A influência do clima na produtividade animal é claramente notável, pois há uma interação significativa entre os animais e o ambiente.
A influência do clima na produtividade animal é claramente notável, pois há uma interação significativa entre os animais e o ambiente.
A influência do clima na produtividade animal é claramente notável, pois há uma interação significativa entre os animais e o ambiente.

A Terra está enfrentando uma transformação climática que, possivelmente, é impulsionada pela atividade humana, representando uma ameaça significativa à biodiversidade no século XXI (Dawson et al., 2011).

Nos últimos anos, temos testemunhado um aumento contínuo das temperaturas registradas pelos termômetros. O relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), da Organização das Nações Unidas (ONU), prevê um aumento de mais de 1,5 °C na temperatura global nas próximas décadas, estimando que isso ocorra entre 2030 e 2052, dados este que tem ganhado crescente destaque em todo o mundo (IPCC, 2018).

A influência do clima na produtividade animal é claramente notável, pois há uma interação significativa entre os animais e o ambiente. Neiva et al. (2004) destacam a importância de considerar cuidadosamente essa interação para garantir uma criação animal ou manejo de rebanho mais eficiente.

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Nesse contexto, as mudanças climáticas também têm um impacto significativo na produção de laticínios em todo o mundo. Em muitas regiões, eventos climáticos extremos, como secas, enchentes e ondas de calor, estão se tornando mais frequentes e intensos, o que também pode causar consequências significativas na alimentação para o gado leiteiro, incluindo pastagens e cultivos de forragem.

CONSEQUÊNCIAS CLIMÁTICAS PARA O BRASIL

O El Niño e La Niña

O El Niño e a La Niña são eventos climáticos extremos que podem ocasionar inundações, tempestades e ondas de calor, são influenciados pelos fenômenos El Niño e La Niña, que resultam das variações nas temperaturas da superfície do mar do Oceano Pacífico.

Essas alterações têm impacto direto na temperatura e na precipitação em todo o planeta, afetando diversos setores da economia, especialmente a agricultura, cuja produtividade é sensível às mudanças climáticas. Na região Norte e Nordeste, ocorrem secas durante o El Niño, enquanto no Sul do Brasil há estiagens durante La Niña e precipitações excessivas, incluindo enchentes, durante o El Niño (Araujo, 2012).

Portanto, se o El Niño aumentar em frequência ou intensidade no futuro, o Brasil estará sujeito a secas, enchentes e ondas de calor mais frequentes (NOAA, 2020).

No Brasil, este fenômeno pode causar períodos de secas intensas quanto chuvas acima da média normal, afetando diretamente a agricultura e a pecuária (Marengo et al., 2013).

O Brasil está entre os países mais afetados pelo El Niño, sofrendo repercussões significativas em suas diversas regiões. Uma das consequências mais marcantes é a ampliação de eventos de precipitação extrema no Sul, contrastando com períodos de estiagem intensa no Norte e Nordeste.

Na Amazônia, os efeitos do El Niño se somam ao aquecimento das águas do Atlântico Norte, ocasionado pelas mudanças climáticas, resultando na redução da umidade na Região Norte e agravando a intensidade da estiagem. (NOAA, 2020).

Segundo Silva Dias e Marengo, (2006) observaram temperaturas mais elevadas nas regiões central e sudeste do Brasil, durante a estação de inverno, e já em outras ocorrem frio e neve em excesso.

Sabe-se que essas anomalias climáticas associadas ao fenômeno El Niño podem provocar sérios prejuízos ambientais e socioeconômicos, especialmente em áreas agrícolas de regiões empobrecidas e os agricultores familiares são mais vulneráveis às mudanças climáticas, pois a diminuição de alguns quilos da produção anual pode comprometer a segurança alimentar dessas famílias e afetar a saúde animal. 

Saúde animal x mudanças climáticas 

Para manter a temperatura corporal constante, o organismo animal regula o equilíbrio entre a quantidade de energia na forma de calor produzida a partir do seu metabolismo (digestão, lactação, gestação) e a energia liberada do seu organismo para o ambiente.

A exposição a altas temperaturas induz um desequilíbrio térmico no organismo dos animais caracterizado pela incapacidade de regular e manter constante a sua temperatura corporal (Embrapa, 2009).As alterações nos padrões climáticos exercem um impacto significativo na disponibilidade e na qualidade das pastagens, fundamentais para a alimentação do gado leiteiro.

Períodos de seca prolongada podem resultar na redução da produtividade das pastagens, ao passo que as chuvas excessivas podem desencadear enchentes e erosão, prejudicando a qualidade dos pastos. No entanto, os efeitos combinados da mudança climática e do uso da terra estão resultando efeitos severos sobre diversos grupos biológicos (Northurp et al., 2019).

