Quem é fã de gorgonzola pode já ter identificado o suposto “sumiço” desse tipo de queijo das prateleiras dos supermercados e de lojas especializadas. De sabor marcante e muito popular entre os amantes de laticínios, esse produto, na verdade, não desapareceu, apenas trocou de nome, sendo agora chamado no Brasil de “queijo azul”.
Embalagens apresentam o nome Queijo Azul — Foto: Lilavati Oliveira
A consumidora Karina Lopes foi surpreendida pela mudança. Grande apreciadora de queijos, ela saiu de casa em busca de um gorgonzola, mas acabou levando para degustar o queijo azul, que acreditava se tratar de outro produto.
“Eu fui para comprar gorgonzola em um estabelecimento que eu sempre compro e a pessoa me ofereceu o queijo azul. Foi vendido, inclusive, mais caro. As pessoas vão comprar às vezes a mesma mercadoria e, por ter nome diferente, vão pagar mais caro por isso. Uma boa opção seria colocar nas gôndolas, onde vende queijo, informando que houve essa mudança. Tinha que ter mais esse tipo de informação, porque seria importante até mesmo para a gente ter o poder de negociar de falar que o queijo agora é produzido aqui então vamos baratear isso aí'”, afirmou.
A alteração de nome é consequência da assinatura de um acordo entre a União Europeia e o Mercosul, que tem o objetivo de proteger o gorgonzola original. Segundo especialistas ouvidos pela CBN, só poderá ser chamado de gorgonzola o queijo produzido na região italiana de mesmo nome e com o selo específico, chamado de indicação geográfica.
A medida tem intenção de garantir a propriedade intelectual dos produtores dessa região e de preservar características e receitas tradicionais. O mesmo ocorreu com a bebida Champagne, agora chamada de espumante, quando se trata dos produtos que não vieram da região francesa original. No Brasil, queijos nacionais, como o Canastra, também já receberam o selo que garante a origem e modo de fazer do produto.
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No caso do gorgonzola, a medida ainda não está oficialmente em vigor, mas produtores brasileiros já se anteciparam e passaram a modificar as embalagens. Élvio Rocha é dono de uma loja virtual especializada em queijos artesanais. Ele conta que a alteração é vista com bons olhos pelos pequenos produtores e valoriza a diversidade de queijos que utilizam esse tipo de fungo.
“Os pequenos produtores, que são com quem nós trabalhamos, eles não querem chamar o queijo deles de gorgonzola, eles querem chamar o queijo deles de queijo azul. Assim como tem o gorgonzola, o stilton, o fourme d’Ambert. Nessa questão do gorgonzola, o que a gente faz é essa educação com o cliente final: explicar para ele que gorgonzola é um queijo azul, mas nem todo queijo azul é um gorgonzola”, afirmou.
O especialista em queijos Elmer de Almeida, que é consultor do Centro de Referência do Queijo Artesanal, também avalia a mudança como positiva. Ele explica que a alteração tem impactado, ainda, restaurantes que utilizam o gorgonzola, mesmo que esses não estejam incluídos nas normas definidas. Com isso, estabelecimentos já estão mudando o nome nos cardápios.
“Quando você tem indicação geográfica, você tem os direitos que são reconhecidos em lei, então não se pode utilizar de qualquer maneira. Isso traz um impacto muito bom, muito positivo, porque protege o nome, protege os produtores. Já tem restaurante se antecipando a isso também, eles trazem no carpádio ao invés de falar “o prato X com gorgonzola”, falam “o prato X com quiejo azul”. E a tendência é que, daqui alguns anos, suma do mercado falar “queijo gorgonzola produzido aqui no Brasil”. Em Minas Gerais, especialmente, a gente ajudou a montar as indicações geográficas dos queijos Canastra ,do Serro e do Cerrado. Então a gente está também com essa política”, avaliou.
A mudança, no entanto, pode ser apenas temporária, se o acordo entre o Mercosul e a União Europeia não avançar, como aponta o presidente da Associação Brasileira da Indústria de Queijos, Fabio Scarcelli.
“Tanto indústrias, produtores, lojas e restaurantes, todos já conhecem bem essa norma. Eles compram o queijo azul sem problema algum sabendo que é perfeitamente o gorgonzola produzido no Brasil. Agora, será que vale a pena manter isso em não se assinando o acordo? Fica a dúvida para nós, porque nós fomos produtores, porque fomos nos ajustando ao que a União Europeia queria. Agora, se a União Europeia volta atrás e não assina, então nós temos todo o direito a usar o nome que bem entendemos nos nossos queijos aqui”, declarou.
A alteração de nome é consequência da assinatura de um acordo entre a União Europeia e o Mercosul, que tem o objetivo de proteger o gorgonzola original. — Foto: Freepik
Por outro lado, caso a alteração de nome do gorgonzola seja definitivamente aprovada, empresários e produtores que não se adequarem às regras poderão responder por violação de indicação geográfica, segundo um informativo divulgado pelo Ministério da Agricultura e Pecuária. A irregularidade constitui crime tipificado na Lei de Propriedade Industrial, podendo implicar na apreensão de produtos e, até mesmo, na proibição da comercialização.