Em depoimento emocionado, Marly Leite, que faz o premiado queijo Senzala, conta como quase perdeu seu rebanho ao usar o “hormônio da felicidade”
Ali começou a saga da família Leite para descobrir a doença de suas vacas. “Umas caíram de anemia, outras de mastite aguda, outras com pneumonia, muitas por pararem de comer. Os veterinários ficaram confusos diante de tantas mortes por sintomas diferentes, parecia uma magia negra”, conta Marly. O diagnóstico veio depois de muitos exames: Trypanosoma vivax. Um parasita bovino que não contamina o homem. “Mas os veterinários garantem que a doença não deixa traços no leite nem na carne, não havendo perigo para o homem, mas é difícil acreditar, né?”, desconfia Marly, mineiramente…
Mofo branco cresce naturalmente nas salas de cura do queijo Senzala.
A culpa disso tudo foi a prática de picar o gado com o “hormônio da felicidade”. “Com a moda da ocitocina, fomos orientados por técnicos a tirar o bezerro do pé da vaca na hora da ordenha, com a promessa de ter muito mais leite. O Brasil inteiro faz isso. A vaca não entende que o leite é para nós, humanos. Pra ela, o leite é do bezerro. Sem a cria ao pé, o leite de vacas rústicas, como as que conseguem sobreviver em áreas secas como a nossa, não desce. Então o ser humano, com sua boa inteligência, inventou esse hormônio sintético da alegria, para o qual não existe nenhum controle de vendas – são comercializados sem receita nem limite. Produtores não tem noção de muita coisa, os sangues se misturam [pelo compartilhamento da seringa], uma vaca doente contamina a outra. Já vi isso em muitas regiões de Minas Gerais e em São Paulo. É um problema que o governo deveria tomar atitude. Os animais não merecem, precisa haver uma outra forma…”, implora Marly.
Na Fazenda Caxambu o momento da ordenha é tão esperado que até o touro entra na fila. FOTO: Débora Pereira/SerTãoBras
“Lá em casa, nós perdemos 80% do nosso gado. Oitenta e oito vacas mortas, sem contar bezerros e vacas vendidas para carne de charque. Nossa dívida na loja de remédios aumentou muito. Além do prejuízo financeiro, ficou um grande remorso sentimental. Contribuímos para o sofrimento desses animais. Em Minas Gerais isso é endêmico, mas mineiro não gosta de falar disso”, conta a produtora.
“Aprendemos a fazer o desmame das vacas da ocitocina. É um trabalho de carinho, atenção, até a vaca ficar feliz e descer o leite. Começamos tudo de novo com tês vacas sadias. Mas, para fazer essa massagem nas vacas, um trabalho que exige paciência, decidimos contratar um vaqueiro. Eu precisava de mais tempo para viajar e divulgar nosso queijo. A primeira coisa que esse vaqueiro me perguntou foi se a gente não conhecia a ocitocina. Depois de um tempo descobrimos que ele estava comprando o hormônio escondido e dando para as vacas. Tivemos o mesmo problema de novo, com 17 vacas. Queremos exterminar o uso desse hormônio sintético do planeta”, lamenta Marly.
O gado de Maly é “tatu com cobra”, mistura de raças rústicas zebuínas, holandesas e caracu.
“Para ordenhar tem que ter paciência. Assim como curar queijo, a alquimia só acontece se tiver paciência. Eu conheço vários amigos de Sacramento, de Tapira, que tiveram o mesmo problema que eu. Meu depoimento vem do meu coração, que dói ao ver pessoas trocando a ordenha manual pela mecânica e introduzindo a ocitocina. Meu conselho é: não façam! Façam de tudo para não usar”, aconselha a produtora.
“O Instituto Mineiro de Agropecuária não tem dados de quantas vacas doentes temos no estado. Quando descobrimos a doença, eu fui às autoridades (não vou citar nomes). Me chocou eles informarem que a doença chegou ao Brasil em 1996 e pedirem para eu não divulgar esses dados, para não prejudicar o comércio da carne brasileira. Eu procurei a promotoria e registrei o ocorrido, mas não houve resultado”, diz Marly.
Thales Almeida, diretor do IMA, confirma que o órgão não possui o número exato de vacas doentes em Minas Gerais: “tripanossomia é uma doença comum hoje, não é de notificação obrigatória, tem medicamento comercializado para controlar… 99% da contaminação é no manejo, por agulhas que aplicam a ocitocina para a vaca dar mais leite. O produtor omite essas informações com medo de ser fiscalizado, só ficamos sabendo depois que acontecem as mortes. Três anos atrás fizemos uma força tarefa contra essa doença, fizemos cartilhas, mas ela não é tratada com vacina obrigatória, como a febre aftosa ou a raiva. Infelizmente não temos esses dados”.
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