Produtos diferenciados, como linhas premium, sempre custaram mais. No entanto, os brasileiros não estão mais dispostos a pagar mais caro por alimentos saudáveis e sustentáveis.
Ao contrário, entregar saudabilidade com acessibilidade é visto como um dever das marcas para 60% dos brasileiros, segundo Carolina Lyra, sócia-diretora da FutureBrands. A executiva apresentou o o painel “Fome de quê? Como as marcas de alimentos estão se preparando para o futuro?”, na abertura das feiras Biobrazil e Naturaltech, em 12 de junho, e que vai até o dia 15, no Anhembi, na região norte de São Paulo.
Ela diferencia as marcas de luxo dessa exigência. “A entrega é muito diferente”, diz. “Agora, quando se fala em [produtos com] saúde, nutrição e zero impacto para o planeta não dá para ser premium, é um absurdo. Na verdade, oferecer isso é o básico. As marcas têm obrigação de entregar nutrição, saúde e cuidado com o planeta. Isso nunca foi premium”, destaca.
Para a executiva, as marcas precisam encontrar formas de apresentar soluções às pessoas em torno da saudabilidade, do sabor, da nutrição. “Só quem conseguir entregar esses atributos, esse valor que o consumidor está pedindo, vai conseguir verdadeiramente se conectar e construir uma relação muito mais significativa e muito mais duradoura”, avalia.
Entender o contexto para se posicionar
O primeiro passo começa por entender o contexto atual. Hoje, as mudanças entre as gerações e do estilo de vida ocorrem muito mais rapidamente. Diversidade de oferta, consciência sobre o consumo – motivada, inclusive, pelo alto custo de vida -, recursos para pesquisar e buscar informações, oportunidades em canais de compra nacionais e internacionais são alguns dos fatores que mudaram a relação do consumidor com a marca.
A fidelização ficou no passado. As empresas, agora, precisam conquistar o cliente, entender as suas demandas para oferecer soluções e oportunidades de conexão, sem ignorar a importância da saudabilidade e da sustentabilidade em um contexto de eventos climáticos extremos e escassez de recursos.
Na comparação entre as marcas de tecnologia e as de bens consumo, Carolina observa que as primeiras, como Amazon, Apple e Nvida, por exemplo, não só mantêm uma boa relação com os consumidores, como também ganham cada vez mais relevância, atuando de forma instintiva, sintonizando-se com as pessoas e com os fundamentos do modelo de negócio.
Ao contrário, as marcas de consumo têm dificuldades em manter o relacionamento com os compradores e a descontinuidade não se limita ao “consumidor infiel”. Em geral, a audiência percebe como principal característica das marcas com as quais transacionam um valor importante para as empresas: consistência. Porém, este é o segundo motivo mais irrelevante para o engajamento dos clientes. Pode-se dizer que ser consistente nos negócios não é um diferencial, mas minimamente esperado.
A sugestão da diretora da FutureBrands é mudar o foco da consistência para a integração para criar laços significativos e relevantes com o consumidor. Além disso, a organizações também podem adotar 3 medidas:
- Torne pessoal: pós-pandemia, os consumidores estão mais atentos às suas necessidades pessoais, como autocuidado e autorrealização;
- Desafie os limites da experiência: marcas funcionais não são atraentes; os consumidores anseiam por oportunidades de autoconhecimento e experiências significativas e alegres;
- Fomente conexões reais: a solidão ganhou proporções epidêmicas globalmente e, por essa razão, os consumidores buscam marcas que reflitam senso de pertencimento e de comunidade por meio das quais seja possível encontrar pessoas com as mesmas afinidades.
Preço, fidelidade e outros insights
As empresas que buscam competir em preço perderão relevância. Carolina lembra que as pesquisas têm mostrado fidelização às empresas percebidas como relevantes para o consumidor e exemplifica com o serviço de streaming do Spotfy.
O consumidor quer saber o que a empresa oferece de benefício a ele, ao planeta, à comunidade, para que se torne fiel. Caso contrário, comprará conforme a sua conveniência.
“Se as marcas de consumo não se mexerem, no sentido de trazer efetiva relevância, significado para as pessoas, não encarar que esses itens que eu falei, trazer nutrição, trazer saudabilidade, que isso é o mínimo que elas precisam entregar, elas vão cada vez mais perder espaço. E têm perdido muito”, conclui.
Aprendizado no mercado americano
Fundador do Barnanas e residente nos Estados Unidos há 23 anos, Cauê Suplicy contou como transformou a cadeia de bananas desperdiçadas no mercado americano em um negócio rentável e sustentável.
Suplicy descobriu que cerca de 80 milhões de bananas iam para o lixo, porque nos EUA a fruta é cortada ainda verde, congelada para depois chegar aos supermercados. Aquelas com leve tom amarelado eram descartadas. Assim, em 2013, lançou no mercado o primeiro chips de banana orgânica da Barnanas e, a partir daí, posicionou-se com empresa de alimentos agorecológica, sustentável e orgânica.
O portfólio da companhia, hoje, possui mais três produtos feitos a partir das bananas e 1.524 agricultores parceiros.
Como indústria, Suplicy destaca que não existe nenhuma razão para que os produtos orgânicos sejam tão caros. A única diferença dos industrializados e a logística, mais difícil para os pequenos produtores distribuírem e escalarem.