O H5N1 voltou a colocar o setor agroalimentar internacional em estado de atenção após a confirmação do vírus da gripe aviária altamente patogênica em um rebanho leiteiro no estado de Wisconsin, nos Estados Unidos. O episódio marca um novo capítulo na crise sanitária ao evidenciar uma rota independente de transmissão da fauna silvestre para o gado, ampliando os desafios de contenção para a cadeia global do leite.
Segundo informações divulgadas pelo Departamento de Agricultura, Comércio e Proteção ao Consumidor de Wisconsin, com confirmação do USDA, o foco foi identificado no Condado de Dodge, a cerca de 80 quilômetros de Madison. O sequenciamento genômico, concluído em 17 de dezembro, classificou o vírus como genótipo D1.1, distinto dos casos anteriormente registrados no Texas, onde a transmissão estava associada a um mesmo foco inicial.
Autoridades sanitárias destacaram que o caso não representa uma continuidade direta de surtos anteriores, mas sim um evento autônomo de spillover, no qual o vírus migra da vida silvestre para sistemas produtivos comerciais. Para especialistas em sanidade animal, esse fator eleva significativamente a complexidade do controle epidemiológico, pois reduz a previsibilidade dos focos e exige vigilância constante em múltiplas regiões.
Até o momento, não foi detectada disseminação do vírus para propriedades vizinhas. O USDA atribui esse resultado à Estratégia Nacional de Testes de Leite, considerada uma das principais ferramentas de monitoramento sanitário do setor leiteiro norte-americano. A identificação precoce do H5N1 reforça, segundo o órgão, a eficácia de sistemas baseados em dados e análises laboratoriais contínuas.
Do ponto de vista do abastecimento, as autoridades mantêm a posição de que o leite comercializado permanece seguro. O USDA reiterou que a pasteurização inativa o vírus H5N1 e que protocolos rígidos impedem que leite proveniente de animais sintomáticos ou suspeitos entre na cadeia de consumo. O CDC endossa essa avaliação e mantém o risco para a população em geral classificado como baixo.
Ainda assim, o alerta se concentra no consumo de leite cru, colostro ou creme não pasteurizados, que podem representar uma via potencial de exposição. Apesar disso, não há registros de infecções humanas associadas ao consumo de alimentos contaminados pelo H5N1 até o momento, segundo dados oficiais.
Diante do novo cenário, o USDA reforçou o chamado por biossegurança rigorosa nas fazendas leiteiras. As recomendações incluem monitoramento permanente de sinais clínicos nos animais, comunicação imediata de qualquer suspeita às autoridades e, de forma inédita, o relato de mortes atípicas de animais silvestres dentro das propriedades. A orientação reflete o reconhecimento de que a interface entre ecossistemas naturais e produção agropecuária se tornou um ponto crítico de risco sanitário.
O impacto do novo genótipo também chegou ao campo político. Em Washington, um grupo bipartidário de senadores passou a pressionar o governo federal para acelerar a elaboração de um plano nacional de desenvolvimento de vacinas contra a gripe aviária voltadas ao gado leiteiro. A discussão sinaliza uma mudança estratégica: o setor começa a migrar de uma abordagem reativa para uma estratégia preventiva de longo prazo, baseada em ciência, padronização de protocolos e soluções farmacêuticas.
H5N1 e o cenário internacional
Na Europa, a confirmação do caso em Wisconsin foi analisada pela Autoridade Europeia para a Segurança dos Alimentos (EFSA). Em parecer técnico recente, o órgão concluiu que o risco de disseminação do H5N1 do gado leiteiro norte-americano para a União Europeia é considerado muito baixo. Ainda assim, a EFSA ressalta que, caso o vírus chegue ao continente, os impactos podem ser significativos, exigindo resposta rápida e coordenação entre os setores avícola e leiteiro.
A avaliação considerou fatores como a migração sazonal de aves silvestres e a eventual importação de produtos que contenham leite cru como possíveis vias de introdução do vírus. Para mitigar riscos, a autoridade europeia recomenda restrições à movimentação de gado em áreas afetadas, evitar o compartilhamento de trabalhadores, veículos e equipamentos entre propriedades e implementar protocolos rigorosos de limpeza e desinfecção, especialmente em salas e equipamentos de ordenha.
O consenso científico permanece claro: leite pasteurizado é seguro. Tratamentos térmicos continuam sendo uma barreira eficaz contra o H5N1, alinhando-se às diretrizes adotadas tanto nos Estados Unidos quanto na Europa.
O episódio em Wisconsin evidencia uma nova realidade sanitária para a pecuária mundial. O H5N1 deixou de ser um problema restrito às aves e passou a desafiar cadeias produtivas complexas, como a do leite. Nesse contexto, a combinação entre monitoramento genômico, biossegurança avançada e cooperação internacional será determinante para evitar que um evento localizado evolua para uma crise de maior escala no agronegócio global.
*Escrito para o eDairyNews, com informações de CompreRural






