A competitividade do leite brasileiro ainda está aquém do necessário para tornar o país um exportador relevante de lácteos, apesar de seu potencial.
Em 2025, o Brasil deve captar cerca de 37 bilhões de litros de leite, ocupando o terceiro lugar no ranking mundial de produção. No entanto, grande parte desse volume é consumido internamente, enquanto as exportações continuam tímidas e as importações, principalmente de Argentina e Uruguai, seguem em alta.
Produção fragmentada, custo elevado
Segundo a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), a produtividade média do rebanho nacional é de 2.280 litros por vaca ao ano, número inferior à média global de 2.660 litros. Essa baixa eficiência encarece o custo do litro, dificultando a inserção no mercado externo.
Em 2024, o país importou 6,3 milhões de litros por dia, majoritariamente do Mercosul, cujos países vizinhos possuem tarifas zeradas e produção mais eficiente.
As exportações, por sua vez, somaram apenas 179 mil litros por dia, segundo o CILeite. O preço pago ao produtor, que chegou a R$ 3,19 em 2022, caiu para R$ 2,70 em 2025, permanecendo entre os mais altos do mundo e pressionando a competitividade.
Indústria mira o mercado global
Diante desse cenário, a indústria láctea aposta em estratégias de longo prazo para mudar o quadro. A francesa Lactalis, líder na captação de leite no Brasil, é exemplo desse movimento.
Com presença consolidada, após aquisições de marcas como Batavo, Elegê e Itambé, além de 21 fábricas em oito estados, a empresa captou 2,7 bilhões de litros em 2024, faturando R$ 17 bilhões.
O objetivo agora é transformar o Brasil em um hub de exportação de lácteos, dobrando as vendas externas em cinco anos. Para Guilherme Portella, diretor de ESG da Lactalis, “é preciso reduzir custos sem sacrificar a rentabilidade do produtor, e isso só é possível com produtividade”.
Cooperativas como alavanca da mudança
O cooperativismo tem papel essencial nessa transformação. A CCPR, maior cooperativa de captação do país, fornece 90 milhões de litros por mês exclusivamente para a Lactalis e aposta na integração lavoura-pecuária, projeto que conta com apoio da Embrapa e do governo de Minas Gerais.
O objetivo é reduzir custos, recuperar terras degradadas e gerar empregos.
Outro caso de sucesso é a Aurora Coop, tradicional no setor de carnes e que, desde 2004, atua com lácteos. Recentemente, a cooperativa adquiriu a Gran Mestri, ingressando no segmento de queijos especiais. Em 2024, dos R$ 24,9 bilhões de faturamento, 12% vieram de derivados de leite.
Com captação de 450 milhões de litros ao ano, a Aurora compra 80% do leite de produtores de Santa Catarina, integrando cooperativas locais e garantindo melhor remuneração.
Segundo Selvino Giesel, gerente de captação da Aurora Coop, antes da integração, os produtores vendiam no mercado spot a preços baixos. “Com a compra garantida e assistência técnica, a qualidade melhorou e o produtor investiu mais”, afirma.
Tecnologia, escala e tempo: os pilares
Especialistas destacam que melhorar a competitividade exige um tripé: tecnologia, escala e tempo. A heterogeneidade da cadeia — que inclui desde pequenos produtores com baixa tecnificação até grandes indústrias — torna a transformação mais lenta, mas não impossível.
Geraldo Borges, presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Leite (Abraleite), reforça: “Não existem soluções mágicas. É preciso avançar com eficiência, qualidade e organização, e isso demanda tempo”.
Um futuro promissor, mas com obstáculos
O Brasil tem condições naturais e um mercado interno robusto, fatores que atraem investimentos.
Entretanto, para que o país alcance destaque no comércio internacional de lácteos, será necessário consolidar ganhos de produtividade, melhorar a integração da cadeia e ampliar a presença em novos mercados.
O caminho é longo, mas com o fortalecimento das cooperativas, a aposta da indústria e o suporte de políticas públicas adequadas, a revolução do leite brasileiro pode finalmente ganhar o mundo.
*Adaptado para eDairyNews, com informações de Valor Econômico