Enquanto alguns produtores enxergam o leite orgânico como um nicho de mercado com potencial para aumentar seus ganhos, especialmente num momento de crise como o que o setor vive hoje, outros consideram esse sistema de produção altamente arriscado, capaz, inclusive, de levar a propriedade leiteira à falência.
“Trata-se de uma aventura”, dispara o produtor de leite Edilberto Carneiro, do município goiano de Palminópolis, ao avaliar as iniciativas voltadas à produção de leite orgânico, algumas com o apoio de órgãos públicos, como a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), por meio do projeto Balde Cheio.
“Isso é um nicho de mercado para pouquíssimos produtores. A gente se preocupa ao ver o produtor, especialmente o pequeno, ser seduzido por essas coisas”, diz Edilberto, integrante do Movimento dos Produtores de Leite do Brasil, que vem reivindicando o apoio dos governos federal e estaduais e dos demais elos da cadeia (laticínios e varejo) para superar a crise sistêmica do setor.
Segundo ele, os sistemas de produção de leite orgânico e A2 – extraído de vacas que não produzem proteínas beta-caseína A1, causadoras da maioria das alergias relacionadas ao produto – são apresentados como panaceias. “E o pequeno produtor, sem condições de sobreviver ao massacre que enfrenta na cadeia produtiva, às vezes envereda para essas iniciativas e quebra.”
O clima, o homem e a vaca
A produção de leite, acrescenta Edilberto, por si só já é complexa, dependendo de muitas variáveis. “Entre elas, há três sobre as quais não temos controle: o clima, a vaca e o próprio homem. É preciso criar harmonia entre elas. Além disso, há as questões relacionadas ao mercado, cujas oscilações são enormes.”
A atividade leiteira, prossegue, exige um nível muito grande de dedicação e profissionalização do produtor. “Então, já é um grande desafio dominar um sistema de produção como o da atividade leiteira da porteira para dentro”, pontua Edilberto.
“Agora, imagine o produtor ainda se ver na obrigação de controlar um processo industrial que, por mais simples que seja, envolve regulações de sanidade animal e de saúde pública, além de investimentos em equipamentos e instalações.”
Edilberto assinala também que o produtor que parte para verticalização, a fim de industrializar a sua produção, tem outra tarefa desafiadora: a de colocar o leite no mercado. Isso, observa, é ainda mais complexo, porque envolve a atividade do varejo, que é altamente concentrada.
“Vendedores de ilusões”
“Os supermercados estrangulam o setor industrial, criam exigências de gôndolas e de marketing, entre outras. Como é que o pequeno produtor vai ter acesso às grandes redes de supermercados, que dominam 75%, 80% do mercado varejista? Se não conseguir, como fazer para chegar às pequenas mercearias e supermercados menores?”
Em resumo, enfatiza Edilberto, o produtor de leite que resolve buscar os nichos de mercado tem que dominar a produção, o processo industrial, com todas as exigências regulatórias e impostos, e ainda procurar o mercado consumidor – varejo ou atacado. “Isso é muitíssimo complicado. São atividades altamente concentradas, em economia de escala. É difícil o produtor sobreviver nessa situação.”
Diante disso, Ediberto não vê sentido em criar perspectiva em relação a esses sistemas de produção. “Muitas vezes, o produtor, que já é castigado pelos outros elos da cadeia, pelo governo e pela concorrência desleal com outros países, se vê forçado a entrar nessa aventura. Quando percebe que é inviável, já fez investimentos, não tem como se desfazer daquilo e vai à falência por ter sido induzido por vendedores de ilusões, por gente aluada.”
Como é que o pequeno produtor vai ter acesso às grandes redes de supermercados, que dominam 75%, 80% do mercado varejista? Edilberto Carneiro, produtor de leite