No convés superior de uma estrutura de três andares ancorada perto do centro de Roterdã, na Holanda, vacas se alimentam de feno e cascas de laranja recuperadas de máquinas de suco de supermercados da cidade portuária. Toldos as protegem do sol e coletam água da chuva para consumo.
De tempos em tempos, as vacas Meuse-Rhine-Issel – raça batizada em homenagem a três rios holandeses – se dirigem a uma máquina que as ordenha automaticamente, ou se afastam para dar lugar a um robô que passa para limpar o esterco que será transformado em fertilizante orgânico.
“Chamamos nossas vacas de ‘damas da reciclagem’”, conta Minke van Wingerden, que vende o leite, queijo e leitelho produzidos por elas em uma pequena loja.
Em operação desde 2019 e autodenominada a primeira fazenda flutuante do mundo, a Floating Farm não está explorando um território totalmente novo. Os esforços para levar a agricultura para a água são tão antigos quanto os astecas, que construíam pequenas ilhas artificiais para cultivar alimentos na região que hoje chamamos de México.
No entanto, a ideia está chamando a atenção como uma forma de enfrentar tanto a insegurança alimentar quanto os desafios das mudanças climáticas. E não é necessário que seja tão sofisticada quanto a fazenda em Roterdã.
Em áreas costeiras e de baixa altitude na Índia e em Bangladesh, uma organização não governamental está revivendo a prática tradicional de construir balsas flutuantes que mantêm as mudas acima da superfície durante as cheias das monções.
O Fórum Sul-Asiático para o Meio Ambiente fez algumas melhorias tecnológicas na chamada “agricultura flutuante resistente ao clima”. As balsas de bambu agora são maiores e mais pesadas para resistir às tempestades; coberturas plásticas e redes de sombra protegem as plantas frágeis; e bombas movidas a energia solar coletam água da chuva para irrigar as mudas.
A organização fez parceria com institutos de pesquisa locais para fornecer aos agricultores sementes resistentes ao clima e transmitir conhecimentos sobre controle de pragas.
NA ÍNDIA E EM BANGLADESH, BALSAS FLUTUANTES MANTÊM AS MUDAS DE PLANTAS ACIMA DA SUPERFÍCIE DURANTE AS CHEIAS DAS MONÇÕES.
A diretora de comunicações, Amrita Chatterjee, afirma que isso pode se tornar mais urgente, já que estamos enfrentando períodos de calor extremo – como neste verão, quando a temperatura atingiu 45º Celsius em algumas regiões.
A ideia tem ajudado a combater a insegurança alimentar, especialmente em um momento em que as monções estão cada vez mais imprevisíveis, segundo Chatterjee. As balsas também foram úteis quando o estado indiano de Bengala Ocidental foi atingido por um ciclone em meio à pandemia de Covid-19, em 2020.
Agricultores que utilizam balsas agora estão se alimentando e vendendo excedentes nos mercados locais. A organização espera que a ideia possa ser ampliada para torná-la comercialmente viável.
O conceito de fazendas flutuantes certamente será expandido nas próximas décadas no Sudeste Asiático. No entanto, ensinar sobre a tecnologia pode ser um obstáculo em alguns lugares, observa Craig Jenkins, professor de sociologia na Universidade Estadual de Ohio.
De volta a Roterdã, os proprietários da Floating Farm citam várias razões para investir em fazendas na água. A urbanização concentra mais pessoas nas cidades, tornando lógico trazer fontes de alimentos para mais perto delas. Também apontam que as condições extremas causadas pelas mudanças climáticas tornam sua abordagem essencial para alimentar cidades.
Jake Boswell, professor de arquitetura paisagística na Universidade Estadual de Ohio, sugere que o sucesso das fazendas flutuantes varia de acordo com a região. Enquanto grande parte da população mundial vive em áreas costeiras, apenas algumas dessas comunidades cultivam em áreas propensas a inundações ou tempestades.
Isso pode tornar mais econômico investir em habitações flutuantes em vez de fazendas para se adaptar ao aumento do nível do mar. “A [fazenda flutuante] de Roterdã é interessante como demonstração, mas seria difícil vê-la como um projeto escalável.”
Os proprietários da Floating Farm já estão planejando expandir além da pecuária. Eles pretendem construir uma segunda fazenda flutuante no mesmo porto para agricultura vertical – cultivo de vegetais em ambientes fechados, sob luzes, em pilhas de canteiros irrigados com água purificada, em parte, com o calor do esterco das vacas.
Minke Van Wingerden vê a agricultura na água como uma resposta viável a inundações e ao aumento do nível do mar, e como uma forma de trazer a produção de alimentos para mais perto dos consumidores, ou seja, diminuir a pegada de carbono.
“Com fazendas flutuantes, ficamos mais adaptados ao clima”, afirma Van Wingerden. “Dessa forma, é possível continuar produzindo alimentos frescos e saudáveis para as cidades.”
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