Além disso, o aumento das temperaturas e a ocorrência de ondas de calor prolongadas podem ocasionar estresse térmico em vacas leiteiras, diminuindo sua produção de leite e comprometendo sua saúde e bem-estar, conforme Figura 1. Figura 1. Aumento da temperatura e as consequências na saúde animal. Fonte: Dos autores, 2024

 

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O monitoramento de indicadores de imunidade, como produção de citosina, proliferação de células imunes e viabilidade celular, indica que, sob estresse térmico, o gado leiteiro apresenta menor imunidade.

A redução da resposta imune aumenta o risco de doenças como mastite (inflamação do úbere), lipidose hepática (deficiência do fígado na metabolização de gordura) e metrite (inflamação da parede uterina), (Steele, 2016).

A mastite, uma inflamação das glândulas mamárias da vaca, é uma das principais causas de perda de leite cru nas fazendas leiteiras, causada por patógenos como Escherichia coli, Streptococcus spp. e Staphylococcus spp., sendo o Staphylococcus aureus o mais comum. (Guzmán-Luna et al., 2022)

O tratamento com antibióticos torna o leite impróprio para consumo humano devido aos resíduos do fármaco. Além disso, o processo de beneficiamento resulta em produtos de baixa qualidade e rendimento. As lesões mamárias reduzem a eficiência da produção de leite, levando a perdas econômicas.

A contagem de células somáticas (CCS) e a contagem padrão em placas (CPP) são indicadores da qualidade do leite e da ocorrência de mastite. (Fonseca e Santos, 2000).

O aumento da temperatura favorece a sobrevivência de microrganismos como o S. aureus, aumentando o risco de mastite. Mudanças climáticas podem aumentar a incidência de mastite devido ao contato com superfícies contaminadas, levando a perdas na produção de leite. (Guzmán-Luna et al., 2022).

A intensa seleção genética visando o aumento da produção de leite tem sido correlacionada com uma diminuição no desempenho reprodutivo das vacas leiteiras. Diversos elementos, como nutrição, níveis hormonais, manejo e ambiente, exercem influência sobre a fertilidade desses animais, sendo os fatores ambientais os mais significativos nesse contexto. (Dash et al., 2016).

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Altas temperaturas diminuem a capacidade das vacas de expressar comportamento de cio, resultando em menor taxa de inseminação e lucratividade reduzida em fazendas (Mundim et al., 2019). Diante desse desafio, os protocolos de inseminação artificial estão sendo adotados para reduzir a dependência da detecção visual de cio e melhorar as taxas de prenhez.

Além disso, o estresse térmico prolongado afeta negativamente o desenvolvimento embrionário, a sobrevivência fetal e a qualidade do colostro produzido. (Becker et al., 2020, Roth e Wolfenson, 2016).

Assim, as mudanças climáticas podem prejudicar os índices de qualidade do leite e a produtividade desejada. Portanto, os produtores precisam estar atentos ao clima e implementar práticas de manejo adequadas para enfrentar esses desafios na produção do leite de qualidade.

Além disso, eventos climáticos extremos, como tempestades e enchentes, têm o potencial de interromper a logística e distribuição de produtos lácteos, impactando o abastecimento e a disponibilidade desses alimentos (IPCC, 2021).

Os impactos na segurança alimentar de acordo com o (IPCC, 2021) referem-se aos efeitos abrangentes sobre vidas, meios de subsistência, saúde, ecossistemas, economias, sociedades, culturas, serviços e infraestrutura, decorrentes das alterações climáticas ou eventos climáticos específicos que ocorrem dentro de determinados períodos, considerando a vulnerabilidade e exposição da sociedade ou do sistema em questão. Estes impactos estão diretamente relacionados à segurança alimentar.

Para mitigar esses impactos das mudanças climáticas na produção de laticínios, podem ser adotadas várias medidas em todo o mundo, conforme a Figura 2. Figura 2. Medidas para mitigar os impactos das mudanças climáticas em laticínios. Fonte: Dos autores, 2024

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Para enfrentar os desafios das mudanças climáticas, os produtores de leite devem adotar práticas sustentáveis e investir em infraestrutura.

Isso inclui a utilização de agricultura regenerativa e sistemas agroflorestais, o desenvolvimento de culturas forrageiras resistentes ao estresse hídrico e térmico, a melhoria na gestão da água e a diversificação de atividades.

Essas medidas visam mitigar os impactos das mudanças climáticas na indústria de laticínios. No entanto, é crucial continuar investindo em pesquisa, inovação e políticas públicas para promover a resiliência e sustentabilidade do setor.

 

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REFERÊNCIAS
Araújo, P. H. C., M. (2012). Eventos Climáticos Extremos: os efeitos dos fenômenos El Niño e La Niña sobre a produtividade agrícola das regiões Nordeste e Sul do Brasil. Universidade Federal de Viçosa.

Becker, C.A.; Collier, R.A.; Pedra A.E.  (2020). “Invited review: Physiological and behavioral effects of heat stress in dairy cows”. Journal of Dairy Science 103: 6751–70.

