A crise sanitária que atinge a pecuária da Grécia vem se aprofundando nas últimas semanas, segundo relatos de autoridades veterinárias e de produtores afetados em várias regiões do país.
Surtos simultâneos de doenças infecciosas estão levando ao abate sanitário de dezenas de milhares de ovelhas e cabras, criando um cenário de forte instabilidade na cadeia produtiva do tradicional queijo feta, um dos ícones da gastronomia grega e um produto de grande relevância para as exportações nacionais.
A região mais impactada é a Tessália, no centro do país, considerada por especialistas como uma das áreas mais estratégicas para a produção de leite de ovelha e cabra. Agricultores locais afirmam que a atual situação se soma ao trauma deixado pelas enchentes devastadoras de 2023, que já haviam provocado perdas estruturais significativas. Agora, com rebanhos inteiros dizimados, muitos dizem viver “a pior crise em décadas”, com impacto direto na subsistência de famílias cuja renda depende quase exclusivamente da pecuária.
Autoridades gregas confirmaram que dois agentes patogênicos explicam a profundidade do problema: a febre catarral ovina, conhecida como doença da língua azul, e a brucelose. A primeira é viral e transmitida por insetos, provocando febre alta, inchaço na língua e alto índice de mortalidade. Embora não ofereça riscos aos humanos, a disseminação rápida obriga medidas duras de contenção. Já a brucelose, além de comprometer a fertilidade de ovelhas e cabras, pode ser transmitida a pessoas pelo consumo de laticínios crus, configurando risco de saúde pública e exigindo protocolos rígidos de erradicação.
Produtores afirmam que o abate sanitário, apesar de necessário, tem sido emocionalmente devastador. Muitos relatam perder, de um dia para o outro, rebanhos construídos ao longo de gerações, com cuidadosa seleção genética e investimentos elevados. As compensações oferecidas pelo governo, segundo relatos de organizações rurais, “não cobrem sequer uma fração do valor real das perdas”, especialmente considerando o tempo e os custos envolvidos na reposição dos animais.
A ameaça mais visível recai sobre a produção do queijo feta, que possui Denominação de Origem Protegida (DOP). Isso significa que somente produtos feitos na Grécia, segundo regras específicas — incluindo o uso de leite de raças locais de ovelhas e cabras — podem ser comercializados com o nome “feta”. Com a queda acentuada na oferta de leite, especialistas do setor já projetam aumento expressivo nos custos de produção, pressão sobre os preços internos e possíveis impactos no abastecimento global.
Consultores de mercado afirmam que o feta, um dos principais produtos de exportação da indústria láctea grega, pode enfrentar escassez nos próximos meses, caso a crise não seja rapidamente controlada. Importadores europeus demonstram preocupação com a possibilidade de quebra de contrato, enquanto varejistas internacionais observam sinais de volatilidade nos preços.
Para tentar conter o avanço da doença da língua azul, o governo grego acelerou campanhas de vacinação e estabeleceu zonas de restrição ao transporte de animais. Paralelamente, a testagem intensiva para brucelose foi ampliada, em coordenação com autoridades da União Europeia. A logística, porém, é descrita por veterinários locais como “extremamente complexa”, sobretudo em áreas remotas, onde o deslocamento é difícil e a vigilância sanitária enfrenta limitações crônicas.
Além dos impactos econômicos, o risco simbólico também é grande. O feta não é apenas um produto comercial: é um elemento central da identidade cultural grega, presente em rituais, culinária e tradições familiares. A possível escassez, afirmam historiadores da alimentação, seria sentida como uma perda patrimonial para o país.
A expectativa agora é de que as medidas emergenciais consigam frear a propagação dos patógenos antes que a crise se torne irreversível. Enquanto isso, produtores vivem entre o medo, a incerteza e a esperança de reconstruir um setor que, há séculos, sustenta não apenas economias regionais, mas também a própria alma gastronômica da Grécia.
*Escrito para o eDairyNews, com informações de Mix Vale






