Quem compra o queijo pronto direto das prateleiras de um supermercado pouco sabe sobre os processos que cada produto passa.

Quem compra o queijo pronto direto das prateleiras de um supermercado pouco sabe sobre os processos que cada produto passa. Do leite da vaca, do toque do queijeiro, ao método de conservação, cada queijo tem seu próprio preparo, o que traz as características únicas no sabor.

O Sul de Minas tem hoje duas vertentes marcantes da produção do queijo. Aposta na tradição dos queijos artesanais, da venda local, com pequenos produtores, mas também fabrica em níveis de indústria, com os grandes laticínios que garantem vendas por todo o país.

Veja como é a produção industrial dos queijos finos de Cruzília (MG)

Veja como é a produção industrial dos queijos finos de Cruzília (MG)

Até junho, o G1 apresenta o especial “Minas dos Queijos”, que mostra a tradição da produção de queijo no Sul de Minas. As reportagens apresentam os detalhes da produção industrial e artesanal nas cidades da região, a influência europeia na fabricação do produto e a luta de produtores artesanais em busca de regulamentação e reconhecimento para produzir e vender para todo o país. O especial traz também dicas de harmonização e culinária envolvendo as diversas nuances do queijo.

Leite cru x Pasteurizado

A diferença entre artesanal e indústria começa já no tratamento do leite. Os produtores do queijo Minas Artesanal têm como base o leite cru, sem nenhuma interferência de outros produtos.

Queijo da Canastra — Foto: Lucas Soares/G1

Queijo da Canastra — Foto: Lucas Soares/G1

“Você fazer queijo com o leite cru é uma coisa. Ele tem que sair lá do peito da vaca, bruto, bom demais e tem que ser bem beneficiado aqui pra sair nesse padrão de queijo que nós fazemos. Então, tem uma diferença muito grande”, explica o produtor Humberto Gontijo de Oliveira, que trabalha na produção do queijo da Canastra.

Já os grandes laticínios têm como base o leite pasteurizado, que tira os microrganismos naturais presentes no produto. Segundo os produtores, o processo é para evitar uma possível contaminação em larga escala.

“A produção da nossa indústria é toda fabricada com leite pasteurizado. Hoje, nós produzimos aproximadamente 30 mil litros de leite em queijos. Ele é o diferencial das indústrias”, explica o produtor Anderson Pereira Maciel, de Cruzília (MG).

Laticínios em Cruzília (MG) chegam a usam 30 mil litros de leite por dia — Foto: Fernanda Rodrigues/G1

Laticínios em Cruzília (MG) chegam a usam 30 mil litros de leite por dia — Foto: Fernanda Rodrigues/G1

Detalhes no artesanal

Os produtores do queijo Minas Artesanal tentam regularizar o comércio do produto. “Esse processo vai ter uma mudança porque foi publicada a Lei dos Queijos Artesanais no final do ano passado, que vai permitir que todos sejam regularizados”, explica o superintendente de apoio a agroindústria da Secretaria de Estado de Agricultura Pecuária e Abastecimento de Minas Gerais, Gilson Sales.

Por enquanto, Minas Gerais tem 266 queijarias regularizadas. Elas são dividas em sete microrregiões reconhecidas – Araxá, Campo das Vertentes, Canastra, Cerrado, Serra do Salitre, Serro e Triângulo Mineiro.

 Lei deve regulamentar produção de Queijo Minas Artesanal  — Foto: Régis Melo/G1

Lei deve regulamentar produção de Queijo Minas Artesanal — Foto: Régis Melo/G1

A Serra da Canastra, que inclui o município de Delfinópolis, no Sul de Minas, tem 55 produtores regularizados. Para receber a certificação, é preciso seguir uma série de exigências de órgãos estaduais.

Com o leite cru como base, o queijo Minas Artesanal tem etapas de adição de fermento natural, coagulante e coalho. Depois, é salgado, ganha forma e é submetido a altas temperaturas. Em seguida, vai para uma das etapas mais importantes na garantia do sabor: a maturação. O tempo varia dependendo de cada região produtora, de meses a anos.

