Alagoas deve se tornar, nos próximos meses, mais um estado que regulamenta a produção de laticínios artesanais certificados, obtendo o Selo Arte. Esse é o tema do Projeto de Lei Ordinária (PLO) 646/2018, de autoria da deputada Jó Pereira (MDB), discutido na semana passada em sessão especial na Assembleia Legislativa.
A proposta deve beneficiar, inicialmente, as queijarias artesanais alagoanas, atingindo cerca de 25 mil produtores da bacia leiteira local, tirando da produção clandestina uma quantidade ainda inestimável de produtores de queijos, especialmente aqueles vinculados à agricultura familiar. “A ideia é que possamos garantir a segurança jurídica para os produtores, sem descuidar da segurança alimentar e dos cuidados com o ambiente, garantindo as possibilidades de um desenvolvimento sustentável para essa cadeia produtiva”, disse a deputada na apresentação da proposta.
Convidados para a sessão especial, pesquisadores da Embrapa Alimentos e Territórios trouxeram uma nota técnica com uma série de itens a serem considerados na construção de políticas públicas para a inserção segura em mercados formais. O chefe-geral da Unidade, João Flávio Veloso, participou do evento com membros de sua equipe.
O documento reforça a necessidade de fomentar uma integração da pesquisa agropecuária, ambiental e de saúde com a estrutura de produção e comercialização de alimentos artesanais. Observa que existem demandas específicas para cada produto, e que também é importante dar credibilidade aos produtos junto aos consumidores.
Os especialistas salientam também que a construção e o fortalecimento desse elo impactarão diretamente na melhoria do ambiente produtivo, na adoção de boas práticas de produção, no preparo, no processamento, na embalagem e na armazenagem de alimentos artesanais que atendam às normas ambientais, fiscais e sanitárias, além de outras exigências, incluindo as demandas e tendências do consumo.
A Embrapa também fez ponderações sobre os mercados e o processo de comercialização para esse tipo de produto, a exemplo dos queijos artesanais de Alagoas. Considera que o apoio governamental a essas iniciativas deve aproximar produtores e consumidores finais, além de fomentar iniciativas que contribuam para um melhor entendimento do consumidor sobre os produtos artesanais.
A Empresa sugere ainda apoiar a ampliação dos pontos de venda, com implantação de centros de abastecimento, distribuição em feiras e supermercados.
Segurança alimentar e saúde
Para o pesquisador João Roberto Correia, da Embrapa Alimentos e Territórios, é importante que o debate aprofunde o conceito de segurança alimentar. “Há uma certa confusão de que isso está relacionado apenas às questões da qualidade sanitária da produção dos queijos artesanais, mas não é apenas isso. Tem a ver também com direito à alimentação adequada e segura e com a facilitação de acesso ao consumo de alimentos, e até mesmo com o fomento à economia local e ao comércio justo”, afirmou.
O secretário estadual de Agricultura, Pecuária, Pesca e Aquicultura, Sílvio Azevedo, disse que a regulamentação do Selo Arte em Alagoas vai permitir que os pequenos produtores possam comercializar a produção de maneira mais regular, inclusive para outros estados.
Ele afirmou ainda que a chegada da Embrapa a Alagoas vai fortalecer a agregação de valor aos produtos alimentares da região. “Isso fará com que possamos impor à agricultura familiar alagoana um novo cenário, onde ela poderá ter maior rendimento em pequenas áreas e viabilizar sua atividade”, comentou.
Barreira pernambucana
O projeto de lei tramita na Assembleia Legislativa desde 2017 e visa regulamentar a produção e comercialização de laticínios, de forma artesanal, envolvendo todos os órgãos que participarão da implantação da nova legislação. Segundo a deputada Jó Pereira, a urgência para aprovação da lei deve-se à crise no escoamento por causa das barreiras sanitárias impostas recentemente pelo vizinho Pernambuco, que proibiu a comercialização dos queijos artesanais alagoanos em seu mercado.
Para a parlamentar, a legislação está ultrapassada (o marco regulatório inicial data de 1950) e só atende às condições de produção de grandes produtores. Ela e outros deputados criticaram o excesso de burocracia na regulamentação e relataram episódios de abuso de autoridades na fiscalização dos pequenos produtores.
Segundo levantamento do Sebrae divulgado pela deputada, empreendedores de pequeno porte que pretendam atuar nesse mercado em Alagoas enfrentam diversas exigências burocráticas, junto aos órgãos reguladores, que podem durar até 29 meses. E o custo, apenas com o processo de legalização, pode chegar a R$ 25 mil.
Para o deputado Davi Maia (DEM), outro gargalo importante para o desenvolvimento da cadeia dos queijos artesanais é que Alagoas ainda não tem controle fitossanitário definitivo sobre o índice de brucelose e tuberculose em seus rebanhos.