A proteína whey está no centro de uma transformação silenciosa — e lucrativa — na indústria de laticínios dos Estados Unidos.
Uma década atrás, o soro do leite era considerado resíduo. Hoje, é protagonista de uma revolução alimentar, puxada por dietas ricas em proteínas, academias lotadas, a febre do Keto e o uso crescente de medicamentos como o Ozempic.
O caso da Nasonville Dairy, no Wisconsin, ilustra bem essa virada. Fundada em 1885 e comandada atualmente pelo Master Cheesemaker Ken Heiman, a queijaria produz cerca de 68 toneladas de queijo por dia.
Mas o verdadeiro lucro, admite o próprio CEO, vem do soro — ou melhor, da proteína whey, seu subproduto mais valioso. “Deveríamos agradecer aos consumidores que compram whey no Aldi”, brinca Heiman.
A valorização da proteína whey não é um exagero pontual. Estimativas apontam que o mercado global desse ingrediente varia entre US$ 5 e US$ 10 bilhões, com projeções de dobrar nos próximos dez anos.
Um quilo do whey mais proteico, que custava cerca de US$ 3 em 2020, hoje pode chegar a US$ 10, segundo a consultoria agrícola Ever.Ag.
Com esse cenário, a economia do leite nos EUA está sendo reconfigurada. Segundo o consultor Mike McCully, há momentos em que o queijo virou quase um “subproduto” da fabricação de whey.
E números confirmam: desde 2021, o whey representa, em média, 8,7% do valor recebido mensalmente pelos produtores, índice que já ultrapassou os 10%.
Na fazenda Norm-E-Lane, também em Wisconsin, Josh Meissner e seu filho Emmett produzem 200 mil libras de leite por dia, vendidas para a Nasonville Dairy, a apenas 10 km de distância.
Com 2.500 vacas e 15 bezerros nascendo por dia, eles investem em eficiência energética e digestores de metano, mas ainda são “tomadores de preço”.
O valor do leite continua sendo definido por fórmulas federais complexas, criadas nos anos 30, e pouco sensíveis à realidade atual.
O preço do leite, corrigido pela inflação, permanece no mesmo patamar de 25 anos atrás. A salvação, segundo os próprios produtores, foi o crescimento no valor do whey. “Se não fosse isso, estaríamos esmagados”, afirma Heiman.
Mas transformar leite em whey de alta proteína é um processo exigente. Na Nasonville, todo ciclo — da pasteurização à concentração líquida de proteína — leva apenas 37 minutos por caminhão-tanque. Ao final do dia, saem 45 toneladas de whey líquido concentrado.
A fábrica, apesar de eficiente, não possui secadores de spray (spray dryers), essenciais para transformar o whey em pó. Por isso, empresas como a Actus Nutrition entram em cena para completar o processo.
O pico veio em maio de 2025: 48 milhões de libras de whey em pó proteico foram produzidas. Um salto gigantesco em comparação com os 8 milhões de janeiro de 2003. A razão?
O crescimento no uso dos medicamentos GLP-1 como o Ozempic, cujos usuários precisam consumir mais proteínas para evitar perda muscular.
Mas como toda commodity, a euforia tem prazo de validade. Novas fábricas estão em construção, o excesso de oferta virá, e os lucros extraordinários tendem a desaparecer.
Por isso, Nasonville aposta em queijos especiais, como o Ghost Pepper Jack, e a Norm-E-Lane já investe em produção de carne Angus.
A proteína whey está longe de ser apenas um modismo. Ela é, hoje, o ativo mais estratégico do setor lácteo americano.
E no jogo de margens apertadas e commodities globalizadas, quem souber agregar valor ao “subproduto” pode acabar dominando o mercado.
*Adaptado para eDairyNews, com informações de The New York Times