A cadeia láctea brasileira vive um momento de incerteza regulatória em torno de um dos seus principais instrumentos de fomento: o Programa Mais Leite Saudável (PMLS).
Criado em 2015 para melhorar a qualidade do leite cru e apoiar pequenos produtores, o programa permite que indústrias utilizem até 50% das contribuições de PIS/Pasep e Cofins como créditos presumidos, desde que invistam pelo menos 5% desse montante em assistência técnica e melhoria da matéria-prima.
Esse equilíbrio permaneceu até outubro de 2023, quando o governo federal editou o Decreto 11.732/2023, que passou a exigir que os produtos beneficiados pelo incentivo fossem produzidos exclusivamente com leite oriundo do programa.
A medida entrou em vigor em fevereiro de 2024 e, desde então, vem sendo alvo de contestações judiciais e debates no setor.
O que está em disputa?
Até a mudança, empresas podiam usar os créditos mesmo em linhas de produção que combinavam leite do PMLS com outras fontes. A nova exigência reduziu o alcance do benefício, impactando especialmente indústrias com portfólios diversificados e estratégias de compra flexíveis.
Para juristas, o decreto ultrapassou sua função regulamentar ao criar uma restrição que não consta na Lei 10.925/2004, alterada pela Lei 13.137/2015.
O Código Tributário Nacional (artigo 99) estabelece que regulamentos devem apenas garantir a execução da lei, sem restringir direitos já concedidos.
Efeitos no setor lácteo
De um lado, o governo argumenta que a medida fortalece a política de valorização do leite nacional, estimulando maior adesão ao programa. Do outro, laticínios alegam que a exclusividade desestimula investimentos, limita a competitividade e aumenta a insegurança regulatória.
Pequenos produtores também acompanham o desdobramento com atenção, já que parte das ações de assistência técnica e melhoria da qualidade dependem diretamente desses recursos.
Caminhos futuros
Decisões judiciais recentes, como a da Justiça Federal de São Paulo em favor de uma grande indústria, indicam que a controvérsia pode se intensificar. O setor reivindica que mudanças dessa relevância sejam feitas por lei, com análise de impacto e prazo de adaptação, em vez de ajustes por decreto.
Com quase um ano e meio de vigência, o Decreto 11.732/2023 permanece ativo, mas sob questionamento crescente. Até que o Judiciário ou o próprio Executivo revejam a regra, a cadeia láctea opera entre a expectativa de estabilidade fiscal e a realidade de um incentivo mais restrito.
*Adaptado para eDairyNews, com informações de Consultor Jurídico