ESPMEXENGBRAIND
27 out 2025
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27 out 2025
💔 Famílias leiteiras do Brasil enfrentam o colapso de um sistema que insiste em tratar sintomas, não causas. O drama das famílias que produzem leite expõe falhas que vão muito além das importações.
Produtores vivem a pior crise em anos e pedem mais que culpados: soluções. Brasil.
Produtores vivem a pior crise em anos e pedem mais que culpados: soluções.

Um país que amanhece com cheiro de leite — e desalento.

O Brasil acorda, mais uma vez, com leite nas manchetes. Mas, desta vez, não é pelo crescimento do agronegócio, nem pelo orgulho das exportações. É pelo desespero silencioso que se espalha nas pequenas propriedades, onde o leite deixou de ser sustento para virar dívida.

Em 2025, o produtor familiar brasileiro vive a pior crise em duas décadas. O litro pago pelas indústrias, em média entre R$ 1,70 e R$ 2,10, não cobre o custo de produção — e a conta emocional já é impagável.

Enquanto uns culpam as importações de leite em pó vindas de Argentina e Uruguai, outros olham mais fundo e enxergam uma ferida antiga: o abandono estrutural da agricultura familiar e a concentração industrial que dita preços de cima para baixo.

Minas Gerais: o gigante pressionado

Com 26% da produção nacional, Minas Gerais continua sendo o coração leiteiro do Brasil — mas o coração anda cansado.

Os preços ao produtor, na casa dos R$ 2,00 por litro, já não cobrem o aumento dos insumos, combustíveis e energia. Em outubro, a Assembleia Legislativa mineira promoveu audiência pública em São João del-Rei para discutir o colapso da cadeia familiar.

As falas foram claras: não basta culpar o leite importado; é preciso aliviar o ICMS sobre combustíveis, fertilizantes e energia, e criar um fundo estadual de estabilização de preços.

Mas enquanto as propostas tramitam, o tempo corre: 70% da produção mineira já está concentrada em apenas 10% das propriedades.

Rio Grande do Sul: protestos e projetos contra a desigualdade

No Rio Grande do Sul, responsável por 12% do leite brasileiro, o campo ferve.

Com preços em torno de R$ 2,31 por litro e dívidas rurais que somam R$ 27 bilhões, os produtores foram às ruas. O deputado Paparico Bacchi apresentou projeto de lei para proibir a reconstituição de leite em pó importado, prática que, segundo ele, “cria concorrência desleal e destrói o leite in natura local”.

A Bancada do Leite se formou na Assembleia, pedindo uma coordenação nacional e compras públicas obrigatórias do leite familiar.

Por trás da pauta, há outro drama: os altos custos energéticos, que respondem por 20% das despesas de ordenha, e as secas recorrentes, que reduzem a produtividade em 15%.

Santa Catarina: leis de transparência e grito por apoio

Em Santa Catarina, onde 20 mil famílias produzem 9% do leite nacional, o preço médio despencou para R$ 1,80.

O deputado Neodi Saretta retomou, em outubro, a defesa da Lei 18.631, que obriga indústrias a anunciar preços com antecedência, e cobrou incentivos à eficiência energética nas propriedades.

Já o deputado Sargento Lima apresentou moção pedindo subsídios para insumos e barreiras à reconstituição importada.

Apesar das discussões, o problema é estrutural: 60% das propriedades familiares não têm assistência técnica. A indústria fica com 80% do valor agregado, e o produtor, com as migalhas.

Paraná: rapidez legislativa e resposta social

Se há um estado que reagiu rápido, foi o Paraná, que responde por 8% da produção nacional.

O projeto de lei 888/2023, aprovado em primeiro turno em outubro, proíbe o leite reconstituído de origem importada. O governador Ratinho Júnior já sinalizou apoio à sanção.

Durante uma audiência pública lotada, o governo anunciou a ampliação do programa Leite das Crianças, que garante compras públicas diretas da agricultura familiar.

Mas o problema paranaense vai além das importações: os custos de concentrados subiram 12% no ano, e as mudanças climáticas reduziram os pastos em 10%.

Ainda assim, o estado dá exemplo ao articular legislação, governo e produtores num mesmo propósito.

São Paulo: debates tímidos, urgências reais

Com 7% da produção nacional, São Paulo tem voz forte na economia, mas discreta no leite.

O PL 832/2025, em debate na Assembleia, cria um programa emergencial para a produção rural, ainda sem foco exclusivo no leite.

A pressão vem de baixo: cooperativas e sindicatos pedem incentivos semelhantes aos do Paraná, diante de preços em torno de R$ 2,10 por litro.

O estado enfrenta desafios próprios: alta urbanização, redução de áreas rurais e apenas 40% dos produtores com acesso a crédito.

O resultado é o mesmo em todo o país — desânimo, endividamento e êxodo silencioso.

As causas reais: estruturas que não mudam

É fácil culpar as importações, mas os números falam mais alto: elas caíram 4,6% no primeiro semestre de 2025 e representam só 8 a 10% do consumo nacional.

A crise vem de longe, enraizada em cinco fatores estruturais:

  1. Custos de produção insustentáveis, com energia e silagem subindo 12% ao ano.

  2. Baixa produtividade familiar, com 60% das propriedades sem assistência técnica.

  3. Concentração industrial, com cinco empresas controlando 70% do processamento.

  4. Impactos climáticos, cada vez mais severos.

  5. Políticas públicas frágeis, após o esvaziamento da Conab e falhas na regulação de preços mínimos.

Esses elementos formam um círculo vicioso que empurra o produtor para fora da atividade. E quanto mais propriedades fecham, mais dependente o Brasil fica das grandes indústrias e de importações.

Caminhos possíveis: o futuro começa na roça

Mas há luz no horizonte. A transformação do Pronaf em lei, aprovada em setembro de 2025, fortalece o crédito rural e garante juros mais baixos (2,75% a 4%) para financiar energia solar, genética e infraestrutura.

O Plano de Desenvolvimento da Competitividade do Leite Sul-Brasileiro (PDCGL) propõe reduzir custos em 20% com parcerias público-privadas e incentivar a devolução de ICMS para exportações.

A reforma da Política Nacional de ATER e o PAA Leite ampliam a compra direta da agricultura familiar, injetando liquidez onde mais falta: na base da pirâmide.

Essas iniciativas, ainda que tímidas, indicam um caminho — o da reconstrução a partir de baixo.

Entre a dor e a esperança

O produtor brasileiro não quer piedade, quer respeito. Quer políticas coerentes, crédito acessível, assistência técnica e um preço que pague o esforço de levantar antes do sol.

A crise do leite não começou com as importações e não vai terminar com barreiras comerciais. Ela se resolve com governança, investimento e dignidade.

O leite que chega à mesa dos brasileiros carrega uma história de luta, e é hora de o país reconhecer o valor de quem o produz.

Por Valéria Hamann – eDairyNews Brasil


*Com informações das Assembleias Legislativas de MG, RS, SC, PR e SP; dados complementares da Embrapa, MDA e Anuário Leite 2025.

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