A Lactalis deu um passo ousado no mercado global de lácteos ao fechar a compra da Mainland Group, unidade de consumo e serviços associada à Fonterra, por NZ$4,22 bilhões (aproximadamente US$2,5 bilhões).
Segundo relatório da consultoria Northington Partners, a multinacional francesa estaria pagando um prêmio de 15% a 25% acima do valor justo de mercado — um movimento que divide opiniões entre analistas financeiros e especialistas do setor.
A palavra-chave “Lactalis” se destaca neste acordo histórico, que reforça a presença da empresa na Oceania e marca uma nova fase para a gigante neozelandesa Fonterra, que pretende concentrar seus esforços em ingredientes e foodservice, abandonando gradualmente o segmento de consumo final.
💵 Um negócio bilionário com valor estratégico
O acordo, anunciado oficialmente após um longo processo de due diligence, coloca a Lactalis no controle total das operações da Mainland Group, que abrange negócios da Fonterra na Austrália, Oceania, Sudeste Asiático e Oriente Médio.
Para chegar a este resultado, a cooperativa neozelandesa avaliou duas alternativas: abrir o capital da nova empresa (IPO) ou vendê-la integralmente a um investidor estratégico. A segunda opção prevaleceu, culminando na oferta vencedora da Lactalis.
A Fonterra espera lucrar mais de NZ$4 bilhões líquidos, mesmo após custos de desinvestimento e liquidação, e devolver NZ$3,2 bilhões (NZ$2,00 por ação) aos seus acionistas e cooperados de forma isenta de impostos. A previsão é que os retornos de capital ocorram no primeiro semestre de 2026, após as aprovações regulatórias e o voto dos produtores, marcado para 30 de outubro.
📉 Fonterra se despede de seu “eterno subdesempenho” na Austrália
A decisão da Fonterra reflete uma estratégia clara de reorientação de portfólio.
Desde 2001, quando entrou no mercado australiano com uma parceria de queijos com a Bega, a cooperativa enfrentou desafios persistentes.
Volatilidade de preços no leite cru, altos custos operacionais e margens instáveis tornaram a operação australiana um ponto de dor — e, nas palavras de analistas locais, um “perennial underperformer”, ou seja, um ativo que nunca entregou o desempenho esperado.
Nos últimos anos, a Fonterra reduziu gradualmente sua exposição no varejo, vendendo ativos como o negócio de iogurtes e sobremesas da Nestlé Austrália (adquirido pela Parmalat, também controlada pela Lactalis, em 2015) e a fábrica Dennington (vendida em 2020).
Em FY25, o braço australiano registrou receita de NZ$5,6 bilhões, acima dos NZ$5,0 bilhões do exercício anterior, com lucro bruto de NZ$1,07 bilhão. O crescimento foi impulsionado por um ano atípico de estabilidade no preço do leite, o que elevou a valorização do spin-off.
No entanto, segundo a Northington Partners, essa performance não é sustentável a longo prazo, o que reforça a tese de que a Lactalis pagou um prêmio considerável para garantir a aquisição.
📊 Os múltiplos financeiros e o “prêmio” da Lactalis
O relatório independente da Northington Partners traz novos dados sobre a avaliação da operação.
De acordo com o documento, os múltiplos ajustados chegam a 10,2x EV/EBITDA e 13,7x EV/EBIT, enquanto os valores iniciais projetados eram 9,2x e 11,8x, respectivamente.
Isso significa que o preço final pago pela Lactalis reflete um acréscimo estimado entre 15% e 25%, considerando os lucros futuros e os custos corporativos da operação.
Ainda que os múltiplos pareçam compatíveis com as médias do mercado global, a diferença sugere que a Lactalis pagou caro por um negócio com ganhos imediatos, mas desafios futuros — especialmente diante da instabilidade do setor lácteo australiano.
🧭 Estratégia global e expansão contínua
Para a Lactalis, líder mundial em receita no setor lácteo, a aquisição é mais do que uma simples expansão regional.
A empresa vem consolidando sua presença global por meio de aquisições estratégicas, integrando marcas locais fortes e sinergias de escala.
Com a Mainland Group, a multinacional reforça sua posição na Oceania e amplia seu portfólio de produtos de valor agregado, especialmente em queijos e laticínios premium.
Já a Fonterra pretende reinvestir NZ$3 bilhões em suas áreas principais — ingredientes e foodservice — fortalecendo a transformação de leite cru em produtos de maior valor.
O desinvestimento, portanto, marca o fim de uma era de tentativas frustradas no varejo de consumo e abre espaço para uma nova fase mais focada e rentável.
*Escrito para o eDairyNews, com informações de Dairy Reporter