Cada um ganha um sabor e característica marcante. O Canastra Real, por exemplo, tem o sabor adocicado. “Ele lembra o gruyére, o emmental. Mas depende de cada tipo. O mesmo queijo pode ter caracterizações diferentes, só pelo tempo de maturação diferente”, explica João Carlos Leite, presidente da Associação de Produtores do Queijo da Canastra.

João Carlos Leite, presidente da Associação de Produtores do Queijo da Canastram explica características dos queijos — Foto: Lucas Soares/G1

João Carlos Leite, presidente da Associação de Produtores do Queijo da Canastram explica características dos queijos — Foto: Lucas Soares/G1

A vida na produção industrial

O empresário Paulo Sérgio Nogueira é carioca. Deixou o cargo de gerente de vendas no Rio de Janeiro quando se viu atraído pela vida simples que o pai tinha no Sul de Minas. Com a atividade ligada ao queijo ganhando força em Cruzília, começou a empacotar o leite que vinha do sítio da família.

Ao longo dos anos, apostou no queijo e saiu de uma produção de 120 litros de leite por dia para o processamento entre 30 e 35 mil litros usados nos queijos. As vendas se concentram em mercados do Vale do Paraíba, além da capital paulista e do Rio de Janeiro.

Cruzília (MG) tem laticínios que fabricam todos os tipos de queijos. — Foto: Fernanda Rodrigues/G1

Cruzília (MG) tem laticínios que fabricam todos os tipos de queijos. — Foto: Fernanda Rodrigues/G1

“Tinha o queijo mineiro, aí depois veio os outros queijos finos, que é o gouda, gruyere, emmental, o gorgonzola, o brie e outros mais que a região fabrica”, explica Paulo. A região de Cruzília, inclusive, é referência na produção dos queijos finos no Sul de Minas.

Trabalhar com queijo, na visão do empresário, é apostar no poder de transformação. “Você pegar aquele líquido branco e transformar ele em sólido e saboroso, é tudo muito gratificante”.

O toque artesanal no industrial

Mas em queijos que viajam por todo o país, que ganham o status de industrializado, é possível manter aquele sabor do feito em casa, como no artesanal? Luiz Sérgio Medeiros de Almeida, proprietário de um laticínio de Cruzília, garante que sim.

“Quando você vai fazer o queijo na sua cozinha é uma coisa. Você sabe a vaquinha que você tirou o leite, você conhece todo o processo… Então aqui, a gente tem a obrigação de fazer isso do mesmo jeito, mesmo usando maquinário”.

Etapas na indústria são acompanhadas por queijeiros em Cruzília (MG) — Foto: Fernanda Rodrigues/G1

Etapas na indústria são acompanhadas por queijeiros em Cruzília (MG) — Foto: Fernanda Rodrigues/G1

Com o crescimento da produção, o laticínio gerenciado por ele ganhou máquinas que garantem a mistura de alguns tipos de massa e a embalagem. “Quando a gente começa a crescer, passar de 20, 30 mil litros de leite por dia, fica inviável certos procedimentos. É preciso se adaptar”.

“Na época, quando começamos a modernizar, me preocupou muito isso: como eu vou botar máquinas pra fazer esse queijo que a gente vinha fazendo na mão, mexendo na mão? ”.

Laticínios misturam uso de máquinas com toque dos queijeiros em Cruzília (MG) — Foto: Fernanda Rodrigues/G1

Laticínios misturam uso de máquinas com toque dos queijeiros em Cruzília (MG) — Foto: Fernanda Rodrigues/G1

A presença de queijeiros, no entanto, é certa em todas as etapas de produção do laticínio. Desde a chegada do leite, até a mistura de ingredientes, molde, maturação e embalagem. A ideia é usar os sentidos dos produtores para garantir que o queijo tenha qualidade.

