O Gir Leiteiro é hoje sinônimo de avanço científico e liderança na pecuária tropical.
Com mais de 60 mil animais genotipados, o Programa Nacional de Melhoramento do Gir Leiteiro (PNMGL), conduzido pela Associação Brasileira dos Criadores de Gir Leiteiro (ABCGIL) em parceria com a Embrapa Gado de Leite, transformou a produção de leite no Brasil e se tornou referência internacional.
A história começou há quatro décadas, quando uma reunião na Fazenda Tabarana, no interior de São Paulo, deu origem a um movimento inovador.
A proposta do médico e pecuarista Antônio José Lúcio de Oliveira Costa, de aplicar tecnologia ao melhoramento da raça, levou à criação da ABCGIL em 1980. Três anos depois, a entidade firmou convênio com a Embrapa Gado de Leite, criando oficialmente o PNMGL.
Colaboração e persistência no início
O início do programa foi marcado por desafios. Após visita à Embrapa em Juiz de Fora (MG), o então presidente da ABCGIL, José João Salgado Rodrigues dos Reis, propôs a realização de um teste de progênie para a raça.
Sem apoio financeiro inicial, o projeto avançou graças ao empenho dos criadores, que assumiram os custos e, em 1985, começaram a distribuir gratuitamente sêmen de touros selecionados.
O primeiro resultado veio em 1993, com a divulgação da primeira prova de touros.
O impacto foi imediato: o rebanho passou a apresentar maior produtividade e qualidade do leite, atraindo novos associados para a ABCGIL e fortalecendo a presença do Gir Leiteiro no cenário nacional.
Inovação científica e salto tecnológico
Em 1996, o pesquisador Rui Verneque assumiu a coordenação e ampliou as frentes técnicas do PNMGL. Três anos depois, foi criado o laboratório de qualidade do leite da Embrapa, que passou a realizar análises detalhadas de gordura, proteína e contagem de células somáticas.
Nesse período, Marco Antônio Machado iniciou o banco de DNA do programa, preparando o caminho para a era genômica.
O grande marco tecnológico veio em 2016, quando o Gir Leiteiro tornou-se a primeira raça zebuína leiteira do mundo a adotar a seleção genômica de forma sistemática.
Essa ferramenta incorporou dados moleculares de milhares de animais, aumentando a precisão na escolha de reprodutores e matrizes.
Expansão internacional e relevância social
O sucesso brasileiro chamou atenção de outros países. Em 2016, a ABCGIL e a Asocebu da Bolívia iniciaram a coleta de dados fenotípicos em rebanhos bolivianos.
Em 2024, teve início a avaliação genômica internacional, baseada no banco de dados brasileiro.
Até março de 2025, mais de 60 mil animais já haviam sido genotipados, reforçando o papel do Brasil como fornecedor de genética leiteira adaptada a climas tropicais.
O impacto também é social. Segundo dados da Embrapa, mais de 800 mil pequenos produtores brasileiros podem se beneficiar das tecnologias desenvolvidas.
Um exemplo é o acesso ao crédito via PRONAF, com linhas para compra de embriões de Girolando F1 — cruzamento do Gir Leiteiro com a raça Holandesa.
Democratização da tecnologia e futuro
Para ampliar a adesão, em 2020 foi lançada uma plataforma digital para selecionar fazendas colaboradoras, o que aumentou em mais de 40% o número de rebanhos participantes.
Além disso, desde 2018, o Teste de Progênie passou a considerar múltiplas lactações, elevando a precisão das avaliações.
Atualmente, o programa disponibiliza o Sumário Genômico de Touros e Fêmeas e listas com as 10% melhores vacas jovens e adultas em produção de leite e precocidade reprodutiva.
Com ciência de ponta, articulação institucional e presença constante no campo, o PNMGL consolidou-se como um dos programas mais duradouros e eficazes da agropecuária nacional.
Para Evandro Guimarães, diretor da ABCGIL, o desafio é ampliar o alcance do modelo.
“Temos uma condição inédita para expandir esse sucesso a milhares de pequenos e médios produtores, revelando o potencial democratizante do programa e consolidando o Brasil como referência em genética leiteira tropical”, afirmou.
A trajetória do Gir Leiteiro mostra que, quando ciência, vontade política e engajamento do setor produtivo caminham juntos, o Brasil é capaz de inovar e liderar — do curral à genética de excelência.
*Adaptado para eDairyNews, com informações de O Presente Rural