Quando pensamos em leite fermentado, é comum associá-lo à tradição, ao bem-estar e à digestão equilibrada. Mas, segundo um estudo recente publicado no Journal of Dairy Science (2023), essa bebida milenar pode esconder benefícios ainda mais profundos — especialmente no que se refere à proteção cerebral e à redução do estresse.
Conduzido por Joung, Song, Lee e Kim, o estudo analisou os efeitos de peptídeos bioativos derivados do leite de vaca fermentado com a cepa probiótica Lactobacillus gasseri 505. Esses compostos, chamados Pep14 e Pep21, destacaram-se por sua alta atividade antioxidante e anti-inflamatória, apresentando resultados promissores em modelos animais submetidos a situações de estresse crônico.
Os cientistas observaram que o pré-tratamento com os peptídeos foi capaz de regular o mecanismo de resposta ao estresse no eixo intestino-cérebro — uma via de comunicação bidirecional que conecta o sistema nervoso central e o sistema digestivo por meio de sinais neurais, hormonais e imunológicos. Essa regulação ocorreu através da inibição de processos inflamatórios e neuroendócrinos, principalmente no eixo hipotálamo-hipófise-adrenal (HPA), responsável pela liberação de hormônios como o cortisol.
Além disso, os pesquisadores notaram redução significativa no comportamento semelhante à ansiedade entre os animais tratados com Pep14 e Pep21, bem como menor expressão de genes relacionados à inflamação no cólon. Esses achados sugerem que o leite fermentado pode atuar de forma sistêmica, beneficiando tanto o intestino quanto o cérebro.
Segundo o artigo, os resultados reforçam o potencial dos peptídeos bioativos do leite fermentado como aliados na prevenção de danos cerebrais induzidos pelo estresse, abrindo novas perspectivas para o desenvolvimento de alimentos funcionais e nutracêuticos voltados à saúde mental.
O estudo, publicado na edição de dezembro de 2023 do Journal of Dairy Science (vol. 106, n. 12, p. 8287–8298), destaca-se pela solidez metodológica e pela relevância dos resultados. A pesquisa contou com análises moleculares detalhadas, incluindo a expressão de mRNA e proteínas ligadas à inflamação neural e intestinal, evidenciando o papel protetor dos peptídeos Pep14 e Pep21.
🌿 Do laboratório à mesa: um novo olhar sobre o leite
O leite fermentado, tradicional em diversas culturas, ganha agora novo valor científico e funcional. Mais do que um alimento de herança cultural, torna-se um símbolo da integração entre tradição e inovação científica.
Essa descoberta — que vem da Coreia do Sul, onde há forte tradição em pesquisas sobre fermentação e probióticos — reforça a importância de olhar o leite além da nutrição básica, enxergando-o como fonte de compostos bioativos com efeitos terapêuticos.
Embora os resultados ainda se limitem a estudos pré-clínicos, eles abrem caminhos promissores para pesquisas em humanos, especialmente em tempos em que o estresse e a ansiedade são considerados problemas de saúde pública global.
Como ressaltam os autores, compreender a relação entre intestino, cérebro e alimentação é essencial para o futuro da ciência nutricional. O leite fermentado, nesse contexto, emerge como um elo entre o saber tradicional e a medicina moderna, mostrando que um alimento simples pode conter respostas complexas — e poderosas — para o bem-estar mental.
📚 Fonte principal: Joung, J.Y.; Song, J.G.; Lee, B.; Kim, H.W. Preventive effect of peptides derived from fermented milk on chronic stress-induced brain damage and intestinal dysfunction in mice. Journal of Dairy Science, v.106, n.12, p.8287–8298, 2023.
Autora da matéria original: Andreza Ebersol dos Anjos — Revista Leite Integral.
*Escrito para o eDairyNews, com informações de Ciência do Leite
