Robôs têm conquistado espaço nas fazendas leiteiras ao redor do mundo, elevando a satisfação dos produtores, mas colocando em xeque a lucratividade do negócio. Essa contradição — qualidade de vida em alta, retorno financeiro em baixa — está no centro dos debates que vêm dominando o setor em 2025.
O levantamento mais citado no momento reúne dados da Universidade de Calgary, que acompanhou 217 fazendas canadenses durante a transição para a ordenha robotizada. O número mais repetido é impressionante: 86% dos produtores afirmam que recomendariam os robôs a outros colegas, especialmente por causa da redução da carga de trabalho e da flexibilidade de horários. Mas quando o assunto é dinheiro, o entusiasmo diminui: apenas cerca de 28% alcançam os ganhos de produção necessários para garantir lucratividade, segundo modelagem econômica da Universidade de Minnesota.
Por trás dessa diferença gritante, há um fator que explica boa parte do paradoxo: robôs mudam a vida do produtor, mas não necessariamente mudam a conta bancária. Histórias de pais que passaram a acompanhar jogos dos filhos e agricultores que finalmente voltaram a ter fins de semana são frequentes. No entanto, os números de produtividade contam outra parte da história.
A média global mostra que 58% das fazendas registram algum aumento na produção, mas em níveis muito variáveis — desde incrementos quase simbólicos até saltos expressivos. Cerca de 34% não observam nenhuma mudança, mesmo após o alto investimento inicial, e 18% registram queda na produção, inviabilizando qualquer projeção de retorno no curto ou médio prazo.
E o problema não se limita à produção. Os custos operacionais são consistentemente maiores do que o prometido por fornecedores. Pesquisas na Irlanda e na Nova Zelândia documentaram aumentos expressivos no consumo de energia, enquanto produtores dos EUA relatam gastos com manutenção que chegam a ser quatro ou cinco vezes superiores ao previsto. A equação, portanto, fica apertada: mais custos, ganhos incertos e retorno demorado.
O tamanho do rebanho também se revelou um fator decisivo — e surpreendente. Estudos recentes mostram um comportamento em formato de “U”. Pequenas fazendas (até 60 vacas) e grandes operações (acima de 120 vacas) conseguem capturar valor com a automação. Já o grupo intermediário, de 61 a 120 vacas, frequentemente opera no vermelho quando instala robôs. Essa faixa representa 40% a 50% das fazendas da América do Norte, justamente o coração da produção leiteira familiar.
Outro componente essencial é a genética. Diferente do que muitos imaginam, adaptar o rebanho ao sistema robotizado leva tempo — entre 5 e 8 anos. As pesquisas mostram que vacas com conformações específicas do úbere têm desempenho muito superior no robô, consumindo menos tempo por ordenha e permitindo maior capacidade de uso da máquina. Fazendas que iniciam a automação sem preparação genética enfrentam longos períodos de adaptação, geralmente acompanhados de queda de produção.
As instalações também pesam — e muito. O estudo de Calgary revelou que 68% dos produtores fariam algo diferente se pudessem voltar atrás, especialmente no desenho estrutural dos estábulos, apontado como o principal responsável pelas frustrações. Fluxo de vacas mal planejado, espaço insuficiente de cocho e escolha inadequada entre tráfego livre ou guiado estão entre os erros mais comuns.
No entanto, quando tudo se alinha — genética selecionada, instalações adequadas, capital suficiente, escala compatível e gestão orientada por dados — a ordenha robotizada entrega resultados expressivos. Casos de sucesso registram produções superiores a 40 kg por vaca/dia, reduções significativas de custos trabalhistas e ganhos estruturais de qualidade de vida.
Mas a pergunta que está se tornando central no setor é direta: quantas fazendas realmente têm as condições para integrar robôs com sucesso? A síntese dos estudos aponta que apenas uma fração — entre 28% e 40% das operações — possui os requisitos necessários.
Isso não significa que a automação seja negativa. Significa que ela é específica, não universal. A narrativa de inevitabilidade tecnológica começa a dar lugar a um discurso mais maduro, que destaca preparação, planejamento, genética e investimentos como pré-requisitos, e não como detalhes complementares.
No fim das contas, robôs podem transformar uma operação — para melhor ou para pior. A decisão exige frieza, números confiáveis e um diagnóstico honesto sobre a realidade de cada fazenda.
*Escrito para o eDairyNews, com informações de The Bullvine






