A maior fazenda de leite do mundo tornou-se um dos projetos agroindustriais mais comentados da década ao ser oficialmente apresentada pelo governo da Argélia em parceria com a Baladna, gigante do setor lácteo do Catar.
Com investimento estimado em US$ 3,5 bilhões, o megacomplexo foi concebido para redefinir os limites da produção leiteira global, combinando escala inédita, integração industrial e objetivos estratégicos de segurança alimentar.
Segundo informações divulgadas pelas autoridades argelinas à época do anúncio, o projeto será instalado na província de Adrar, no sul do país, uma região marcada por clima desértico e grandes desafios logísticos. Ainda assim, o plano prevê a instalação de um rebanho de 272 mil vacas em lactação, distribuídas em uma área de aproximadamente 117 mil hectares, o que coloca o empreendimento em um patamar jamais visto na pecuária leiteira mundial.
De acordo com a concepção apresentada, o complexo contará com uma planta industrial totalmente integrada, capaz de processar até 200 mil toneladas de leite em pó por ano. Essa capacidade, segundo estimativas oficiais, permitiria atender cerca de 50% da demanda nacional da Argélia, reduzindo drasticamente a dependência do país das importações de lácteos.
O projeto surge como resposta direta a um problema estrutural. Historicamente, a Argélia figura entre os maiores importadores globais de leite em pó, com volumes superiores a 400 mil toneladas anuais e gastos próximos de US$ 800 milhões por ano. Autoridades do setor destacaram que o peso dessas importações sobre as contas públicas foi um dos principais motivadores para a aposta em um modelo de produção em larga escala.
Outro elemento central do anúncio foi a escolha da GEA Group AG como fornecedora de tecnologia. A empresa alemã, reconhecida internacionalmente por soluções para processamento de alimentos e laticínios, ficará responsável por toda a cadeia produtiva, da ordenha automatizada ao processamento e empacotamento do leite em pó. A expectativa, segundo fontes ligadas ao projeto, é garantir padrões elevados de eficiência, rastreabilidade e qualidade compatíveis com os principais mercados globais.
Além do impacto produtivo, o governo argelino ressaltou o potencial socioeconômico da iniciativa. A previsão é de geração de cerca de 5 mil empregos diretos e qualificados, com efeito multiplicador sobre a economia regional. Na visão oficial, o megacomplexo pode consolidar a Argélia como um polo estratégico do setor lácteo no norte da África, abrindo caminho inclusive para exportações no médio prazo.
Especialistas ouvidos durante o anúncio chamaram atenção, no entanto, para os desafios estruturais do projeto. Sustentar um rebanho desse porte exige fornecimento contínuo de grãos, forragens e insumos, além de logística robusta e planejamento rigoroso. A estratégia apresentada prevê a expansão da produção local de ração, complementada por importações, para garantir estabilidade operacional.
O cronograma divulgado indica início das obras em 2026, com entrada em operação prevista para o final de 2027. Essas etapas são consideradas críticas, sobretudo por se tratar de um empreendimento dessa magnitude em ambiente desértico, onde fatores climáticos e hídricos exigem soluções técnicas avançadas.
A dimensão do projeto fica ainda mais evidente quando comparada à realidade de grandes produtores tradicionais. No Brasil, por exemplo, a Fazenda Colorado, em Araras (SP), reconhecida como a maior produtora de leite do país, opera com cerca de 2.500 vacas em lactação, produzindo aproximadamente 105 mil litros por dia. Na prática, o complexo argelino foi projetado para operar com um rebanho mais de 100 vezes maior, evidenciando o salto de escala pretendido.
O anúncio também reforçou a estratégia de expansão da Baladna no continente africano. Paralelamente à Argélia, a empresa revelou investimentos de US$ 1,5 bilhão no Egito e estudos para implantação de projetos semelhantes na Nigéria, mirando mercados com elevada dependência de importações alimentares.
Revisitado hoje, o projeto da maior fazenda de leite do mundo permanece como um marco simbólico da industrialização extrema da pecuária leiteira, ilustrando como escala, tecnologia e geopolítica alimentar passaram a caminhar juntas no debate global sobre produção de alimentos.
*Escrito para o eDairyNews, com informações de CompreRural






