O preço do leite no Brasil manteve a tendência de queda em agosto de 2025, registrando o quinto recuo mensal consecutivo e reforçando o clima de preocupação entre produtores e indústrias.
Segundo levantamento do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), da Esalq/USP, o valor médio do leite cru captado no país ficou em R$ 2,5369 por litro, uma desvalorização de 3,2% frente a julho e de 12,6% em comparação com agosto de 2024, em termos reais.
A pressão sobre os preços resulta diretamente do desequilíbrio entre oferta e demanda. O Índice de Captação de Leite (ICAP-L) do Cepea subiu 3,3% de julho para agosto e acumula alta de 6,1% no ano, revelando um cenário de produção crescente que o consumo interno não acompanha.
Produção em expansão e custos estáveis
O avanço da produção tem origem nos investimentos realizados ao longo de 2024, quando as margens favoráveis estimularam maior intensificação da atividade leiteira. Esse movimento consolidou uma curva de crescimento que se mantém em 2025.
Apesar da queda nas receitas, os custos de produção permaneceram sob relativo controle em agosto. Segundo o Cepea, o Custo Operacional Efetivo (COE) apresentou redução de 0,38% no período, proporcionando um alívio parcial para os produtores.
Ainda assim, a perda de valor do leite cru compromete a rentabilidade e aumenta a pressão financeira no campo.
Importações: pequena participação, mas efeito de referência
Além da maior produção interna, as importações de lácteos também aparecem no radar do setor. Em agosto, o Brasil importou 165,11 milhões de litros em equivalente leite, 6,73% a menos do que no mês anterior. No acumulado de janeiro a agosto, o volume chegou a quase 1,45 bilhão de litros, patamar considerado elevado.
É importante destacar, porém, que essas importações representam menos de 4% da disponibilidade nacional e não substituem o consumo doméstico, uma vez que o Brasil não é autossuficiente para atender integralmente sua própria demanda.
A maior parte do produto importado é utilizada como matéria-prima em processos industriais, como formulações e padronizações, e não compete diretamente com o leite UHT de gôndola.
Ainda assim, mesmo com peso reduzido no volume total, os preços mais baixos do produto externo acabam servindo como referência nas negociações internas, reduzindo o poder de barganha do produtor brasileiro em segmentos estratégicos como o leite em pó e determinados queijos.
Ou seja: o impacto das importações está menos na quantidade e mais no efeito sinalizador que exerce sobre o mercado.
Consumo lento agrava a pressão
O outro lado da equação está no consumo. Apesar da disponibilidade crescente, a demanda doméstica por lácteos segue desaquecida. O poder de compra das famílias ainda não reage na velocidade necessária para absorver a oferta maior de leite e derivados.
Esse descompasso se refletiu também nos preços dos processados. Em agosto, o Cepea apontou reduções nas cotações da muçarela e do leite em pó, confirmando que a pressão não se limita ao leite cru, mas percorre toda a cadeia produtiva.
Para a indústria, isso significa margens mais apertadas e maior desafio na gestão de estoques.
Perspectivas para os próximos meses
As projeções indicam que a desvalorização do leite deve persistir até o final de 2025. O aumento sazonal típico da primavera e do verão tende a ampliar ainda mais a captação, reforçando a sobreoferta em um mercado que já convive com demanda limitada.
Para os produtores, o cenário é de desafio: mesmo com custos relativamente estáveis, a queda de preços compromete a sustentabilidade financeira das fazendas. Já para a indústria, o risco está na gestão da competitividade frente ao leite importado e na dificuldade de repassar aumentos de custos ao consumidor final.
Reflexão do setor
O panorama atual deixa clara a necessidade de estratégias mais sólidas de gestão e de políticas públicas capazes de suavizar a volatilidade do setor. Com a oferta crescendo mais rápido do que a demanda, e as importações funcionando como parâmetro de preços, o preço do leite segue pressionado em todas as frentes.
A cadeia láctea brasileira, portanto, se encontra diante de um dilema: continuar produzindo em ritmo elevado, mas com rentabilidade em queda, ou buscar novas formas de equilibrar produção, consumo e competitividade.