Dash, S., A. Chakravarty, A. Singh, A. Upadhyay, M. Singh, and S. Yousuf. (2016). “Effect of heat stress on reproductive performances of dairy cattle and buffaloes”: A review. Vet. World 9:235–244.

Dawson, T.P., Jackson, S.T., House, J.I., Prentice, I.C. & Mace, G.M. (2011) Beyond predictions: biodivertsity conservation ina changing cliamte. Science, 332,53-58.

EMBRAPA – Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, (2009) – Bioclimatologia aplicada a produção de bovinos leiteiros nos trópicos. Embrapa Meio-Norte Teresina, PI.

Fonseca, L. F. L.; Santos, M. V. (2000). Qualidade do leite e controle de mastite. São Paulo: Lemos Editorial, p.39-141.

Guzmán-Luna, Paola; Rajat, N.; Ismael M.; Miguel M.I.; Almudena, H.; Cummins, E. (2022). “Quantifying Current and Future Raw Milk Losses Due to Bovine Mastitis on European Dairy Farms under Climate Change Scenarios”. Science of The Total Environment 833: 155149.

Intergovernmental Panel on Climate Change – IPCC, (2018). Summary for Policymakers. In: Global warming of 1.5°C. An IPCC Special Report on the impacts of globalwarming of 1.5°C above pre-industrial levels and related global greenhouse gas emission pathways, in the context of strengthening the global response to the threat of climate change, sustainable development, and efforts to eradicate poverty [V. Masson-Delmotte et al.(eds.)]. IPCC, Geneva, 2018a.

Intergovernmental Panel on Climate Change – IPCC, (2021). Mudança do Clima 2021. A base científica – Sumário para Formuladores de Políticas. Contribuição do Grupo de Trabalho I ao Sexto Relatório de Avaliação do Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima. Disponível em: https://www.gov.br/mcti/pt-br/acompanhe-o-mcti/sirene/publicacoes/relatorios-do-ipcc/arquivos/pdf/IPCC_mudanca2.pdf. Acesso em 04 de março de 2024.

Marengo J.  A.; Alves L.M., Alvalá R.C.S., Cunha A.P., Brito S., Moraes O.V.L. (2013). Climatic characteristics of the 2010-2016 drought in the semiarid Northeast Brazil region. Anais da Academia Brasileira de Ciências, 90(2), 1973-1985.

Marengo, J., Silva Dias, P., 2006: Mudanças climáticas globais e seus impactos nos recursos hídricos. Capitulo 3 em Águas Doces do Brasil: Capital Ecológico, Uso e Conservação, pp.63-109. Eds. A. Rebouças, B., Braga e J. Tundisi. Editora Escrituras, SP.

Mundim A. V.;  Rezende F. M. de; Macedo G.G.;  Saut J. P. E.;  Jacomini J. O.;  Beletti M. E., (2019). Fatores que afetam a eficiência reprodutiva dos rebanhos bovinos. Ciências veterinárias – Faculdade de Medicina Veterinária – Universidade Federal de Uberlândia.
Neiva, J.N.M.; Texeira, M; Turco, S.; Oliveira, S. M. P.; Moura, A. A. (2004). Efeito do estresse climático sobre os parâmetros produtivos e fisiológicos de ovinos Santa Inês mantidos em confinamento na região Litorânea do Nordeste do Brasil. Revista Brasileira de Zootecnia, v.33, n.3, p.668-678, 2004.
NOAA – Serviço Marítimo Nacional – Administração Nacional Oceânica e Atmosférica (2020).  What is El Niño?  National Oceanic and Atmospheric Administration Disponível em: https://oceanservice.noaa.gov/facts/ninonina.html. Acesso em:04 de março de 2024.

Northrup, J.M., Rivers, J.W., Yang, Z. & Betts, M.G. (2019) Synergistic effects of climate and land-use change influence broad-scale avian population declines. Global Change Biology, 25, 1561-1575. Available from: https://doi.org/10.1111/gcb.14571

Roth, Z., e D. Wolfenson. (2016). “Comparing the Effects of Heat Stress and Mastitis on Ovarian Function in Lactating Cows: Basic and Applied Aspects”. Domestic Animal Endocrinology 56: S218–27.

Steele, M. (2016). “Does heat stress affect immune function in dairy cows?” Veterinary Evidence 1.

Autores:
Clarice Coimbra Pinto (Mestranda em Ciência e Tecnologia do Leite e Derivados – UFJF).
Tatiane Teixeira Tavares (Bolsista de pesquisa nível I do Instituto de Laticínios Cândido Tostes – EPAMIG-ILCT).
Claudety Barbosa Saraiva (Professora e pesquisadora do Instituto de Laticínios Cândido Tostes – EPAMIG-ILCT).
Junio Cesar Jacinto de Paula (Professor e pesquisador do Instituto de Laticínios Cândido Tostes – EPAMIG-ILCT).

Fonte: EPAMIG/Instituto de Laticínios Cândido Tostes e Universidade Federal de Juiz de Fora

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