exportador mundial de carne bovina — enfrenta o dilema entre reter animais para recompor o rebanho e aproveitar os preços altos para continuar abatendo. Segundo Oyhenard, “como os valores estão muito elevados, há incentivo para manter o ritmo de abates, o que atrasa a recuperação da oferta”.
🇧🇷 Brasil: demanda global sustenta o preço
Mesmo com a tarifa de importação de 50% imposta pelos Estados Unidos, o Brasil conseguiu sustentar o preço de sua carne bovina graças à forte demanda global, especialmente da Ásia e do Oriente Médio.
Conforme dados do World Beef Report, o preço do novilho para abate aumentou 26% no Brasil, 54% na União Europeia, 33% nos Estados Unidos e 17% no México, em comparação com o mesmo período do ano passado.
A economista Monika Tothova acrescenta que a concentração de mercado nas mãos de poucas empresas processadoras também influencia: “Essas companhias têm poder para limitar a concorrência e sustentar preços elevados.”
🧈 Enquanto isso, leite e açúcar seguem em queda
Na direção oposta, os preços dos laticínios caíram pelo terceiro mês consecutivo, segundo o mesmo relatório da FAO. A diminuição foi puxada pela baixa nas cotações da manteiga, do leite em pó integral e desnatado, e por uma leve retração nos preços do queijo.
O açúcar também apresentou forte queda, de 21% em relação a 2024, alcançando o menor nível desde março de 2021. A principal razão é a alta produção no Brasil, acima do esperado, além das boas perspectivas de safra na Índia e na Tailândia, impulsionadas pelas chuvas das monções.
Essas reduções compensaram a alta da carne e contribuíram para que o Índice de Preços dos Alimentos da FAO ficasse em 128,8 pontos em setembro, cerca de 20% abaixo do pico registrado em março de 2022, após a invasão da Ucrânia pela Rússia.
🌍 Um retrato de contrastes
O cenário atual do mercado mundial de alimentos expõe contrastes marcantes: de um lado, a carne em seu maior valor histórico; de outro, o leite e o açúcar em trajetória de queda, ajudando a aliviar os custos globais de alimentação.
Para os países produtores da América Latina, o desafio será equilibrar o ritmo de abate e os investimentos em recomposição de rebanhos, diante de um contexto econômico em que o clima, as políticas comerciais e a concentração de mercado continuam ditando o rumo dos preços.
Como resumiu a pecuarista americana Jilly Greed, “é matemática pura: trata-se de oferta e demanda”.
*Escrito para o eDairyNews, com informações de BBC News Brasil