“Algumas máquinas permitem que o queijeiro pode enfiar a mão e olhar a massa, ver o toque da massa. Lá nas câmaras de maturação, eles ficam virando os queijos, esfregando, limpando. A gente continua com esse cuidado”, explica Sérgio.

Queijeiros acompanham etapa de produção do queijo em Cruzília (MG) — Foto: Fernanda Rodrigues/G1

Queijeiros acompanham etapa de produção do queijo em Cruzília (MG) — Foto: Fernanda Rodrigues/G1

Diferenças

Por conta das diferenças nos processos de produção e o uso do leite cru ou pasteurizado, há algumas discordâncias entre os produtores artesanais e as indústrias. Enquanto os artesanais defendem a força do leite bruto e um processo com poucas interferências, os grandes laticínios garantem que a pasteurização também é um processo importante.

O presidente da Associação das Indústrias de Queijos, Fábio Scarcelli, explica que há mercado para todos, mas que é preciso que haja regularização. “A nossa expectativa é que se tenha uma regulamentação efetiva, com procedimentos e normas mínimas para se garantir a segurança do produto”, defende Scarcelli”, explica.

Diferenças entre o Queijo Minas Artesanal e o das indústrias começam no leite. — Foto: Régis Melo/G1

Diferenças entre o Queijo Minas Artesanal e o das indústrias começam no leite. — Foto: Régis Melo/G1

Segundo o João Carlos Leite, presidente da Associação de Produtores do Queijo da Canastra, a diferença entre o produto artesanal e o industrial é a produção em menor escala, que traz ao queijo um maior valor agregado e nutricional.

“É uma obra de arte. Com a oferta e procura, a demanda é sempre maior, o produto é nobre, o preço sobe, há distribuição de renda… mas tem um problema, ele está acessivo à mesa do rico e não do pobre”, defende.

Queijo Minas Artesanal tem maior valor agredado, segundo produtores — Foto: Lucas Soares/G1

Queijo Minas Artesanal tem maior valor agredado, segundo produtores — Foto: Lucas Soares/G1

Terroir

As características do queijo, como sabor, cor, aparência, são definidas por uma série de fatores, mas que encontram um denominador comum: o terroir. “Terroir é essa mistura de clima topografia, solo, paixões… é uma mistura de uma monte de coisa bacana. E faz disso um produto ímpar, um produto originado dali “, explica o produtor em Cruzília, Luiz Sérgio.

O presidente da associação dos produtores da Canastra, João Carlos Leite , complementa. “É nada mais é que a junção do ecossistema natural com a genética ali existente que vai produzir o leite, que vai maturar e virar um queijo especial”.

Mas o que as cidades do Sul de Minas têm de especial? Na região de Cruzília, Minduri e São Vicente de Minas, os queijeiros garantem que o sabor dos queijos das indústrias é adocicado por causa de uma bactéria presente no capim, alimento dos animais.

Segundo produtores de Cruzília (MG), bactéria presente no capim muda sabor dos queijos — Foto: Fernanda Rodrigues/G1

Segundo produtores de Cruzília (MG), bactéria presente no capim muda sabor dos queijos — Foto: Fernanda Rodrigues/G1

“A nossa bactéria é natural aqui da nossa região. Nas outras, tem que ser adicionada artificialmente. Você preserva essa bactéria durante o processo de maturação. Com uma certa temperatura, você desenvolve as olhaduras, que trazem um gosto adocicado, que é típico do queijo. É o diferencial das outras regiões”, comenta Anderson Pereira Maciel.

A bactéria, segundo o produtor, é típica da vegatação de altitude. “Se você for fazer um parmesão, por exemplo, vai dar aquele gosto mais picante, dependendo do processo de maturação que você usar. O gouda, o gruyére, são queijos que necessitam desse tipo de bactéria pra dar o gosto”.

Bryce Cunningham, um produtor de leite escocês, proprietário de uma fazenda orgânica em Ayrshire (Escócia), lançou um produto lácteo para agregar valor ao leite de sua fazenda, que é um produto de ótima qualidade, sem aditivos, e é um exemplo de economia circular.

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