Luiz Cláudio Lorenzo, vice-presidente da Bela Vista, dona da marca de leite Piracanjuba, afirma que endividamento das famílias pressiona consumo e custo do crédito para empresas dificulta investimentos.
Piracanjuba
Luiz Cláudio Lorenzo, vice-presidente da Bela Vista
Com ações que vão de Ivete Sangalo soletrando Piracanjuba: Pi-ra-can-ju-ba em propaganda na TV à aposta em canais digitais de vendas, a Laticínios Bela Vista, de Goiás, dona da marca de cinco sílabas, fez um investimento forte nos últimos anos para se tornar conhecida em todo o país.

Hoje, o grupo está entre os maiores nas categorias de leite longa vida, creme de leite, leite condensado e leite em pó e já traça novos planos.

Luiz Cláudio Lorenzo, vice-presidente da empresa e executivo à frente das operações, diz que a combinação de aumento de preço do leite em 2022, juros e custos altos pode se converter em oportunidade de crescimento agora.

“Como o dinheiro está muito caro e tudo muito difícil, há muita gente vendendo a empresa. Estamos atentos”, afirma. Veja a seguir os principais trechos da entrevista dele ao GLOBO.

A Bela Vista, dona da marca Piracanjuba, acaba de se tornar sociedade anônima. Quais são os próximos passos?

Viemos de um processo de expansão orgânico, ampliando capacidade de produção, com faturamento crescendo dois dígitos ano a ano. Isso requer mudanças para alçar novos voos e um crescimento até mais significativo.

Faz parte disso uma mudança na governança, que se faz necessária quando você pretende acessar mercado de capitais para um reforço de caixa, investimentos. Em algum momento pode haver, lá no futuro, uma abertura de capital se houver janela para isso. Somos a sexta marca mais consumida dos lares brasileiros, segundo a consultoria Kantar. Isso dá presença, notoriedade importante para nós.

Mas a empresa tem chance de estrear na Bolsa em um horizonte de cinco a dez anos?

É claro que isso depende muito de fatores econômicos, políticos e tudo mais. Mas a gente vê, sim, chances.

Produtos da produtora de leite Piracanjuba — Foto: Arquivo

Qual é a fatia da Piracanjuba entre as marcas da Bela Vista?

Temos em torno de 88%, 87% de participação do negócio com a Piracanjuba. Temos parceiros como a Blue Diamond, que é uma bebida de amêndoas. E temos a Nestlé, com os produtos Ninho, Molico e embalagens UHT. A gente fabrica e comercializa estes produtos. Temos a marca LeitBom, que tem parcela próxima de 4% do faturamento.

O grupo criou uma divisão de Health & Nutrition. O que estão mirando?

Sempre tivemos produtos da infância (como o achocolatado Pirakids), e na adolescência e juventude, o whey protein. E os produtos que permeiam a fase adulta, claro, como o leite, até a terceira idade. Com a divisão de Health & Nutrition procuramos produtos que tenham saudabilidade.

Queremos entrar cada vez mais forte nesse primeiro momento logo após um ano de idade. E até antes disso. Temos alimentos em estudo para a mãe durante o período de gestação, que melhorem a imunidade. Lançamos no Brasil o primeiro composto lácteo em embalagem UHT, quer dizer, a mamadeira está pronta. Não precisa levar água, o que é uma facilidade em deslocamentos.

Buscaram alguma aproximação com a comunidade médica?

Em um primeiro momento, procuramos consultoria para a elaboração técnica, especialistas que nos validassem na formulação dos produtos. E estamos em um plano bem robusto e frequente de visitação médica a nutricionistas, pediatras e pessoas que têm conexão com estes produtos. Como somos novos nessas categorias, precisamos do endosso médico. Daqui a pouco, teremos o da mãe que passou a usar, da avó, da amiga e por aí vai.

A marca Piracanjuba ficou mais conhecida nos últimos anos, com campanhas com Bruna Marquezine e Ivete Sangalo. Qual o papel do “e-commerce” nessa estratégia?

Em 2019, contratei uma pessoa para montar uma estrutura para o e-commerce. Quando veio a pandemia, isso deu um impulso grande. Criamos uma gerência de canais especiais e uma equipe full time. Nosso negócio sempre foi muito varejo, grandes volumes, commodities.

Os canais digitais dependem de muito serviço associado a algum volume, que não é tanto quanto no varejo alimentar. Mas com o e-commerce você tem acesso ao público direcionado. Deu um pouco certo porque, segundo a Kantar, somos a segunda marca mais vendida no e-commerce no Brasil em volume, não em faturamento. A gente vende muito whey protein, leite sem lactose e leite condensado.

