A genômica tornou-se o eixo central do novo Memorando de Entendimento firmado entre a Embrapa e um consórcio de cinco empresas privadas da Índia e do Brasil, acordo que marca uma ampliação inédita da cooperação científica entre os dois países e estabelece uma agenda de dez anos para transferência, validação e desenvolvimento conjunto de tecnologias voltadas à pecuária leiteira tropical.
A assinatura ocorreu nesta segunda-feira, 8 de dezembro, em iniciativa liderada pela Embrapa e concebida para integrar competências técnicas, dados genéticos e estratégias de inovação entre dois dos maiores ambientes produtivos de raças zebuínas do mundo.
Do lado indiano, participam Leads Agri Genetics Private Limited, especializada em genética animal e tecnologias de laticínios; LeadsConnect Services Private Ltd, que atua em analytics e agricultura inteligente para o clima; e BL Kamdhenu Farms Limited, voltada ao desenvolvimento de sistemas sustentáveis para raças nativas. Pelo Brasil, integram o acordo a Fazenda Floresta, com forte presença em produção de embriões e sistemas leiteiros de alto desempenho, e a DNAMARK, laboratório dedicado ao melhoramento genético e genômico.
O embaixador da Índia no Brasil, Dinesh Bhatia, destacou que esta é a primeira cooperação técnico-científica desse porte entre empresas brasileiras e indianas na área de melhoramento genético, envolvendo técnicas modernas de reprodução animal. Ele ressaltou que o Memorando se conecta diretamente ao acordo de cooperação firmado entre Embrapa e o Conselho Indiano de Pesquisa Agrícola (ICAR) meses antes, abrindo uma frente estratégica para ampliação da pesquisa agropecuária bilateral.
Para a presidente da Embrapa, Silvia Massruhá, Brasil e Índia mantêm uma parceria histórica em melhoramento genético bovino, agora reforçada pela maturidade das ferramentas tecnológicas aplicadas à pecuária tropical. Segundo ela, o avanço recente de plataformas de genômica, edição gênica, biotecnologia e bioinformática criou condições para desenvolver soluções mais precisas, com impacto direto na produtividade e na sustentabilidade dos sistemas leiteiros. Massruhá avalia que o escopo do Memorando vai além da pecuária e poderá futuramente se expandir para outras áreas científicas.
O pesquisador Marcos Vinícius GB Silva, da Embrapa Gado de Leite (MG), explicou que a parceria permitirá transferir e validar o portfólio de tecnologias genômicas brasileiras diretamente na Índia, com foco inicial em raças zebuínas. Segundo ele, a iniciativa configura uma via de mão dupla: a Embrapa leva sua expertise consolidada e, em contrapartida, terá acesso a bancos de dados genômicos e fenotípicos indianos, considerados essenciais para aprimorar modelos de predição e acelerar o ganho genético. Silva afirma que a qualidade e a escala desses dados trarão impacto direto na evolução dos rebanhos indianos.
O Memorando prevê projetos conjuntos em áreas como recursos naturais, mudanças climáticas, adaptação de sistemas produtivos, biotecnologia, microbiomas, nanotecnologia, geotecnologia, bioeconomia e automação agrícola, incluindo inteligência artificial. Cada Projeto de Cooperação Científica ou Técnica detalhará responsabilidades, recursos, metas e diretrizes de propriedade intelectual.
Entre as entregas previstas está o apoio técnico-científico para criação de um laboratório de genômica e bioinformática na Índia, replicando a metodologia utilizada pela Embrapa no desenvolvimento do Gir Leiteiro. O objetivo é acelerar a seleção de animais superiores e apoiar a meta indiana de alcançar 330 milhões de toneladas de leite por ano até 2034. A Embrapa também dará suporte à implantação de um sistema leiteiro de 10 mil vacas e ao desenvolvimento de programas para as raças Sindi e Sahiwal.
Do lado brasileiro, a cooperação abre acesso a um grande mercado para exportação de material genético, como sêmen e embriões, além de aumentar a variabilidade do Gir Leiteiro nacional e reduzir riscos ligados à endogamia. Pesquisadores lembram que a consolidação desse patrimônio genético envolve mais de um século de trabalho, desde as primeiras importações de zebu no século XIX, até programas estruturantes como o PNMGL, de 1985, que transformou o Gir Leiteiro em referência mundial.
Para lideranças da Embrapa Gado de Leite, o Memorando simboliza o fechamento de um ciclo histórico: se antes o Brasil importava genética zebuína da Índia, hoje exporta conhecimento, tecnologia e modelos de melhoramento para o país de origem dessas raças. A parceria, afirmam, reforça o papel do Brasil como superpotência em pecuária tropical e consolida a genômica como ferramenta estratégica para o futuro do leite global.
*Escrito para o eDairyNews, com informações de Compre Rural






