O Relatório Global do Setor Leiteiro do Rabobank do terceiro trimestre de 2025 reflete um mercado que, embora tenha se mantido estável nos últimos meses, começa a mostrar sinais de um excedente exportável no horizonte.
Os preços internacionais dos laticínios continuam em níveis elevados em comparação com a média dos últimos cinco anos, mas os fundamentos da oferta e da demanda começam a divergir, o que pode gerar pressões baixistas no curto prazo.
Na Oceania, os preços à vista mostraram-se firmes: o leite em pó desnatado (LPD) subiu 11% em dólares americanos e o leite em pó integral (LPE) 2%, enquanto a manteiga caiu 3% e o queijo cheddar 5% em relação ao segundo trimestre de 2025.
Mesmo assim, os preços atuais permanecem 29% acima da média quinquenal na manteiga e 11% acima no LPE, embora mais alinhados no LPD (-1%) e no queijo (+1%).
O Rabobank prevê que o crescimento da produção de leite nas sete principais regiões exportadoras atingirá 2% em relação ao ano anterior no segundo semestre de 2025, antes de desacelerar para 0,44% em 2026, acumulando um aumento combinado de 7,1 milhões de toneladas métricas em dois anos.
Fatores que impulsionam a produção mundial de leite
O aumento da oferta de leite responde a uma série de fatores conjunturais e estruturais:
Margens favoráveis nas explorações: os preços do leite ao produtor na Europa e na Oceania estão próximos dos máximos históricos.
Custos de alimentação controlados: a abundância de grãos e forragens mantém os preços estáveis até 2026.
Recuperação sanitária: os surtos de doenças de 2024 estão sob controle, o que favorece a reposição do rebanho.
Clima favorável: a ausência de secas prolongadas nas principais regiões produtoras melhorou a disponibilidade de pastagens.
Nesse cenário, países como os Estados Unidos (+3,4% em julho de 2025, seu maior crescimento desde 2021) e a Nova Zelândia (início recorde da temporada) estão liderando a recuperação.
Fraquezas na demanda mundial
O grande desafio do setor não é a produção, mas a demanda global. A fraqueza concentra-se nos consumidores de baixa e média renda, especialmente em:
China, onde o consumo continua deprimido, com sinais contraditórios no sudeste asiático.
Estados Unidos, afetados pela incerteza no mercado de trabalho e pelas tarifas.
Mercados de serviços de alimentação, com tráfego reduzido em restaurantes e canais de hotelaria.
A inflação alimentar em vários países elevou os preços ao consumidor, o que limita o acesso a produtos lácteos premium, como iogurtes ou queijos especiais, deslocando a demanda para leite líquido e queijos básicos.
Panorama regional: luzes e sombras na produção
Estados Unidos
A produção de leite acelera fortemente graças à expansão do rebanho e espera-se que mantenha seu dinamismo em 2026.
União Europeia
Prevê-se um crescimento de 0,3% em 2025 (0,6% incluindo o Reino Unido), com menor incidência da febre catarral ovina em relação a 2024. Irlanda e Polônia lideram o avanço.
China
A produção continua em contração, embora com um consumo interno ainda fraco, o que deixa volumes disponíveis para a indústria.
Nova Zelândia
Perspectiva-se uma forte primavera leiteira em 2025/26, graças aos bons preços e às condições climáticas ótimas.
Austrália
A produção permanecerá sob pressão devido à seca e ao rebanho reduzido.
América do Sul
Observa-se um crescimento sólido, com margens em ajuste. A Argentina se destaca com uma recuperação de 12% no primeiro semestre, recuperando o que foi perdido em 2024.
O caso argentino: recuperação com riscos
A Argentina vive uma recuperação significativa em 2025:
+12% de crescimento interanual no primeiro semestre, após a contração de -12,6% em 2024.
Projeção anual: +8%, até 11,2 milhões de toneladas métricas.
Preços na origem: ARS 476/litro (USD 0,38/litro em julho), abaixo dos USD 0,43/litro de janeiro.
Exportações: -1,5% em volume, mas +8% em receita (mais de 700 milhões de USD).
Apesar do clima favorável e dos baixos custos de alimentação, a desvalorização do peso e a pressão sobre as margens podem colocar em dificuldades os produtores com custos acima da média.
Comércio internacional e tensões geopolíticas
O comércio mundial de laticínios permaneceu relativamente estável no primeiro semestre de 2025, com apenas -1% no volume em relação ao ano anterior. Destaque:
Queda de -4% nas exportações de LPD e LPE.
Aumento de +6% no queijo e +14% nas gorduras butíricas.
Paralelamente, registram-se avanços nos acordos comerciais:
Os EUA e a China mantêm uma trégua tarifária de 10% até novembro.
Os EUA e a UE acordaram uma tarifa de 15% e cotas específicas (por exemplo, 10.000 t para queijos americanos, 50.000 t para misturas lácteas).
A Argélia avança em seu projeto de autossuficiência láctea para 2027, buscando cobrir 50% de sua demanda por leite em pó.
Perspectivas a curto e médio prazo
De acordo com a RaboResearch, os excedentes exportáveis crescerão durante seis trimestres consecutivos (2º trimestre de 2025 – 4º trimestre de 2026). Isso se traduzirá em um mercado bem abastecido, com preços pressionados para baixo.
Além disso, fenômenos climáticos como La Niña podem alterar os equilíbrios regionais, aumentando as chuvas na Austrália e reduzindo-as na América do Sul.
O futuro imediato dependerá em grande medida de:
A recuperação da demanda chinesa.
O desempenho do setor de restaurantes e hotelaria.
A evolução das negociações comerciais.
A capacidade dos produtores de manter margens em um cenário de preços mais baixos.
Tabela resumo do mercado leiteiro mundial (Rabobank, terceiro trimestre de 2025)
Região / Produto | Variação 2025 | Comentários |
---|---|---|
LPD (Oceania) | +11 % | Preços mais firmes |
LPE (Oceania) | +2 % | Crescimento moderado |
Manteiga | -3 % | Em queda no Q3 |
Queijo Cheddar | -5 % | Pressão sobre preços |
EUA (Produção) | +3,4 % | Maior ritmo desde 2021 |
UE (Produção) | +0,3 % | Irlanda e Polônia lideram |
Argentina | +12 % (S1) | Recuperação sólida |
Excedente exportável | ↑ até Q1 2026 | Seis trimestres seguidos |
Dados-chave do relatório do Rabobank
Produção mundial de leite: +1,6% em 2025 e +0,44% em 2026.
O excedente exportável crescerá durante 6 trimestres consecutivos.
A Argentina recupera níveis de 11,2 milhões de toneladas métricas.
Preços na Oceania: LPD +11%, LPE +2%, manteiga -3%, queijo cheddar -5%.
UE: crescimento moderado (+0,3%), com Irlanda e Polônia na liderança.
Chave: recuperação do consumo na China e evolução da demanda no setor de restauração.
Conclusão
O relatório do Rabobank confirma que o ciclo atual do setor leiteiro é caracterizado por um excesso de oferta diante de uma demanda estagnada. Embora os preços continuem relativamente altos, a tendência aponta para uma pressão baixista até 2026.
A chave para os próximos meses será a recuperação do consumo na China e o desempenho do setor de restauração. Se esses fatores não melhorarem, o excedente global poderá se prolongar, gerando tensões nas margens dos produtores.
O setor leiteiro global entra em uma fase em que a gestão de custos, a resiliência diante de fenômenos climáticos e a diversificação de mercados serão determinantes para manter a rentabilidade.
*Com informações de EDairy News Mexico