Em entrevista exclusiva ao Neofeed, o economista alemão Peer Ederer, fundador e diretor da Goal Sciences, mostra por que não dá para apontar o gado como vilão do aumento da temperatura da Terra
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Certamente, você já ouviu que, para conter o aquecimento global, é preciso abolir a carne bovina, o leite e seus derivados do cardápio. Isso porque os ruminantes arrotam metano, um dos mais potentes gases do efeito estufa. Mas será que o gado é assim tão nocivo ao clima quanto pregam?

Um número crescente de cientistas diz que não. Uma das vozes mais ativas do movimento pela redenção das vacas é o economista alemão Peer Ederer, fundador e diretor da Goal Sciences, uma organização de pesquisa das ciências pecuárias, focadas em soluções para o desenvolvimento do sistema agroalimentar.

Para ele, não há, até agora, evidências científicas convincentes de que os rebanhos bovinos são inimigos da saúde do planeta. A pecuária, quando praticada segundo os preceitos da sustentabilidade, pode ajudar a combater a emergência climática.

E mais. “Os alimentos de origem animal são as fontes mais acessíveis de proteínas e nutrientes de alto valor”, diz Ederer, em entrevista ao NeoFeed. Ou seja, carne, leite e derivados são imprescindíveis para garantir a segurança alimentar global.

Veja a seguir, os principais trechos da conversa.

Você costuma classificar como simplista o argumento de que, para combater o aquecimento global, é preciso tirar os alimentos de origem animal, especialmente a carne bovina, de nossas dietas. Por quê?

O sistema alimentar global é o mais antigo e o mais complexo sistema desenvolvido pela civilização humana. Os animais e a carne que eles fornecem estão na base de nossa civilização. Tirá-los de cena é como tirar o coração do corpo e dizer que o sangue pode ser bombeado por uma máquina. Não funciona e subestima muito a complexidade de tal sistema.

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Peer Ederer

Mas, os defensores do vegetarianismo garantem ser possível encontrar que é possível encontrar nos alimentos à base de plantas todas as proteínas fornecidas por produtos de origem animal.

Para muitos nutricionistas, isso é apenas meia verdade. A questão não se resume a saber se os nutrientes estão disponíveis per se nos alimentos vegetais, mas também se são acessíveis. Tornar-se vegetariano ou vegano pode ser uma opção para adultos saudáveis, nos países ricos. Para a maioria da população global, essas dietas são inacessíveis. Além disso, uma alimentação baseada em plantas está associada a deficiências nutricionais. Estudos epidemiológicos mostram que a carga de saúde e de mortalidade entre os vegetarianos típicos são comparáveis à de um tabagista leve, que fuma cinco cigarros por dia.

Como a pecuária pode contribuir para a segurança alimentar global?

São tantos e tão diferentes que não poderia elencá-los em apenas uma resposta. Mas vou citar quatro. O maior problema da segurança alimentar é ter um suprimento suficiente de nutrientes e os alimentos de origem animal são as fontes mais acessíveis de proteínas e nutrientes. Segundo, os animais podem ser abatidos em qualquer época do ano, quando necessário. A maioria das plantas só pode ser colhida uma vez por ano. Outra importância: os animais podem ser facilmente movidos para outros lugares, quando o clima ou as condições sociais mudam. Isso é impossível com as plantas. Por fim, em muitas comunidades, os animais também representam capital financeiro, usado como garantia ou seguro para suavizar a volatilidade da renda.

Os estudos indicam que até a Revolução Industrial, a concentração de metano na atmosfera permaneceu estável. A partir do século 19, no entanto, o acúmulo do gás triplicou. O rebanho mundial de gado cresceu na mesma proporção?

O número total de ruminantes selvagens e manejados pelo homem também cresceu, mas não nessa proporção. A modelagem do bioma sugere que a quantidade de animais tem se mantido mais ou menos estável ao longo de milhares de anos. Ou seja, o volume de emissões de metano pelos ruminantes tem sido praticamente a mesma até hoje.

Por que então as vacas são apontadas como uma das grandes vilãs do aquecimento global

As vacas parecem ser culpadas por muitas coisas, não apenas pelas mudanças climáticas por meio das emissões de metano. Aparecem como responsáveis pela escassez de água, desmatamento, redução da biodiversidade e muito mais. Eu não entendo por que as pessoas ficam tão empolgadas em culpar as vacas pelo aquecimento global. Para mim, é um mistério. Não há evidências científicas sólidas para todas essas acusações.

Não dá, no entanto, para negar o impacto da pecuária no meio ambiente. Como torná-la mais sustentável?

O abate e processamento de animais têm impactos ambientais mínimos, sejam negativos ou positivos. Quase todo impacto está relacionando ao crescimento do animal. Portanto, qualquer solução que torne o animal mais produtivo reduzirá automaticamente as emissões de metano. Isso pode ser via genética, condições de criação e/ou de alimentação dos animais.

Como as novas tecnologias podem ajudar?

Haverá muitos progressos no rastreamento individual dos animais, o que permitirá ao agricultor conhecer mais profundamente sobre a saúde de cada animal e sobre o tratamento mais adequado para tornar o rebanho mais produtivo. Uma das tecnologias mais promissoras é a internet das coisas. Há muitos avanços nessa área.

Bryce Cunningham, um produtor de leite escocês, proprietário de uma fazenda orgânica em Ayrshire (Escócia), lançou um produto lácteo para agregar valor ao leite de sua fazenda, que é um produto de ótima qualidade, sem aditivos, e é um exemplo de economia circular.

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