A importação de leite em pó voltou ao centro do debate no setor lácteo brasileiro após produtores de Minas Gerais enviarem ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva um pedido de suspensão imediata das compras do produto originário do Mercosul. A solicitação foi encaminhada por meio de uma carta assinada pelo deputado federal José Silva (Solidariedade), que também é autor de um projeto de lei para proibir a reconstituição de leite em pó importado destinado ao consumo humano.
Minas Gerais, maior bacia leiteira do país, responde por aproximadamente 9,3 bilhões de litros anuais — o equivalente a 27% de toda a produção nacional, segundo dados da Secretaria de Estado de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Seapa). O Brasil, por sua vez, figura entre os maiores produtores mundiais, com cerca de 34 bilhões de litros por ano, conforme informações do Ministério da Agricultura e Pecuária.
Zé Silva argumenta que a suspensão deve valer até que o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC) conclua a investigação antidumping anunciada no início do mês pelo vice-presidente e ministro da pasta, Geraldo Alckmin. A apuração foi aberta após solicitação da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), que relatou prejuízos decorrentes da suposta prática de dumping por Argentina e Uruguai. Segundo a entidade, os dois países estariam exportando leite em pó a valores inferiores aos praticados internamente, distorcendo a competitividade em relação ao produtor brasileiro.
O parlamentar ressalta que, em muitos casos, o leite em pó chega ao mercado nacional custando entre R$ 10 e R$ 14 por quilo, valor que permitiria sua reconstituição a preços considerados incompatíveis com a realidade da produção local. Ele comenta que, diante desse cenário, muitos compradores acabam optando pelo produto importado reconstituído, pressionando ainda mais o preço pago ao produtor brasileiro, que em diversas regiões não ultrapassa R$ 2 por litro — montante insuficiente para cobrir custos, segundo o deputado.
Na carta encaminhada ao Executivo, Zé Silva solicita que o governo determine a suspensão imediata das importações até a conclusão da investigação do MDIC, prevista para junho. Ele sustenta que, embora a apuração já esteja em andamento, a legislação brasileira prevê medidas provisórias em casos que envolvem risco econômico ao setor produtivo. Para o parlamentar, esse instrumento seria essencial para evitar o agravamento da situação nas propriedades leiteiras.
O documento, que circula como petição pública entre produtores de diversos estados, descreve o momento como “emergencial” e destaca impactos como queda de preços, endividamento, abandono da atividade e risco à continuidade da pecuária leiteira. O texto também menciona que a cadeia produtiva teria sido afetada quando, em 2019, as salvaguardas à importação deixaram de ser renovadas sob a justificativa de que o setor deveria buscar competitividade sem proteção tarifária. A decisão é citada pelo parlamentar como fator de desestruturação do mercado.
Além do pedido imediato ao governo, Zé Silva articula a tramitação do Projeto de Lei 5738/2025, que pretende estender a todo o país a proibição da reconstituição de leite em pó importado para uso em produtos destinados ao consumo humano. A proposta se inspira em lei aprovada neste ano pela Assembleia Legislativa do Paraná, que impede o uso do leite em pó importado reconstituído na produção de lácteos no estado. O deputado argumenta que a medida ajudaria a equilibrar o mercado, proteger o produtor nacional e garantir a qualidade dos alimentos.
A regra, conforme o texto, não se aplicaria a produtos importados já embalados para consumo doméstico, desde que cumpram requisitos da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Enquanto aguarda a análise do projeto, o deputado defende que a suspensão temporária da importação é necessária para evitar prejuízos adicionais enquanto a investigação antidumping segue seu curso.
Representantes regionais também reforçam a cobrança. Luiz Alberto Gonçalves da Cruz, presidente do Sindicato dos Produtores Rurais de Machacalis, Bertópolis, Santa Helena e Umburatiba, afirma que produtores argentinos e uruguaios contam com subsídios que permitiriam exportações abaixo do preço interno, pressionando a cadeia brasileira. Ele relata que, em algumas áreas, o litro de leite tem sido comercializado por cerca de R$ 1,50, valor incapaz de remunerar investimentos recentes, como os R$ 4 milhões aplicados na melhoria genética do rebanho leiteiro do Norte de Minas.
*Escrito para o eDairyNews, com informações de EM






