Vacas leiteiras são animais altamente especializados, e para que possam produzir com eficiência também precisam ser muito bem cuidadas.
Com o aprimoramento da cadeia láctea, da profissionalização dos criadores até a melhoria de infraestrutura, o Estado cresce em eficiência produtiva e sobe no ranking nacional

Produzir leite não é um negócio simples, longe disso. Certamente a produção de leite é uma das atividades agropecuárias mais complexas, são inúmeros os fatores que interferem com a eficiência do processo produtivo, e o bem-estar dos animais é um dos mais importantes, embora esse tema seja muitas vezes mal interpretado e comumente associado a questões que podem tornar a operação da fazenda ainda mais complicada.

Meu objetivo neste artigo é mostrar que a adoção dos conceitos e práticas de bem-estar animal (BEA) pode ser uma grande aliada dos produtores de leite, levando as fazendas a serem mais eficientes e lucrativas.

Falando em rentabilidade e lucro, nesse tema também são inúmeros os fatores que afetam o resultado econômico das fazendas. Se considerarmos que uma fazenda equivale a uma indústria, é justo afirmar que as vacas são as “máquinas” que produzem o leite. Em qualquer indústria para que o negócio seja eficiente é indispensável que as máquinas funcionem perfeitamente, e isso só é possível se elas forem muito bem cuidadas, se for feita a manutenção preventiva adequada para que não apresentem defeitos e fiquem sem produzir, ou produzam menos do que poderiam. E na fazenda o conceito tem que ser o mesmo.

Vacas leiteiras são animais altamente especializados, e para que possam produzir com eficiência também precisam ser muito bem cuidadas. É aí que entra o bem-estar animal ajudando as fazendas a serem mais eficientes. Os conceitos de BEA são muito simples, trata-se de garantir que os rebanhos sejam saudáveis adotando-se práticas para prevenir doenças e distúrbios metabólicos e para oferecer as melhores condições de conforto para os animais.

Dentre os diversos aspectos do BEA entendo que os pilares mais importantes são:

Tempo que os animais passam deitados, descansando; Alívio do stress por calor; Ingestão adequada de nutrientes – quantidade e qualidade; O tempo de descanso tem um impacto muito profundo na saúde e desempenho das vacas leiteiras. Diversos trabalhos de pesquisa, em especial estudos realizados no Miner Institute nos EUA, sob coordenação do Dr. Rick Grant, mostraram que vacas que passam mais tempo descansando apresentam maior consumo de matéria seca e produzem mais leite. Para cada hora a mais de descanso, uma vaca leiteira tem oportunidade de produzir até 1,5kg de leite a mais. Além disso, vacas que passam mais tempo deitadas apresentam menos problemas de casco e ficam menos doentes. Ou seja, proporcionar às vacas mais tempo para descansar vale ouro!

Mas, como fazer isso? É simples, vacas gostam de deitar-se em locais secos, bem ventilados e macios, sem obstáculos que dificultem tanto o processo de deitar como o de levantar. Além disso, precisam de espaço para se movimentar, pois são animais de grande porte. Independente do sistema de criação, seja um rebanho mantido em pastagem ou em sistema de confinamento, os conceitos são os mesmos.

No caso dos confinamentos, há grandes diferenças entre os Free-Stalls e os Compost Barns, sistemas mais usados no mundo, mas aqui também os conceitos são os mesmos. Espaço suficiente, camas secas e macias, ambiente bem ventilado e ausência de obstáculos. Com isso certamente as vacas poderão descansar mais e serão mais saudáveis, produtivas e eficientes.

1 hora a mais de descanso pode resultar em até 1,5 kg a mais de leite!!!

Com relação ao stress por calor, costumo dizer que é o maior vilão das fazendas leiteiras no Brasil, em todas as regiões.

A saúde das vacas é duramente impactada pelo calor, e logicamente a eficiência produtiva de vacas sob stress por calor é muito menor. Um erro muito comum que muitas fazendas cometem é assumir que a nossa sensação de calor (seres humanos) é a mesma das vacas, e dessa forma entende-se que as vacas só passam a sentir os efeitos prejudiciais do calor quando a temperatura ambiente está se aproximando dos 30ºC.

