– Estou chorando, os olhos cheios de lágrimas por ver que posso ter que abandonar o que mais amo, a criação de gado leiteiro, a agricultura.
O lamento do produtor de leite Rafael Hermann, enviado ao AGROemDIA via WhatsApp na noite desse domingo 5, resume a tragédia causada pela severa seca que atinge o Rio Grande do Sul desde novembro e se agravou em dezembro e neste início de janeiro.
A falta de água que compromete o desenvolvimento das lavouras, especialmente a de milho, e a criação de animais, como o gado de leite e corte, ameaça até mesmo a permanência de pequenos produtores na atividade agrícola.
Esse é o caso de Rafael, dono de 19 hectares – oito destinados a pastagens – no condomínio da família Hermann, no município de Boa Vista do Cadeado, a 390 quilômetros de Porto Alegre, na região noroeste do estado:
– Se não chover nesta semana que está começando, serei obrigado a encerrar a atividade contra a minha vontade por causa da situação de emergência. Vou tratar de vender as 20 vacas em lactação, as novilhas e as terneiras que tenho enquanto é tempo para não acontecer coisa pior. Eu e a minha mulher, Indiara, até já conversamos sobre isso.
A situação de Rafael é desesperadora. Voz embargada, o produtor de 39 anos, 19 deles dedicados ao campo, e pai de dois filhos prossegue seu relato:
– Já não temos mais silagem. Tínhamos azevém. O feno está acabando. Só restam nove bolas de pré-secado [de azevém]. O resto de sorgo está morrendo. E a lavoura de milho e as pastagens igualmente estão comprometidas. As reservas que estavam destinadas à futura entressafra também estão se esgotando, porque tivemos que antecipar o uso devido à forte seca.
Procura por veio d’água
Rafael conta que precisou fazer, nos últimos dias, coisas que jamais imaginou que faria, como cavar a terra com pá e escavadeira à procura de veio d´água para não deixar os animais morrerem de sede:
– Os reservatórios de água e as nascentes estão secando. Tivemos ainda que fechar os valos na propriedade porque as vacas procuram esses locais atrás de alguma alimentação verde e acabam atolando. Já precisei tirar algumas vacas dos atoleiros com trator.
A prefeitura de Boa Vista do Cadeado ficou de enviar máquinas à propriedade de Rafael, nesta segunda-feira 6, para tentar achar algum ponto de captação de água.
Há anos, o produtor não via um cenário assim. De acordo com ele, a crise hídrica é tão grave que o milho não consegue se desenvolver nem em áreas irrigadas com pivôs porque a terra está muito ressecada por baixo.
O agricultor tem passado os dias calculando os prejuízos:
– Só eu já estou com 50% de quebra na produção de leite. As vacas não conseguem pastar. O pasto está murcho, impróprio para alimentação.
Segundo Rafael, a perda nas lavouras de milho no RS pode chegar a 50%. “O pessoal está tendo que fazer a silagem do milho antes de os grãos estarem prontos para não os perder.”
A situação da soja, acrescenta o produtor, também é crítica. “As plantações de soja já estão morrendo em alguns pontos.”
Caso chova nos próximos dias, ainda há alguma esperança, assinala Rafael:
– Mas não dá mais para recuperar o potencial produtivo das lavouras.
O clima no Rio Grande do Sul é de sertão. Sol inclemente, temperatura rodando os 40 graus em algumas partes do estado, água escassa, rebanhos à beira da morte, a secura castigando as plantações.
Pelo mesmo WhatsApp que contatou com o AGROemDIA, Rafael buscou apoio, nas últimas horas, de deputados federais, estaduais e vereadores. “Parece até que alguma informação [sobre a situação de calamidade provocada pela estiagem no RS] já chegou à ministra da Agricultura [Tereza Cristina].”
Integrante do Movimento Construindo Leite Brasil – coletivo de produtores que desde 2018 reivindica melhorias para a cadeia produtiva –, Rafael não tem dúvidas: o setor público terá que tomar alguma medida para ajudar a agropecuária gaúcha.
A aflição é tamanha que Rafael adiantou que também tomará outra providência na vida pessoal:
– Vou procurar um médico. Estou muito nervoso. Estou dentro do problema, vendo tudo dentro da propriedade, mas tenho que ser forte. Não posso desistir. Agora, a dor é muito grande.