Após as geadas registradas em grande parte do Brasil nas últimas semanas, pesquisadores do Cepea (Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada), da Esalq/USP, avaliam no texto a seguir os possíveis impactos causados pelas baixas temperaturas. Confira:
CITROS: O frio intenso e as geadas em algumas áreas citrícolas no estado de São Paulo aumentam as preocupações de agentes quanto à produção de laranjas na temporada atual e ao vigor das plantas para a próxima safra – vale lembrar que já havia incertezas em função da falta de chuvas verificada neste ano. Em todos os pomares atingidos pelas geadas, há preocupações quanto ao impacto no vigor das árvores, que estão próximas do período de indução floral e já debilitadas por conta do menor regime hídrico dos últimos dois anos. É importante lembrar, porém, que ainda é cedo para dimensionar danos efetivos, principalmente no volume da próxima safra. Considerando-se a safra atual (2021/22), a qualidade das laranjas que estão nos pés deve diminuir – algumas das frutas que foram afetadas pelas geadas do fim de junho/início de julho já estão com o interior seco e cristalizado. Em relação à próxima temporada (2022/23), as árvores mais novas (em fase de brotação) devem ser as mais afetadas pelas geadas, assim como aquelas com maior incidência de greening. LIMA ÁCIDA
TAHITI – Para esta variedade, apesar de os danos ainda não estarem dimensionados, as preocupações são ainda maiores, visto que a fruta é bastante sensível a oscilações climáticas. Além disso, diferente da laranja, em que a maioria dos pomares está em estágio de maturação ou colheita, há áreas de lima ácida tahiti em diferentes estágios, inclusive com pomares em flor. Segundo colaboradores do Cepea, o frio intenso derrubou alguns frutos pequenos, brotamentos e flores.
CAFÉ: As geadas registradas nas regiões produtoras de café arábica tiveram forte impacto no Noroeste do Paraná, no Sul de Minas e em algumas localidades da Mogiana Paulista; porém, o setor ainda está avaliando a dimensão do dano nos cafezais. As preocupações são especialmente com a produção da próxima temporada (2022/23). Já é certo que o potencial produtivo será afetado, mas previsões mais exatas das perdas nas lavouras devem ser divulgadas nas próximas semanas. Esse cenário de apreensão levou os preços do arábica a subirem de forma expressiva nos últimos dias, levando o Indicador CEPEA/ESALQ do arábica tipo 6 a ultrapassar os R$ 1.000/saca de 60 kg.
MILHO: As preocupações com o clima nas regiões produtoras de milho no Brasil têm impulsionado as cotações do cereal, visto que as recentes geadas e as previsões de nova frente fria podem reduzir o potencial produtivo das lavouras. Neste contexto, vendedores brasileiros estão reticentes em negociar a preços menores, reduzindo a liquidez interna. Além disso, no Brasil, produtores voltam as atenções à colheita da segunda safra 2020/21, que segue atrasada em relação à temporada anterior em todas as regiões produtoras. Assim, agricultores priorizam as entregas dos lotes negociados antecipadamente, aguardando o avanço da colheita para contabilizar as possíveis perdas de produtividade.
TRIGO: As geadas das últimas semanas e a possibilidade de quedas bruscas na temperatura nesta semana e na primeira quinzena de agosto têm deixado agentes preocupados quanto ao impacto nas lavouras de trigo no Brasil – vale lembrar que ainda não há estimativas quanto aos danos causados pelas geadas registradas anteriormente. Mesmo que a cultura seja menos vulnerável às baixas temperaturas, especialmente nos estágios iniciais e intermediários de desenvolvimento, muitas áreas foram afetadas pelas geadas verificadas em períodos anteriores. Quanto aos preços internos, estão em alta nos mercados de balcão e no disponível. Além da preocupação quanto ao clima, as perdas no milho e a alta do dólar também elevaram as cotações.
MANDIOCA: Na maioria das regiões produtoras acompanhadas pelo Cepea, é o déficit hídrico que preocupa agricultores, especialmente os que semearam em junho. A possibilidade de geadas nesta semana pode ter efeitos sobre a oferta de manivas para o plantio da safra 2021/2022. Diante destes fundamentos, a oferta de raízes deve continuar abaixo das expectativas de agentes nos próximos períodos, enquanto a demanda pela matéria-prima deve seguir elevada, principalmente pelas firmas com contratos de entrega a cumprir. Este possível cenário pode impulsionar os preços da mandioca.
AÇÚCAR: Antes mesmo de iniciar a atual safra 2021/22, o mercado de açúcar já esperava uma queda na produtividade dos canaviais da região Centro-Sul, devido ao clima seco do ano passado. Porém, o recuo pode se intensificar, devido às baixas temperaturas das últimas semanas, que resultaram em geadas nas lavouras. Nota-se, inclusive, que o período de produção deve ser mais curto neste ano, com algumas usinas já programando o fim da moagem para outubro.
ETANOL: O clima adverso que tem prejudicado a produção de cana-de-açúcar em algumas regiões do Centro-Sul é um fator relevante no posicionamento das usinas no mercado de etanol. A extensão dos danos nos canaviais devido às recentes geadas ainda não foi completamente mensurada, mas uma redução da produção acima daquela já anunciada no início do ano-safra tem sido prevista. Algumas unidades produtoras estão fora do mercado, analisando as perdas e tomando decisões necessárias para mitigar os efeitos danosos do sinistro. Ainda em relação ao clima, a falta de chuva e o anúncio de queda brusca e intensa da temperatura nesta semana, com possibilidade de novas geadas, têm criado apreensão no mercado sucroenergético.
BOI: Como o período atual já é de confinamento (entre maio e dezembro, aproximadamente), visto que o inverno afeta a produção de pastagem, o impacto das baixas temperaturas e de possíveis geadas na produção de boi gordo é na alimentação. No confinamento, o custo com a alimentação é alto, mas, em dias de geada, o animal tradicionalmente come menos, prejudicando o ganho de peso. Assim, a oferta de animais prontos para o abate tende a diminuir.
LEITE: De modo geral, as geadas afetam a alimentação do rebanho. O fenômeno causa o crestamento (queima da parte vegetativa) das pastagens, além de diminuir consideravelmente a qualidade da alimentação volumosa, que já vinha limitada devido ao tempo seco. Vale mencionar que as geadas também provocam danos à aveia, forragem de inverno bastante utilizada no Sul do Brasil nesta época e muito importante para manter os níveis de produção do leite. Com a alimentação volumosa prejudicada, a atividade fica mais dependente do concentrado, que também vem registrando custos altos – o milho vem se valorizando devido aos danos provocados pelo clima adverso. Esse cenário deve afetar o volume de produção do leite nos próximos períodos.
AVES E SUÍNOS: A influência do clima adverso no milho (seca durante a semeadura e o desenvolvimento das lavouras e geadas recentes) tem impulsionado os valores do cereal, o que afeta diretamente os custos de produção desses setores.