No último dia 24 de março de 2025, a International Dairy Foods Association (IDFA) alertou o Escritório do Representante de Comércio dos EUA (USTR) sobre os efeitos colaterais inesperados de uma nova proposta comercial.
O plano prevê penalidades severas para operadores marítimos ligados a embarcações construídas ou encomendadas na China, como parte de uma investigação sobre o domínio chinês no setor naval global.
Segundo a proposta, cada entrada em portos dos EUA poderá ser tarifada em até US$ 1 milhão por navio. Isso pode causar efeitos cascata em custos logísticos, cadeias de abastecimento e exportações agrícolas, afetando diretamente produtos sensíveis como os lácteos.
Diante desse cenário, é fundamental que países emergentes na exportação de leite e derivados, como Brasil, Argentina e Uruguai, se antecipem às transformações logísticas globais. Este artigo propõe ações estratégicas e recomendações concretas para o setor lácteo se adaptar e crescer em um cenário internacional cada vez mais volátil.
🚢 Contexto: A proposta da USTR e seus impactos
A proposta da USTR surge a partir da Seção 301 do Trade Act dos EUA, que investiga práticas consideradas desleais por parte de países estrangeiros. No caso, cinco sindicatos norte-americanos solicitaram a análise do papel da China nos setores naval e logístico.
A resposta do USTR propõe aplicar altas taxas portuárias para empresas que operam navios chineses ou tenham encomendas ativas com estaleiros daquele país. As consequências já foram antecipadas por mais de 30 organizações setoriais, incluindo a IDFA, que alertou que:
- As exportações de lácteos dos EUA podem cair mais de 8%
- As importações de lácteos podem diminuir em quase 14%
- O aumento dos custos logísticos pode recriar choques de oferta semelhantes aos da era COVID-19
Produtos perecíveis, como leite fluido, queijos frescos e iogurtes, seriam os mais impactados devido à sua alta dependência da cadeia de frio e transporte ágil.
✅ Ações Estratégicas para a Indústria Láctea Exportadora Emergente
Diante desse cenário, aqui estão as ações recomendadas para que a indústria láctea emergente da América Latina ganhe competitividade e resiliência:
1. Monitoramento logístico ativo
- Mapear rotas alternativas a portos norte-americanos e reduzir a dependência de navios ligados à China.
- Estabelecer parcerias com operadores logísticos especializados em perecíveis.
- Utilizar sistemas de rastreamento de carga e previsão de risco logístico.
2. Investimento em cadeia de frio
- Ampliar a infraestrutura de frio na origem (plataformas de consolidação, câmaras frias).
- Buscar acordos de cooperação para armazenagem refrigerada no destino, reduzindo perdas e garantindo qualidade.
3. Diversificação de mercados
- Priorizar países com crescente consumo de lácteos e com acordos comerciais vantajosos (Ex: Indonésia, Vietnã, Egito, Emirados).
- Utilizar ferramentas de inteligência de mercado para adaptar oferta a preferências culturais e regulatórias.
4. Fortalecimento institucional
- Criar ou reforçar câmaras de exportação de lácteos voltadas a pequenos e médios produtores.
- Participar ativamente de fóruns regionais de comércio, consultas públicas e rodadas de negócios internacionais.
5. Gestão de riscos e finanças
- Realizar simulações de impacto de aumento no frete de 20% a 40%, como projetado em cenários logísticos de crise.
- Explorar contratos de transporte de longo prazo com cláusulas flexíveis.
- Avaliar o uso de seguros logísticos e cambiais.
6. Adaptação da oferta
- Priorizar produtos de maior valor agregado e maior vida útil, como queijos maturados, leite em pó, whey e ingredientes funcionais.
- Investir em inovação de embalagens (multicamadas, recicláveis, com proteção térmica).
7. Valorização da origem e branding
- Posicionar o lácteo como produto premium de origem confiável, com ênfase em sustentabilidade, bem-estar animal e rastreabilidade.
- Criar marcas coletivas ou selos país para ganhar visibilidade internacional.
8. Acesso a estudos e alianças técnicas
- Firmar parcerias com instituições como FAO, BID Lab, IICA ou universidades para obter:
- Apoio técnico para processos de exportação
- Estudos de impacto logístico
- Certificações sanitárias e ambientais
🧩 Conclusão
O cenário global de comércio está passando por uma reconfiguração importante. O aumento de tarifas portuárias e o tensionamento das cadeias logísticas podem representar um desafio para os grandes exportadores – mas também uma janela de oportunidade para os emergentes.
Para a América Latina, especialmente o Cone Sul, a chave está em agir com visão estratégica, investir em resiliência e inovação, e construir alianças sólidas com operadores logísticos e mercados-alvo.
A indústria láctea tem tudo para se tornar protagonista na nova geopolítica dos alimentos – desde que esteja pronta para o jogo global.