O Decreto brasileiro 11.732 altera o regime de crédito presumido dos tributos PIS e COFINS, contribuições sociais que financiam a seguridade social e o programa de integração social e de formação do patrimônio do servidor público.
De acordo com o decreto, as indústrias que adquirem leite in natura diretamente dos produtores e que produzem laticínios exclusivamente a partir do leite nacional terão direito a um crédito presumido de 50% dos tributos PIS e COFINS, enquanto as que utilizam leite importado ou derivados lácteos importados terão um crédito de apenas 20%.
Isso significa que as indústrias que utilizam leite importado pagarão mais impostos do que as que utilizam leite nacional, o que aumentará o custo dos produtos fabricados com leite estrangeiro.
O objetivo dessa medida é estimular a produção nacional de leite e proteger os produtores brasileiros da concorrência dos países vizinhos, que têm custos de produção mais baixos e se beneficiaram da desvalorização de suas moedas em relação ao real.
Além disso, o decreto busca incentivar a adesão ao programa Mais Leite Saudável, que é uma iniciativa do governo para melhorar a qualidade e a produtividade do leite brasileiro, por meio da implementação de boas práticas agropecuárias, controle sanitário, assistência técnica e capacitação dos produtores.
O Decreto 11.732 faz parte de uma série de ações que o governo brasileiro tem tomado para defender o mercado interno de lácteos, que tem sofrido forte pressão das importações nos últimos anos.
Entre outras medidas, destaca-se a suspensão temporária da aplicação da tarifa externa comum do MERCOSUL para leite em pó, queijo e manteiga, permitindo que o Brasil aplique uma tarifa de 42% sobre esses produtos, em vez dos 28% que vigoram no bloco.
Além disso, foram intensificadas as fiscalizações sanitárias e aduaneiras dos produtos lácteos que entram no país para verificar o cumprimento das normas técnicas e evitar fraudes e contrabando. Isso já foi sentido esta manhã na alfândega, disse um exportador ao eDairyNews.com
Estas medidas tiveram um impacto no comércio de produtos lácteos entre o Brasil e os seus parceiros do MERCOSUL, especialmente a Argentina e o Uruguai, que são os principais fornecedores de leite e produtos lácteos para o gigante sul-americano.
Apesar destas restrições, o Brasil continua a ser um mercado atrativo e estratégico para os países exportadores de produtos lácteos, uma vez que não consegue satisfazer a sua procura interna com a sua própria produção.
Segundo o analista brasileiro Valter Galán, sócio da Agripoint Consultoria, as importações de lácteos em 2024 cairão 3% em relação a 2023, mas continuarão competitivas, razão pela qual a importação de leite em pó continuará a ser interessante para o seu país.
Galán estima que a produção brasileira de leite cairá 1% em 2024, devido à baixa rentabilidade dos produtores, aos elevados custos dos factores de produção, à redução do número de vacas em produção e ao fenómeno meteorológico El Niño, que afecta a disponibilidade e a qualidade das forragens.
A medida, por enquanto, abrange o leite fluido, mas, mais cedo ou mais tarde, terá impacto no comércio de leite em pó integral, que é o principal produto lácteo que o Brasil importa da Argentina e do Uruguai.
Segundo a OCLA, entre janeiro e agosto de 2023, o Brasil importou 159,4 mil toneladas de leite em pó, mais que o dobro das 64,4 mil toneladas compradas no mesmo período de 2022. Desse total, 54% vieram da Argentina e 43% do Uruguai.
O lobby dos produtores brasileiros é importante e tem exigido medidas políticas para limitar a entrada de produtos lácteos da Argentina e do Uruguai, cujos volumes em 2023 foram suficientes para baixar o preço do seu próprio leite e colocar a produção local em cheque.
De acordo com a Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), o preço médio pago aos produtores de leite no Brasil caiu 6,7% em 2023, enquanto o custo de produção aumentou 23,9%, gerando uma perda de rentabilidade e uma crise no sector.
Os empresários do setor leiteiro da Argentina e do Uruguai devem estar atentos às possíveis consequências do decreto 11.732 e às oportunidades e desafios que o mercado brasileiro apresentará.
Terão de procurar melhorar a sua competitividade, diversificar os seus mercados, acrescentar valor aos seus produtos e cumprir os requisitos sanitários e de qualidade do Brasil; e não perder a sua procura insatisfeita de produtos lácteos, a complementaridade sazonal da produção, a proximidade geográfica e a integração regional do MERCOSUL.