O fenômeno El Niño possui características diferentes nas variadas zonas produtoras brasileiras. De acordo com o agrometeorologista João Castro, da Climatempo, na região Sul do Brasil, por exemplo, o padrão climático esperado é de chuvas mais abundantes, com volumes acima da média. Por outro lado, para a região central do país (norte do MS, MT, GO, MG e SP) o padrão esperado é de irregularidade das chuvas.
Castro observa que esse cenário já foi observado nos meses de dezembro e janeiro, causando danos pontuais em áreas de soja de SP, GO, MG, MS e MT. “O efeito um pouco fora do esperado foram as estiagens muito localizadas que ocorreram no noroeste do Rio Grande do Sul e no norte do Paraná, porém causadas por outras condições, como as temperaturas do Oceano Pacífico Sul e Oceano Atlântico na costa do Brasil que acabaram se sobressaindo em relação ao fraco El Niño”, diz o agrometeorologista.
As previsões da Climatempo indicam a ocorrência de um El Niño de fraca intensidade atuando durante a segunda metade do ano. Por isso, espera-se que o padrão de chuvas irregulares nas regiões Centro-Oeste e Sudeste persistam, porém sem grandes períodos de estiagens como os verificados em dezembro e janeiro em algumas cidades dessas regiões. Já a região sul deve ter o seu regime de chuvas regularizado, passando inclusive a observar chuvas um pouco acima da média.
Para a pecuária, a produção de forrageiras pode ser afetada por algumas doenças. As principais são as causadas por fungos, mas sua origem está na utilização de sementes não certificadas. Outras doenças que também têm seu potencial de incidência aumentado por essas condições são a Ferrugem da Braquiária e o Carvão da Braquiária.
Na pecuária, um fator indireto que afeta a atividade é a queda no ganho de peso diário (GPD) em função das condições climáticas. No sistema extensivo, rebanhos que sofrem um sucessivo número de dias com chuvas tendem a consumir menos, reduzindo assim seu GPD. “Inclusive a decisão de vender um lote fora do momento ideal pode resultar em perdas, pois se o pecuarista decidir segurar o lote por mais alguns dias e ocorrer um período de invernada, pode acontecer de as condições ambientais favorecerem a perda de peso, resultando em prejuízos”, realça Castro.
Bruno Lima, veterinário da Virbac, afirma que o El Niño é uma variação da temperatura que pode influenciar nas precipitações de chuvas. “Esta alteração irá afetar a parte nutricional do rebanho, visto que pode comprometer o fornecimento de pastagens e aumentar os níveis de pragas – impactando diretamente a nutrição e a imunidade dos animais”.
O fenômeno climático pode impactar principalmente o controle de parasitas nas fazendas, uma vez que altera toda a parte pluviométrica. “A umidade na fazenda será aumentada, o que faz com que parasitas como carrapatos e moscas apareçam de uma forma mais brusca. Mesmo com o controle integrado bem realizado, tem-se um maior desafio no campo”, aponta Lima.
Lima fala que as verminoses são outro ponto que o pecuarista tem que se atentar durante a alta umidade. “É um problema subclínico, não visível aos olhos do produtor, que afeta principalmente animais mais jovens. Estes são mais sensíveis e possuem uma imunidade frágil”.
De acordo com Lima, as doenças que os parasitas (carrapatos e moscas no geral) podem transmitir são as bicheiras, vermes, larvas de moscas e as verminoses. “Uma das consequências destas doenças muito comum em gado de corte é o complexo tristeza parasitária, em que o principal vetor é o carrapato”.
Com isso, as chuvas fora de hora podem levar à queda da produtividade e causar prejuízo no bolso do pecuarista. “O animal terá o sistema imune comprometido por conta da infestação do parasita que está sugando o sangue e causando uma irritação, podendo ser até vetor de doenças. Há uma queda na produtividade, já que o animal estará debilitado”, relata o veterinário.
As principais doenças causadas pelos carrapatos são a babesiose e a anaplasmose. “São doenças que chamamos Complexo de Tristeza Parasitária. As (doenças) causadas por moscas são as infestações por moscas dos chifres, miíases (bicheiras) e as moscas do berme que são quadros clássicos de doenças durante o El Niño”, diz Lima.
Lima ressalta que surtos de diarréias em animais jovens também são doenças corriqueiras em tempos de El Niño. “Quando se aumenta a concentração de água disponível sem se saber sua procedência, os animais estarão ingerindo e aumentando o risco de diarreias. Em algumas regiões existe o aumento da leptospirose, onde a principal forma de transmissão é pela água contaminada que os animais poderão estar em contato”.
Lima também fala que o gado de leite é mais afetado do que o gado de corte durante o El Niño. “O gado de leite é mais sensível a mudanças bruscas de temperatura. Os animais são mais desafiados por terem de produzir leite diariamente, o que acaba gerando estresse metabólico e térmico. Um animal estressado é mais suscetível a doenças e menos produtivo. O fenômeno provoca muito barro por conta da chuva, o que leva a mastite – infecções nas glândulas mamárias da vaca – afetando a rentabilidade e a produtividade”.
O médico veterinário recomenda que, como prevenção, o produtor mantenha um planejamento no fornecimento de alimentos e faça um programa preventivo de parasitoses e controle de carrapatos. Além disso, é importante manter um detalhado manejo de pragas e doenças com aplicações preventivas de fungicidas e pesticidas, evitando com isso o surgimento de grandes focos.
Na questão de combate a leptospirose, o veterinário ressalta que o animal deve se manter vacinado de acordo com o calendário sanitário proposto pela equipe médica veterinária. “Cada fazenda é um desafio diferente. Nada melhor do que o produtor reconhecer o rebanho dele para preparação contra os obstáculos que podem aparecer ao longo do ano”, conclui Lima.