Não podemos esquecer que vacas leiteiras são animais ruminantes, e como tal, produzem uma grande quantidade de calor interno durante o processo de digestão dos alimentos. Ou seja, as vacas possuem uma “fornalha natural” dentro da barriga, de forma que sua zona de conforto térmico é muito diferente da nossa. Para esses animais, o stress por calor pode se instalar a partir dos 20-22ºC, dependendo da umidade relativa do ar.

Vacas nessa condição apresentam redução na ingestão de alimentos de até 40% dependendo da intensidade do calor. o que tem um impacto brutal na eficiência produtiva. Além disso, vacas afetadas pelo calor geralmente apresentam muito mais doenças e têm seu desempenho reprodutivo significativamente prejudicado, o que também tem efeito devastador sobre o resultado econômico da fazenda.

Outro aspecto muito importante é o efeito do calor sobre as bezerras, filhas de vacas que passaram por stress por calor durante o período final da gestação (período seco). Trabalhos conduzidos nos últimos 10 anos pela equipe do Dr. Geoffrey Dahl da Universidade da Florida nos EUA mostraram de forma muito clara que essas bezerras nascem mais leves, são desmamadas mais leves, demoram mais para emprenhar e produzem menos leite depois de adultas quando comparadas com bezerras cujas mães não sofreram stress por calor durante o período seco.

A eficiência alimentar de vacas sob stress por calor pode cair 20%!!!

O alívio do stress por calor é fundamental para que os animais tenham mais saúde e sejam mais eficientes. Entendo que atualmente o investimento em práticas para reduzir o impacto do calor nas fazendas, dentre todos os investimentos que se pode fazer em infraestrutura, é o que se paga com mais facilidade e rapidez. Garantir boa ventilação e resfriar as vacas é fundamental para o BEA e para melhorar o resultado econômico da atividade leiteira.

Também não é possível falar em BEA sem considerar o manejo alimentar dos rebanhos. Para ter bem-estar é imprescindível que os animais estejam bem alimentados, e isso não se limita à formulação adequada das dietas do rebanho, é igualmente importante cuidar das práticas de manejo da alimentação para que os animais consigam de fato ingerir aquilo que foi considerado na formulação. E nesse aspecto também há muitos erros nas fazendas, e são muitos os aspectos de manejo que precisam ser observados. Vou dar um exemplo apenas para se ter uma ideia de como essas questões são críticas.

Há alguns anos eu visitei uma fazenda em Goiás que havia recém construído um novo galpão Compost Barn para suas cerca de 400 vacas. Era uma construção excelente, mas um aspecto me chamou à atenção, a barra de contenção do cocho de alimentação estava muito baixa, como mostra a imagem a seguir:

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Foto: Alexandre M Pedroso.

Nessa condição apesar de aparentemente estarem se alimentando normalmente, os animais não conseguem se posicionar adequadamente no cocho, ficando bastante desconfortáveis, o que leva a uma redução no tempo em que passam se alimentando, e obviamente a uma redução significativa no consumo.

Utilizando um conceito da metodologia CowSignals, sugeri que a barra fosse reposicionada cerca de 15 cm para cima, o que a fazenda prontamente acatou. 10 dias depois, sem nenhuma outra alteração na dieta, clima ou prática de manejo, a produção média de leite aumentou em mais de 1,5kg de leite/vaca/dia. Isso foi resultado direto de mais consumo proporcionado por uma condição mais confortável para se alimentarem.

Sem sombra de dúvidas o bem-estar dos animais é imprescindível para que os rebanhos leiteiros sejam saudáveis e lucrativos. Foram apresentados aqui alguns exemplos de como os conceitos de BEA afetam o resultado das fazendas, e esse tema precisa ser cuidadosamente considerado para que a atividade leiteira alcance o resultado econômico esperado pelos produtores.

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