Metano: essa é a palavra que mais preocupa quando se fala em pecuária de leite confinada e em sua pegada ambiental. O gás, 86 vezes mais poluente que o dióxido de carbono (CO₂), é apontado como um dos grandes responsáveis pelo aquecimento global.
E é exatamente nele que a startup americana Ambient Carbon decidiu focar, atraindo atenção de gigantes como Danone, Arla Foods e Mars.
Segundo estimativas globais, o planeta abriga cerca de 1,5 bilhão de bovinos, cada um emitindo entre 150 e 550 litros de metano por dia.
Reduzir essa descarga atmosférica é hoje um desafio prioritário para governos e empresas. Foi nesse cenário que nasceu o Methane Eradication Photochemical System (Meps), um sistema desenvolvido pela Ambient Carbon em parceria com a Universidade de Copenhagen, na Dinamarca, que promete diminuir as emissões de metano em currais em até 90%.
O “exaustor” que transforma gás em fertilizante
O Meps, segundo a companhia, funciona como um exaustor de grande porte instalado do lado de fora do curral. A estrutura cilíndrica de 12 metros capta o ar interno por tubulações e o conduz a uma câmara onde a luz ultravioleta decompõe o metano (CH₄) em dióxido de carbono (CO₂) e água.
Paul Carlson, vice-presidente de desenvolvimento de negócios da Ambient Carbon, destaca que o processo é não invasivo:
“A vaca não precisa ingerir nada. Ficamos do lado de fora do estábulo. Não afetamos o conforto dos animais, a produção nem o sabor do leite”.
Além de reduzir metano, o sistema também elimina amônia e odores, problemas que afetam tanto o meio ambiente quanto o bem-estar animal. Os resíduos resultantes do processo podem ser usados como fertilizante verde, agregando valor à propriedade.
Validação científica e resultados
O Meps foi testado pela Universidade de Stanford, nos Estados Unidos, que validou sua eficácia entre 2023 e 2024. De acordo com Carlson, o sistema reduziu a concentração de metano de 44 partes por milhão na entrada para 7,5 partes por milhão na saída.
Outro ponto em destaque é a modularidade: o Meps pode atender desde pequenas fazendas com 200 vacas leiteiras até estruturas de 5.000 animais. Todo o funcionamento é controlado digitalmente, até mesmo pelo celular do produtor.
Diferença em relação a aditivos
Até agora, a principal estratégia para conter emissões na pecuária foi o uso de aditivos na ração. No Brasil, maior produtor mundial de carne bovina, eles foram liberados há três anos, reduzindo em até 90% as emissões no gado de corte. Já em vacas leiteiras confinadas, o índice não ultrapassa 30%.
É nesse ponto que a Ambient Carbon aposta na vantagem competitiva de sua solução: a promessa de chegar a 90% também na pecuária leiteira, onde a pressão regulatória e do consumidor por “baixo carbono” cresce a cada dia.
O obstáculo do custo
A tecnologia, no entanto, tem um preço alto: cerca de US$ 250 mil (R$ 1,3 milhão) por unidade. O retorno do investimento, segundo a empresa, pode ocorrer entre quatro e cinco anos, caso o produtor consiga comercializar o leite com prêmio de baixo carbono.
Para superar essa barreira, a estratégia passa pelo financiamento coletivo da cadeia. Assim como já ocorreu na Dinamarca e nos EUA, Danone e Arla se comprometeram a dividir custos com produtores e até varejistas, em uma lógica de corresponsabilidade pela descarbonização.
Próxima parada: Brasil
No mercado brasileiro, a Ambient Carbon já negocia com uma grande empresa pecuarista interessada em instalar o sistema em seus celeiros com ventilação natural para gado de corte. O nome ainda não foi revelado, mas Carlson confirma o interesse:
“O Brasil é estratégico. A presença de grandes indústrias pode viabilizar a adoção em escala, compartilhando custos com fornecedores”.
A meta da Ambient Carbon é comercializar o Meps em todos os continentes até o final de 2026, ampliando a aplicação também para a suinocultura.
Uma pecuária mais limpa e competitiva
Para o setor lácteo, a equação é clara: reduzir emissões tornou-se fator de competitividade global. Indústrias como Danone e Arla sabem que a pressão regulatória e de consumo só vai aumentar e, por isso, já buscam soluções escaláveis que garantam a rastreabilidade do baixo carbono.
O Meps surge, assim, como uma aposta ousada. Se conseguir superar o desafio do custo, pode transformar não apenas a gestão ambiental das fazendas, mas também o valor do leite e da carne no mercado internacional.
*Adaptado para eDairyNews, com informações de AgFeed