Os queijos PDO se tornaram o novo símbolo do “luxo acessível” no mercado europeu, um movimento que ganhou força justamente diante da combinação de crises recentes: pandemia, inflação persistente e alto custo de vida.
Ainda assim, longe de derrubar o segmento premium, esses fatores remodelaram o comportamento do consumidor e impulsionaram uma busca por indulgências domésticas que cabem no bolso.
Especialistas consultados por programas institucionais da União Europeia observam que, com menos refeições fora de casa, o consumidor europeu passou a alocar parte desse gasto para pequenos prazeres culinários — e poucas categorias capturam tão bem essa ideia quanto os queijos PDO e PGI. Esses selos de origem, que protegem métodos tradicionais, áreas geográficas e práticas artesanais, fortaleceram um apelo de autenticidade que tem resistido mesmo em períodos de orçamento mais apertado.
A Itália, por exemplo, abriga o Conciato Romano, frequentemente citado como o queijo mais antigo do mundo, com raízes na época do Império Romano. A robustez histórica dos queijos europeus tem colaborado para o aumento da procura por variedades antes pouco difundidas, como Chaource PDO, Morbier PDO e Ossau-Iraty PDO.
Patrick McGuigan, jornalista e educador do setor, destacou em campanhas promovidas pela UE que supermercados que renovaram suas prateleiras com opções artesanais e melhor curadoria observaram saltos expressivos nas vendas. Ele aponta ainda uma tendência que ganhou tração rapidamente: as tábuas prontas com pequenos cortes de diferentes queijos PDO, cada um acompanhado de sua identificação de origem. A fórmula combina conveniência, descoberta de sabores e ticket médio amigável.
Essas seleções incluem conhecidos medalhistas, como Bleu d’Auvergne PDO e Saint-Nectaire PDO, mas também rótulos raros no varejo britânico, como Maroilles PDO e Tomme de Brebis. Segundo McGuigan, a boa recepção dos consumidores tem estimulado queijeiros britânicos a imitarem o modelo, criando suas próprias coleções artesanais inspiradas no “mix premium acessível”.
Sustentabilidade como motor de inovação
A estratégia da UE para alcançar a neutralidade de carbono até 2050 exige ação coordenada entre todos os elos da cadeia agrícola — e os queijos PDO têm sido palco de testes importantes. A Comissão Europeia vem reforçando que sistemas alimentares sustentáveis são vulneráveis à degradação ambiental e às mudanças climáticas, e que isso ameaça tanto a renda do produtor quanto a segurança alimentar.
Projetos apoiados pela UE, como o LIFE The Tough Get Going (TTGG), criado em 2017, analisam cadeias produtivas de queijos duros e semiduros e estudam maneiras de reduzir a Pegada Ambiental do Produto (PEF). A iniciativa reuniu universidades, institutos, startups e indústrias com foco em duas referências globais: Comté PDO, da França, e Grana Padano PDO, da Itália.
Como parte do TTGG, foram desenvolvidas ferramentas digitais para simplificar cálculos ambientais e permitir decisões baseadas em dados. O software de análise de ciclo de vida (LCI) e o sistema de suporte ambiental (EDSS) ajudam produtores de queijos PDO a mensurar impactos, comparar cenários e planejar reduções consistentes de emissões e desperdícios.
Outro movimento associado é o “Zero Waste, More Taste”, voltado à conscientização sobre a importância de reduzir perdas ao longo da cadeia — da fazenda à geladeira do consumidor. A campanha enfatiza reuso, recuperação de materiais e eliminação de descartes que prejudiquem solo, água ou ar.
Proteção da origem e preservação do território
Os selos PDO e PGI não protegem apenas tradições. Atribuições narrativas de órgãos europeus reforçam que, ao definir regras de produção enraizadas no território, esses selos também preservam paisagens, biodiversidade e raças locais.
Na França, 46 queijos PDO aderiram ao plano nacional de sustentabilidade desde 2002, incluindo práticas como obrigações de pastejo ao ar livre, manejo de biodiversidade com cercas vivas e pastagens permanentes, uso de raças locais e restrições ao uso de ingredientes externos e de OGM na alimentação animal. Em casos como o Allgäuer Bergkäse PDO, da Alemanha, a própria sobrevivência de raças bovinas de montanha depende da continuidade do método tradicional.
Dica EDN – Para o varejo brasileiro ficar de olho 👀
A ascensão dos queijos PDO como “luxo acessível” mostra que, mesmo em cenários de crise, o consumidor não abre mão de qualidade — apenas busca formatos inteligentes, porções menores e garantia de origem.
Para o varejo brasileiro, esse movimento acende um alerta estratégico: indulgência com identidade territorial vende, especialmente quando vem acompanhada de boa curadoria, experiência de marca e preço competitivo.
*Escrito para o eDairyNews, com informações de Dairy Reporter