Somos parceiros de Amazon, Magalu, Mercado Livre, Shopee e outros tantos. Na Amazon, fomos a primeira indústria de lácteos que investiu com eles em um negócio. Customizamos a atividade voltada para a Amazon, que tem características específicas. Hoje, a gente acessa uma plataforma toda digital na qual a Ambev é a grande operadora. Os canais digitais já têm parcela importante do faturamento.

De quanto?

Em torno de 10%. É bastante dadas as características de commodities, vendas no varejo, leite. É um volume muito significativo.

Essa parceria com a Ambev permite chegar na padaria da esquina, no pequeno comércio?

Conseguimos acessar mais ou menos 200 mil novos pontos de venda no Brasil em um ano e meio. É muita coisa. Eles têm uma força de distribuição muito grande.

E como funciona a parceria com a Nestlé?

Compramos três fábricas da Nestlé. Operamos as fábricas, são nossos ativos e temos acordo de produção e venda de leite UHT. A gente paga royalties pela marca, mas somos parceiros e responsáveis pela produção e distribuição no mercado nacional. São fábricas em São Paulo, Rio e Rio Grande do Sul, o que dá acesso a mercados importantíssimos.

Em 2022, dizia-se que o leite estava mais caro que a gasolina após a disparada de preços. Como fica este ano?

Foi uma das altas históricas. O leite tem essas características nos momentos em que há falta do produto. Em 2021, o produtor de leite e a indústria ficaram desestimulados porque as margens foram muito ruins, os custos de produção subiram e isso começou a prejudicar a atividade, seja no campo ou na indústria.

O produtor vai reduzindo produção, alimentação para o rebanho. No Brasil, caiu quase 10% o volume produzido da matéria-prima, e isso é muito. Começou a ter mais demanda que oferta, e os preços foram escalando. Houve um pico, mas logo na sequência foi voltando para uma normalidade de preços. Para esse ano, não esperamos grande aumento. Mas grãos como soja e milho estão sendo muito rentáveis.

Então, muitas vezes, o produtor deixa de produzir leite e vai produzir grãos. Isso tem acontecido. A escassez de mão de obra também impacta, desestimulando o produtor. A queda do volume de produção continua, por isso não deve ter desaceleração muito intensa de preço. Mas tampouco imaginamos altas significativas.

O país pode ter o terceiro ano sem cumprir a meta de inflação. Houve impacto no consumo?

A demanda não tem sido elástica. No fim do ano passado e no início deste vimos demanda bastante reprimida, fruto do endividamento das famílias. Os custos de produção cresceram bastante no mundo inteiro, e o Brasil não é diferente. Isso tem forçado muito a cadeia de preços.

Em um momento de demanda reprimida, tem tido muita dificuldade de a gente remunerar toda a cadeia a contento. Tem sido um período difícil para setor, indústrias e produtor.

Como esse cenário afetou o projeto do grupo de abrir uma fábrica de queijo no Paraná?

Essa fábrica no Paraná já era para ter começado, mas por causa da alta taxa de juros, algumas incertezas que a pandemia trouxe, fomos retardando um pouco o projeto. A construção começou agora, só que não vamos conseguir acelerar como queríamos porque os recursos estão muito caros para tomar dinheiro.

Imagino que a fábrica estará em início de operação no fim de 2024. Vamos fazer com parcela grande de capital próprio, porque as taxas de juros não estão viáveis. A gente deve empenhar muito pouco com financiamento de longo prazo.

Com ela, o grupo entra no mercado de queijo no Sudeste?

Temos queijo no Centro-Oeste, Norte, Nordeste, alguma coisinha em São Paulo, mas muito pontual. A gente não tem capacidade produtiva para abastecer esses outros mercados. A fábrica do Paraná vem para estender a linha de queijos a todo o Brasil. Vamos produzir muçarela, peça grande, queijo para fatiar, o produto do dia a dia.

Como vê então o cenário para o setor este ano?

Quando a gente enxerga tantas incertezas ou cenários difíceis, muitas vezes isso pode se traduzir em grandes oportunidades. Quem estiver um pouco mais preparado deve partir para uma consolidação, saindo na frente dos demais concorrentes. A gente vê demanda difícil, custos altos, mas podem surgir oportunidades de consolidação.

Consolidação é fazer aquisição?

Sem dúvida. Podem estar aí as oportunidades de crescimento. Como o dinheiro está muito caro e tudo muito difícil, há muita gente vendendo a empresa. Estamos atentos.

 

Leia também Bela Vista, dono da marca Piracanjuba, adota nova estrutura societária (edairynews.com)

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