O setor lácteo de Mato Grosso do Sul (Brasil) vive um dos períodos mais críticos das últimas décadas.
A produção estadual de leite, que em 2010 chegava a 500 milhões de litros por ano, despencou para 270 milhões em 2024, segundo dados do Sindicato das Indústrias de Laticínios de Mato Grosso do Sul (Silems).
O número de indústrias operantes caiu de 75 para cerca de um terço desse total, e nenhuma delas utiliza hoje a plena capacidade produtiva. “Não existe indústria em Mato Grosso do Sul operando com 100% da sua planta. A produção caiu no campo, e a indústria também está limitada. O cenário é preocupante”, afirmou Abrão Giuseppe Belluzi, presidente do Silems, em entrevista ao programa Agro é Massa, da Massa FM Campo Grande.
Consumo cresce, mas o leite vem de fora
O paradoxo é que, apesar da queda na produção, o consumo de leite e derivados aumentou no estado. Entre 2021 e 2024, Mato Grosso do Sul ganhou cerca de 62 mil novos habitantes, o que ampliou a demanda em cerca de 200 mil litros mensais de lácteos.
“Existe mercado, existe consumo. Só em 2024, o estado recebeu de outras regiões cerca de 180 milhões de litros de leite UHT e 86 milhões em queijo mussarela. Ou seja, o leite está sendo industrializado fora e vendido aqui dentro”, criticou Belluzi.
Essa dependência crescente de produtos industrializados em outros estados, especialmente Paraná e São Paulo, preocupa o setor e ameaça a sobrevivência das pequenas e médias indústrias locais.
Concorrência desigual e carga tributária pesada
Belluzi aponta que a concorrência tributária é uma das causas centrais da crise. Enquanto o Paraná isenta de ICMS produtos como queijos e requeijões, as empresas sul-mato-grossenses continuam pagando o imposto integral.
“Como um laticínio daqui vai competir pagando tributo com um do Paraná que vem isento? Não há como. O mercado sul-mato-grossense está dominado por produtos de fora”, observou o dirigente.
Essa desigualdade tributária afeta a competitividade regional e, segundo o Silems, contribui diretamente para o fechamento de unidades e a perda de empregos no interior do estado.
Setor pede ação do governo estadual
Para tentar conter o colapso, o Silems protocolou um documento junto à Secretaria de Meio Ambiente, Desenvolvimento, Ciência, Tecnologia e Inovação (Semadesc) e solicitou uma reunião com o governador Eduardo Riedel (PP).
O sindicato apresentou três medidas prioritárias:
1️⃣ Revisão da carga tributária sobre produtos vindos de outros estados.
2️⃣ Retirada das indústrias de laticínios do regime de substituição tributária do ICMS.
3️⃣ Prioridade nas compras públicas estaduais para produtos industrializados em Mato Grosso do Sul, especialmente em escolas e hospitais.
“Qual o sentido de escolas e hospitais públicos comprarem leite de fora? É preciso valorizar e fortalecer quem produz e industrializa aqui dentro. Isso é bom para o produtor, para a indústria e para o próprio governo, que arrecada mais”, defendeu Belluzi.
O leite como pilar social e econômico
Além da relevância econômica, o dirigente destacou o papel do leite na manutenção das famílias rurais.
“O pequeno produtor vive do leite. É o pagamento mensal que garante o sustento e mantém as famílias no campo. A soja e o milho pagam uma ou duas vezes por ano, o leite paga todo mês”, lembrou.
Essa renda constante é vital para evitar o êxodo rural e preservar a tradição leiteira do estado, construída por gerações.
Esperança e reconstrução
Apesar das perdas e do fechamento de plantas industriais, o presidente do Silems mantém esperança em uma resposta do governo estadual.
“Tenho certeza que o governo vai olhar com sensibilidade para esses pleitos. O leite é fundamental para a economia e para a vida de milhares de famílias”, concluiu Belluzi.
O setor lácteo de Mato Grosso do Sul, símbolo de tradição e sustento, enfrenta agora o desafio de reconstruir sua competitividade frente ao avanço de produtos externos e à necessidade de políticas fiscais mais justas.
*Escrito para o eDairyNews, com informações de MS NEWS