O queijo com formiga, criado no interior de São Paulo, vem chamando atenção não apenas dos consumidores brasileiros, mas também de especialistas internacionais em laticínios.
Produzido em Caçapava, a iguaria é feita pela Estância Silvânia e leva em sua receita a formiga içá, também conhecida como tanajura, um ingrediente tradicional da cultura local.
A ideia nasceu em 2021, quando a empresária Camila Almeida buscava desenvolver um produto diferenciado para representar a cidade no Mondial du Fromage, um dos concursos mais importantes do setor, realizado na França.
Em entrevista à Globo Rural, ela explicou que queria criar algo que unisse inovação e identidade cultural. A escolha da içá, consumida em pratos típicos da região, surgiu como resposta audaciosa.
“Pensei em algo que fosse destaque por aqui. A içá é muito cultural em Caçapava, as pessoas têm o hábito de comê-la em farofa. Então, por que não no queijo?”, disse Camila.
A receita inusitada
O Queijo Taiada, como foi batizado, é produzido com leite A2 de vacas da raça gir leiteiro, criadas a pasto e ordenhadas de forma tradicional, com o bezerro ao pé. Além do leite, a receita leva coalho, sal e a formiga içá, previamente torrada antes de ser incorporada à massa.
O resultado é um queijo adocicado, macio, de massa semi-cozida e maturação de 60 dias, que combina notas de amêndoas com a crocância da formiga. O sabor da içá, segundo os produtores, remete à mistura entre amendoim, castanha e um leve toque de erva-doce.

A produção exige cuidado especial: a inclusão do inseto só pode ocorrer durante a etapa de enformagem. Esse detalhe foi um dos maiores desafios no desenvolvimento do produto.
Entre tradição e inovação
Embora possa causar estranheza a alguns, o uso de insetos na alimentação faz parte da tradição brasileira. Povos indígenas já utilizavam a içá em sua dieta e, em várias regiões, o consumo permanece vivo. O escritor Monteiro Lobato, por exemplo, chegou a comparar a iguaria ao caviar em uma de suas obras.
Especialistas lembram que o consumo de insetos é uma prática comum em diversos países da Ásia, devido ao seu alto teor proteico, que pode ultrapassar 80%. No Brasil, já existem produtores dedicados exclusivamente à criação de insetos destinados à alimentação humana.
Camila Almeida destaca que a aceitação superou expectativas. O queijo ganhou espaço em datas comemorativas, como Dia das Mães e Dia dos Pais, devido à forte ligação com a memória afetiva dos consumidores. Atualmente, uma peça de 450 gramas é vendida a cerca de R$ 90, o que equivale a mais de R$ 200 por quilo.
Reconhecimento internacional
A ousadia rapidamente trouxe reconhecimento. O Queijo Taiada conquistou medalha de bronze no Mondial du Fromage, em 2021, em Tours, França. No ano seguinte, foi convidado a integrar o Salon du Fromage em Paris, onde foi apresentado pelo mestre-queijeiro francês Dominique Bouchait em uma tábua intitulada “queijos do futuro”.
Na ocasião, o queijo brasileiro foi exibido ao lado de outras receitas inovadoras com insetos, como grilos e gafanhotos. A reação dos visitantes foi de surpresa: muitos pensaram que as formigas fossem castanhas, trufas ou até chocolate.
Mais recentemente, o produto voltou a brilhar no cenário internacional ao conquistar a categoria “Super Oro” na Copa América do Queijo, realizada no Peru.
Identidade e futuro
Para a produtora, o maior legado do Taiada é reforçar a identidade cultural de Caçapava e valorizar a tradição da içá, agora transformada em produto de destaque no setor de laticínios.
“O consumo de alimentos com insetos já é realidade. Queríamos algo que fosse símbolo da nossa cidade e que também mostrasse o potencial do Brasil para inovar no mercado de queijos”, afirma Camila.
O sucesso do queijo com formiga demonstra como inovação e tradição podem caminhar juntas.
Ao mesmo tempo em que resgata um hábito cultural, o produto se posiciona como iguaria sofisticada, capaz de competir em prêmios internacionais e de conquistar paladares exigentes no Brasil e no exterior.
*Adaptado para eDairyNews, com informações de Globo Rural