O ser humano, instintivamente, ativa o “estado de alerta” diante de um risco iminente, como atravessar uma rua movimentada ou ouvir o som de um alarme de incêndio.
Por outro lado, o risco do aquecimento global, por ser um evento de longo prazo, não desperta a mesma sensação de urgência, embora possa ser igualmente grave.
Situação semelhante ocorre com a água. O Brasil, detentor da maior reserva de água doce do mundo, tem negligenciado o uso responsável desse recurso, aparentemente confortável. O Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS) aponta que, em 2022, o Brasil desperdiçou cerca de 7 bilhões de metros cúbicos de água.
De acordo com a Organização das Nações Unidas, o consumo médio de água por pessoa no Brasil é de 154 litros. A partir de cálculos, estima-se que a quantidade desperdiçada em 2022 seria suficiente para atender uma população de 124 mil pessoas durante um ano.
Nesse contexto, medidas para mitigar os impactos ambientais no setor industrial tornam-se cada vez mais necessárias.
Na cidade de Hidrolândia, em Goiás, a indústria de laticínios serve de exemplo. Desde 2018, a Marajoara desenvolve um projeto em parceria com produtores rurais locais, garantindo produtividade e uma gestão eficiente dos resíduos hídricos gerados pela indústria.
Por meio de uma estação de tratamento de efluentes (ETE), instalada no parque fabril, a Marajoara consegue tratar adequadamente toda a água residual gerada em seus processos produtivos.
Além disso, ajuda os produtores de leite locais a manterem a produtividade do pasto, mesmo em períodos de seca, como o que o estado vive atualmente. A água também é reutilizada antes de ser devolvida ao solo.
Vale destacar que, de acordo com o Manual de Usos Consuntivos da Água no Brasil, publicado pela Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA), o setor industrial é o terceiro maior consumidor de água no país, sendo que 40,5% da água extraída é destinada à produção de alimentos, um percentual que tende a aumentar com o avanço da indústria.
Em 2024, o setor industrial cresceu 8,4%, de acordo com dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços.
Segundo Vinícius Junqueira, diretor-geral da Marajoara, esse processo é possível graças à utilização da flotação de ar dissolvido (FAD) na ETE, que purifica a água a um nível superior a 90%, muito além do exigido pela legislação ambiental.
“Dessa separação entre a água e as impurezas, gera-se uma biomassa orgânica rica em nutrientes essenciais para o solo. No passado, essa biomassa era direcionada para uma fazenda de compostagem, mas, após estudos, verificamos que ela poderia adubar o solo.
Assim, começamos a enviá-la, por meio de caminhões-pipa, para os pastos de produtores rurais cadastrados na empresa”, explica Vinícius.
Além disso, após o tratamento, a água é direcionada, por meio de tubulações, para um pasto destinado à criação de gado de corte, localizado a um quilômetro do parque fabril. Por meio de um sistema de irrigação composto por cerca de 600 aspersores, essa água mantém o pasto verde até mesmo durante os períodos de seca.
Vinícius informa que, em média, serão liberados no local 75 mil litros de água por hora, a cada 12 horas, totalizando 1 milhão de litros de água reutilizada. Após contribuir para a qualidade da pastagem, a água é absorvida pelo solo e retorna ao lençol freático, completando assim o ciclo da água.
As iniciativas foram avaliadas e validadas por um estudo técnico realizado pela Secretaria de Meio Ambiente e Recursos Hídricos de Goiás. Em 2021, o projeto foi premiado nacionalmente pelo Crea de Meio Ambiente, sendo o grande vencedor na categoria “Elementos Naturais”.