Outubro foi o mês mais movimentado da história recente do mercado lácteo europeu. Segundo análise de Wouter Reijntjes, consultor e proprietário da Get Fair Dairy, foram negociadas 16.082 toneladas entre manteiga, pó e queijos — o volume mais alto já registrado pela corretora. Apesar das intensas oscilações de preços, o mercado mostrou sinais de estabilização ao final do mês, indicando que o pior das correções pode ter ficado para trás.
Com a chegada de novembro, o setor entra em um período historicamente marcado pela baixa na captação de leite e alta sazonal da demanda. Ainda assim, como lembra Reijntjes, isso nem sempre se traduz em valorização. “Novembro costuma trazer equilíbrio, não euforia”, observa o analista, ao comparar os ciclos de correção dos últimos dez anos.
🧈 Manteiga: o epicentro das oscilações
A manteiga concentrou quase dois terços do volume negociado, com 10 mil toneladas comercializadas entre 1º e 31 de outubro. Os preços variaram cerca de €500 por tonelada, começando o mês acima de €5.400 e encerrando próximos a €4.900. Para entregas do primeiro semestre de 2026, os contratos oscilaram entre €5.550 e €5.000.
O movimento repete padrões históricos: toda vez que o mercado entra em correção na segunda metade do ano, outubro marca o ponto de queda mais acentuado — 2017 foi o caso extremo. No entanto, o mês seguinte costuma mostrar desaceleração nas perdas. Essa pausa, segundo Reijntjes, ocorre quando os vendedores reconhecem o piso de preços e começam a se retirar do mercado.
Os preços da nata (cream) tendem a ditar o rumo em novembro. Com menos leite disponível e demanda firme, a nata costuma se valorizar, sustentando temporariamente as cotações. Ainda assim, o analista acredita que, nesta temporada, a alta será modesta. “Os volumes de leite seguem mais elevados do que em outros anos, o que deve conter a recuperação da manteiga”, afirma.
Em resumo: não há perspectiva de retomada imediata. O cenário mais provável é de estabilização, semelhante ao observado em 2017 — com o mercado testando novos pisos antes de reaquecer.
🧀 Queijos: mozzarella e gouda em compasso de espera
O segmento de queijos também bateu recorde, com 2 mil toneladas negociadas em outubro — lideradas por mozzarella e gouda. Mesmo em um ambiente de baixa, as variações foram moderadas: a mozzarella recuou de €3.100 para €2.840, e a gouda seguiu trajetória parecida.
Apesar da correção, a relação entre queijo e manteiga permanece estreita: quando a manteiga sobe, os queijos acompanham — e o inverso também é verdadeiro, embora em menor magnitude. “A mozzarella reage um pouco mais rápido, tanto nas altas quanto nas baixas”, explica Reijntjes.
Com a manteiga ainda sob pressão, o consultor prevê que os queijos seguirão o mesmo caminho, mas com menor intensidade. “A correção continua, porém sem espaço para quedas abruptas”, resume.
💨 Pós: o ajuste mais suave
O mercado de leite em pó manteve atividade intensa, com 4.500 toneladas negociadas ao longo do mês. Os preços se mantiveram relativamente estáveis, mas o tom geral foi de leve enfraquecimento. Produtos antigos foram vendidos por cerca de €2.100, enquanto os lotes de verão caíram até €1.935.
A correlação entre SMP (leite em pó desnatado) e os demais derivados é evidente, embora menos volátil. “O SMP reflete mais as condições globais de oferta e demanda do que movimentos locais”, analisa o consultor. Com o leite ainda abundante na Europa, o cenário aponta para continuidade da fraqueza.
Historicamente, valores baixos do SMC (creme magro concentrado) antecedem novas quedas no SMP. Assim, a perspectiva de curto prazo é de mercado lateralizado, com tendência de leve baixa — mas sem colapso.
🧩 O dilema dos processadores
À medida que as cooperativas definem os preços do leite ao produtor para 2026, cresce a tensão entre reter fornecedores e preservar margens industriais. Cortes bruscos podem afastar produtores ou reduzir o fornecimento, enquanto aumentos pressionam as finanças das indústrias.
Do outro lado, os usuários finais — como fabricantes de alimentos e confeiteiros — começam a respirar após anos de custos elevados. A queda dos preços melhora as margens, mas recuperar competitividade exige compromissos de longo prazo, algo difícil em um ambiente ainda incerto.
Para os traders, a dúvida é se vale continuar vendidos (short) após meses de correção ou começar a recomprar posições à espera de virada. No complexo lácteo europeu, o pó desnatado e os queijos parecem próximos do piso histórico. A manteiga, no entanto, ainda pode cair um pouco mais.
⚖️ Novembro de transição
O balanço de outubro mostra que o mercado europeu está “respirando” depois de meses turbulentos. A volatilidade diminuiu, mas a confiança ainda não voltou. A oferta continua superando a demanda, e os estoques permanecem elevados.
A manteiga segue como o elo mais frágil, com fundamentos ainda apontando para excesso de oferta. Já o pó e o queijo tendem à consolidação, sustentados pela paridade internacional.
“Não é um mercado otimista, mas é um mercado mais racional”, conclui Reijntjes. “O próximo movimento decisivo virá do leite — e de como a Europa equilibra produção, processamento e paciência.”
*Escrito para o eDairyNews, com informações de Get Fair Dairy






